Alguns anos atrás, em 2018 ou 2019, o que você responderia se alguém perguntasse “qual será o maior evento que pode impactar os mercados globais daqui pra frente?” Seria outra grande crise financeira como em 2008?
Ninguém previu que uma pandemia fecharia a economia global em 2020, derrubaria os mercados do mundo naquele ano e mudaria os hábitos de trabalho e de vida da população mundial. Mais tarde, em 2022, os mercados foram surpreendidos novamente, dessa vez por uma guerra militar após a Rússia invadir a Ucrânia.
Esses são eventos chamados de “cisnes negros”, uma expressão que ficou conhecida pra descrever eventos imprevisíveis e com fortes impactos. O termo foi popularizado pelo livro “A lógica do cisne negro”, de Nassim Taleb, para descrever eventos extremamente raros e inesperados, com grandes consequências para a economia global. Em menor escala, o anúncio de inconsistências contábeis da Americanas S.A. (AMER3), que podem chegar a R$ 20 bilhões, também assustou o mercado brasileiro nesta quarta-feira, 11.
Como em todo começo de ano, analistas e economistas publicam suas projeções de dados econômicos e de mercado. Por aqui, publicamos as nossas no relatório Onde Investir 2023.
Mas, será que podemos ter outro evento tão impactante e raro neste ano, daqueles que não fazem parte de nenhum cenário previsto? Abaixo, listamos algumas manchetes fictícias que avaliamos IMPROVÁVEIS de se tornarem realidade nos jornais em 2023. Entenda:
1 – Apple compra dona do Facebook e entra no metaverso
O ano de 2022 foi marcado por fortes quedas nos mercados globais, principalmente das empresas de tecnologia, que são mais sensíveis a alta de juros. Olhando para as FAAMGs, como são conhecidas as maiores empresas de tecnologia nos EUA – Facebook (agora META), Apple, Amazon, Microsoft e Google – elas caíram quase 40% no ano passado juntas. Com essa correção, o valor dessas empresas ficou muito mais atrativo do que um ano atrás.
Olhando para 2023, ainda devemos ver um ambiente difícil para as empresas de tecnologia se recuperarem, com taxas de juros ainda subindo, ou pelo menos mantidas em patamares altos, e a probabilidade crescente de recessão nas principais economias do mundo.
Com essas condições econômicas mais desfavoráveis e um valor de mercado mais atrativo, podemos ver um movimento de consolidação, com empresas mais fragilizadas sendo alvo de aquisições. Dentre as big techs, o antigo Facebook foi a empresa que mais desvalorizou no ano passado e passou por grandes dificuldades depois que fez aposta no metaverso. A Apple, por outro lado, tem quase US$ 170 bilhões de caixa no balanço e já deu sinais de que tem ambições nessa tecnologia também.
Por que é improvável?
Hoje, a regulação para a fusão de grandes empresas competidoras é bastante rígida. Tratando-se de duas gigantes de tecnologia globais, haveria forte resistência de agentes reguladores como já estamos vendo em outros casos.
2 – O dólar americano deixa de ser a moeda de reserva do mundo e é substituído pelo Bitcoin
O dólar americano é a moeda mais usada para transações globais e, portanto, é a principal moeda do comércio mundial. Porém, uma série de eventos como as tensões geopolíticas entre a Rússia e o Ocidente, entre China e os EUA, uma deterioração na economia americana e na sua dominância global, as outras economias buscam cada vez mais diversificar a exposição ao dólar.
Para substituir a moeda americana, o ideal é uma moeda que não é controlada por apenas uma autoridade monetária, que seja facilmente rastreável, transparente e de fácil transferência a custos baixos. Daí que aparece a oportunidade para o Bitcoin se tornar a moeda de referência global, que já é utilizada como moeda oficial em pequenas economias, como El Salvador.
Por que é improvável?
O dólar de fato perdeu um pouco de espaço nas reservas dos bancos centrais globais, passando de 70% em 2000 para os atuais 60%. Ainda assim, é um nível relevante e continua sendo visto como a principal moeda de reserva internacional.
Sobre a possibilidade de o Bitcoin se tornar uma reserva mundial, é uma discussão que merece um relatório à parte. Num curto prazo de 12 meses, achamos difícil isso acontecer, pois ainda se trata de um ativo com comportamento bastante volátil e que tem pouca adesão como moeda de troca.
3 – Europa termina 2023 como o melhor mercado do mundo
A Europa foi surpreendida pela guerra na Ucrânia em 2022, e as sanções econômicas sobre a Rússia levaram a uma séria crise energética, reforçando o problema de inflação que as economias mundiais começaram a enfrentar desde 2021. No entanto, 2023 marca o ano de uma forte recuperação da economia europeia, em meio ao inverno mais quente da história, o que mantém as reservas de gás natural em níveis muito mais altos do que esperado.
Com a resolução da crise de energia, a inflação é finalmente colocada sob controle, o que dá espaço para o Banco Central Europeu parar de subir os juros, impulsionando a atividade econômica e os mercados. Além disso, a reabertura da China depois de três anos de lockdowns leva milhares de chineses a finalmente viajar para fora do país, impulsionando fortemente o turismo e atividades na Europa. Com essa forte recuperação econômica, o mercado europeu tem um desempenho impressionante e ultrapassa outros mercados globais.
Por que é improvável?
A economia europeia ainda deve encontrar desafios em 2023, com a continuação da guerra na Ucrânia, a crise energética longe de ser resolvida, condições financeiras em níveis ainda restritos e expectativas de um crescimento econômico global fraco. Segundo a Bloomberg, o mercado atribui uma probabilidade de 80% para uma recessão econômica na Zona do Euro, muito maior do que os 65% para os EUA.
