Resumo
- Os indicadores recentes sugerem que as perspectivas para a inflação seguem desafiadoras. Especialmente a inflação corrente, que se mostrou mais disseminada;
- A piora das perspectivas de crescimento doméstico e o aumento das incertezas externas podem representar um vetor desinflacionário;
- Estimamos que as projeções do Copom ficarão próximas à trajetória das metas com a as hipóteses da pesquisa Focus;
- Esperamos a manutenção do ritmo de alta de juros em 1pp. Uma aceleração poderia se justificar, mas as incertezas elevadas recomendam cautela;
- Esperamos que o comunicado mantenha o tom duro, reforçando que a Selic será elevada o quanto for preciso. A projeção do modelo dirá o tamanho do ajuste que o Copom tem em seu plano de voo.
Hawk-Dove Heatmap: Inflação corrente mais disseminada
Entendendo os termos sobre as condutas do Banco Central
Dovish: A origem vem da palavra dove, pomba em português. Sinaliza uma conduta do Banco Central mais confiante de que o cenário de inflação não será um problema, e, portanto, pendente a adotar uma política monetária expansionista ou menos restritiva para estimular a economia.
Hawkish: A origem vem da palavra hawk, falcão em português. Sinaliza uma conduta do Banco Central preocupada com os riscos inflacionários, e, portanto, pendente a adotar uma postura monetária mais dura, com subidas mais fortes na taxa de juros, ainda que isso possa prejudicar o emprego e a atividade no curto prazo.
Os indicadores divulgados desde o último Copom sugerem, em nossa visão, que as perspectivas para a inflação seguem desafiadoras.
Os dados de inflação mostraram, no nível do produtor, que ainda há pressão de custos a serem repassados ao consumidor, tanto entre bens industrializados como alimentos. Os IPAs dentro dos IGPs apresentaram deflação, mas muito concentrada em minério de ferro. Os demais itens ainda apresentaram, em geral, aceleração frente aos meses anteriores.
No nível do consumidor, o IPCA de agosto não apenas ficou acima do esperado, mas seu índice de difusão intensificou a aceleração vista em julho, indicando que a pressão de preços está ficando mais disseminada.
Outra evolução desfavorável foi o aumento da percepção de risco local, representada em nosso heatmap pela alta do CDS Brasil. A taxa de câmbio, que vinha se apreciando até junho, interrompeu a tendência, deixando de ser um favor positivo para as perspectivas de inflação.
Ainda do lado negativo, o nível dos reservatórios segue muito baixo, sendo um risco para a esperada deflação de energia elétrica em 2022.
Uma novidade desde o último Copom foi a reversão das projeções de atividade. A projeção Focus para o PIB de 2021 se reduziu, interrompendo longa tendência de revisões para cima. A projeção para 2022, que vinha relativamente estável, passou a recuar de forma mais significativa.
Em parte, a atividade mais fraca é uma resposta à expectativa de ajuste monetário mais intenso e, portanto, pode se tornar um vetor desinflacionário adiante. Outra parte, no entanto, está ligada ao choque de oferta da crise hídrica, que reduz a atividade por conta da inflação de custos pressionada.
O cenário externo também dá espaço para o Copom ser mais cauteloso na implementação do ajuste monetário. Os juros longos seguem bastante baixos no cenário global. E as incertezas na China representam um risco à atividade econômica global e à evolução dos preços das commodities.
Modelo do BCB: IPCA 2022 deve se manter próximo da meta
Na última reunião do Copom, as projeções para a inflação no cenário base eram de 6,5% para 2021 e 3,5% para 2022. Desde então, o cenário apresentou algumas mudanças, como vimos no heatmap acima. Isso refletirá também nas projeções para o IPCA no cenário base.
A mediana da expectativa para a taxa Selic no boletim Focus avançou de 7,00% para 8,25% em 2021 (fim de período) e 8,50% para 2022 desde o último Copom. O câmbio depreciou, de R$ 5,15/US$ para R$5,20/US$; e a expectativa de inflação, também coletada no boletim Focus, passou de 6,79% para 8,35%.
Enquanto a elevação do juro médio contribui para a queda da inflação, a elevação das expectativas e a surpresa inflacionária corrente (em relação à projeção de curto prazo do BC) agem na outra direção. O efeito líquido sobre a inflação dos preços livres deve ficar em 1,19 pp.
A projeção de preços administrados do Copom também deve subir – de 10,00% para 12,48% – devido à incorporação da bandeira “crise hídrica” no cenário, que ficará em vigor de setembro de 2021 a abril de 2022.
O resultado é elevação da projeção do IPCA para 2021 no cenário base para 8,31%, antes em 6,5%.
O mais relevante, no entanto, é 2022. Por um lado, a elevação da Selic de 2021 e 2022 no Focus reduz a projeção para o IPCA no fim do período: -0,34 pp. Por outro, a maior inércia de 2021, elevação das expectativas para 2022 e depreciação do câmbio elevam a projeção em 0,52 pp. O resultado líquido na projeção de preços livres é a alta de 0,25 pp.