4 – Montadoras do mundo passam 100% da produção para veículos elétricos, abandonando carros a diesel e gasolina
Os esforços para atingir emissões líquidas zero são crescentes ao redor do mundo, com mais de 140 países assumindo o compromisso de metas “Net Zero”, sendo estas nações responsáveis por 90% das emissões globais. Tais ambições, somadas às preocupações com as mudanças climáticas, têm motivado a busca por soluções menos poluentes também no setor de transportes, segmento que responde por 25% das emissões globais de gases de efeito estufa a partir da queima de combustíveis fósseis¹. Nesse contexto, vemos o movimento a caminho da eletrificação ganhando força nos últimos anos.
Embora acreditemos em uma aceleração dessa tendência adiante, vemos que essa transição deve, e precisa, ser gradual. Atualmente, 5% do total da produção e venda de veículos de Estados Unidos, Europa e China são elétricos², enquanto no caso da Noruega os veículos elétricos já representam 54% das vendas anuais de automóveis³.
As grandes montadoras, por exemplo, já possuem metas para aumentarem a fabricação de carros elétricos: a Ford, BMW e Volkswagen firmaram o objetivo de terem 50% de suas vendas globais sendo de veículos elétricos até 2030.
Por que é improvável?
Existem desafios ligados à eletrificação dos automóveis que nos fazem acreditar que a probabilidade da manchete acima seja baixíssima no curto prazo. Dentre eles, destacamos dois principais: (i) o alto preço atual dos EVs na comparação com o de carros tradicionais, principalmente por conta do preço das baterias, que utilizam a tecnologia de íons de lítio; e (ii) a necessidade de desenvolvimento de infraestrutura de recarga, que precisa ser compatível com o carro, já que existem diferentes modelos de EVs no mercado.
Fontes: (1) ONU; (2) BloombergNEF; (3) Norwegian Road Federation; XP Research.
5 – Mundo antecipa meta prevista para 2050 e atinge emissões líquidas zero de carbono já em 2023
O combate às mudanças climáticas é hoje um dos principais desafios por parte dos diferentes países, de forma que todos os olhos estejam voltados para as alternativas visando reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEEs). Nesse desafiador cenário, o acordo final da COP27 reiterou a meta do Pacto Climático de Glasgow de limitar o aumento da temperatura global a 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais, fundamental para conseguirmos atingir a meta de emissões zero em 2050 estipulada pela ONU.
Contudo, uma análise indica que caso os níveis atuais de emissões persistirem, há 50% de chance de que tal objetivo só seja cumprido nove anos acima do definido.
Por que é improvável?
Embora os esforços por parte dos diferentes agentes sejam crescentes, o caminho para o mundo atingir emissões líquidas zero ainda é bastante longo. E mostramos alguns motivos: (i) mais de 52% das emissões totais de CO2 historicamente e em todo o mundo ocorreu a partir de 1990, e tem se intensificado ano após ano¹; e (ii) estima-se que as emissões de GEEs através do consumo de combustíveis fósseis e uso da terra devam atingir o recorde em 2022, alcançando 40,6 GtCO2 (bilhões de toneladas de CO2) globalmente².
Nesse contexto, fica evidente que ainda existe um longo trajeto pela frente para alcançarmos a marca de emissões líquidas zero de carbono no mundo, nos fazendo acreditar que o atingimento desse marco no curto prazo, conforme sugerido pela manchete, seja extremamente improvável.
Fontes: (1) (2) Global Carbon Project; XP Research.
6 – Fundos Imobiliários deixam de pagar dividendos mensais
Apesar da obrigatoriedade de distribuição dos dividendos ser semestral, a maior parte dos FIIs existentes no mercado atualmente faz esse pagamento mensalmente. A maior parte dos investidores de fundos imobiliários opta pela classe de investimento justamente como forma de obter uma renda extra mensal. Por isso, procuram fundos que pagam dividendos mensalmente. No entanto, o pagamento de dividendos em FIIs se baseia na Lei 8.668/93, posteriormente substituída pela Lei 9.779/99. De acordo com a lei, os FIIs devem distribuir a seus cotistas, no mínimo, 95% dos lucros auferidos pelo regime de caixa a cada semestre. Essa apuração é feita com base em balanço ou balancete semestral, encerrados em 30 de junho e 31 de dezembro de cada ano.
Ou seja, assim que aufere as receitas e paga todas as despesas, o FII é obrigado a distribuir 95% do lucro que acumulou em caixa aos seus cotistas. Respeitado o prazo de seis meses definido em lei, cada gestora de FII terá a própria política de distribuição de dividendos. Essa informação é possível de ser encontrada no regulamento do fundo, que disponibiliza também sobre a estratégia, perfil do investimento e outros pontos importantes.
Por que é improvável?
Todos os fundos imobiliários pagam dividendos e ainda são obrigados por lei a distribuir no mínimo 95% do lucro a cada seis meses. No entanto, a grande maioria do FIIs faz o pagamento dos dividendos por mês, uma estratégia para atrair mais investidores.
Como se proteger de eventos imprevistos
Apesar de eventos como os acima serem bem improváveis, imprevistos também acontecem. E podem causar grandes estragos – como o caso da pandemia. Por terem baixíssima probabilidade de ocorrer, poucos ou ninguém incorpora esse tipo de evento em suas previsões. Porém, não conseguir prever não significa que não devemos nos preparar para surpresas.
Uma estratégia de investimentos diversificada em diferentes ativos, regiões e moedas continua sendo a melhor opção para bons resultados no longo prazo. O cenário para 2023 continua bastante desafiador, como elencamos no nosso Onde Investir 2023, com vários riscos globais. Portanto, é importante continuar acompanhando os mercados, se informar, para a melhor tomada de decisão!
Se você ainda não tem conta na XP Investimentos, abra a sua!