Assumindo manutenção da tarifa de energia elétrica em bandeira vermelha 1 em dezembro de 2022, e corrigindo os preços administrados pela inercia inflacionária, estes recuam de 4,6% para 3,6%.
Dessa forma, a projeção para o IPCA de 2022 fica praticamente estável em 3,5% no modelo base do BC.
Hipótese de Bandeira tarifária
Importante mencionar aqui o elevado grau de incerteza em relação às projeções de bens administrados, devido ao cenário de bandeiras tarifárias que o BC deve adotar. No último RTI, publicado em 24 de junho, o BC adotou uma hipótese neutra para a bandeira tarifária de energia elétrica para os finais de ano-calendário, que se mantinha em vermelha patamar 1 em dezembro de 2021, 2022 e 2023. Mantemos essa hipótese na simulação acima.
No entanto, devido ao agravamento recente da crise hídrica e criação da bandeira “crise hídrica”, o BC pode alterar cenário de bandeira tarifária para 2022, elevando-a para vermelha patamar 2, considerando um valor intermediário em relação ao praticado antes da crise hídrica (R$ 6,24 a cada 100 kWh), uma forma de buscar a neutralidade (mesmo que parcialmente). Esta alteração levaria a projeção de inflação para 3,8% em 2022.
Implementação de Política Monetária e Comunicado: Manutenção de ritmo, sinalização de “orçamento” virá na projeção do cenário base.
Nosso call é que o Copom elevará novamente a taxa Selic em 1pp.
Em nosso último relatório mensal (escrito antes da sinalização recente do Presidente Roberto Campos Neto), discutimos uma aceleração do ritmo da elevação, cogitada pelo mercado. A aceleração poderia fazer sentido, dado que (i) a disseminação da inflação demandaria uma ação mais contundente do Copom; e (ii) a Selic hoje ainda está relativamente distante do ponto final de consenso de mercado (entre 8% e 10%).
Optamos por manter a projeção de 1pp dado o cenário ainda incerto. A inflação desfavorável hoje é resultado de políticas monetária e (principalmente) fiscal excessivamente expansionistas no passado. A inflação de 2022 e 2023 estará sob efeitos da política monetária e fiscal mais próximas do neutro.
Adicionalmente, o cenário externo está mais incerto com os riscos vindos da China.
O call de manutenção do ritmo ganhou força com uma fala recente do presidente do BC afirmando que o Copom não deveria reagir a cada novo dado divulgado (menção implícita ao IPCA de agosto).
No comunicado, acreditamos que os parágrafos de política monetária serão pouco alterados frente ao comunicado anterior. O comunicado provavelmente dirá que o ritmo atual é adequado e que que foco é o tamanho do ajuste a ser implementado.
Será difícil para o Copom expressar seu plano de voo quanto ao tamanho do ciclo em palavras. Entendemos que o máximo que dá para falar é que os juros irão além do neutro, sinalização já dada no comunicado passado.
Nossa visão é que essa comunicação virá na projeção do cenário base, com a trajetória de juros do Focus. O Focus prevê hoje Selic em 8,25% no final de 2021 e 8,50% em 2022. Se esse for o plano de voo do BC, a projeção do cenário base ficará na meta. Se o Copom entender que precisará ir além, a projeção estará acima da meta.
Duas variáveis são chave para a projeção que será publicada no comunicado: 1) a influência da expectativa de inflação de 2022, que vem subindo tanto no Focus como nos mercados futuros; 2) o cenário para energia elétrica em 2022 (ver seção acima com nossas projeções do modelo).
Nossos exercícios indicam ser possível a projeção do modelo do BC variar entre 3,5% (a meta) e 4,0%. Acreditamos que a opção será por publicar a projeção próxima à meta, indicando que 8,25% em 2021 e 8,50% em 2022 está em linha com seu plano de voo atual.
Se estivermos corretos em nossa avaliação, uma possível redação para os parágrafos finais do comunicado é:
Cenário XP: Projetamos a taxa Selic em 8,5% ao final do ciclo de ajuste.
O IPCA de agosto mostrou pressões disseminadas pela economia.
O papel da política monetária, diante de um choque de custos, é evitar os efeitos secundários do choque. A disseminação da inflação mostra que, por ora, a batalha não está ganha.
O risco da política fiscal excessivamente expansionista – e sua consequência sobre a perspectiva da demanda agregada e da taxa de câmbio – torna a batalha ainda mais difícil.
Diante deste cenário, entendemos agora que o Copom elevará a taxa Selic até 8,50%, dois pontos percentuais acima do patamar considerado neutro (6,5%). Esperamos mais duas altas de 1,0pp, seguidas de uma alta de 0,75pp em dezembro e uma alta final de 0,5pp no início de 2022.
Como salientamos em relatórios anteriores, se a política fiscal se mostrar mais expansionista e insustentável do que o contemplado em nosso cenário base, o peso sobre a política monetária será maior.
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