- Os resultados fiscais de abril reforçaram um cenário de curto prazo melhor do que o esperado. A atividade forte e a inflação em alta impulsionam a arrecadação, enquanto a falta do orçamento 2021 limita despesas.
- Melhoramos nossas projeções para os indicadores fiscais deste ano. Esperamos agora um déficit primário de 2,6% do PIB (antes 3,2% do PIB), e reduzimos a projeção de dívida bruta/PIB de 87% para 84,5% -- 4,3p.p. abaixo do nível observado ao final do ano passado. O crescimento expressivo do PIB nominal (14%), as devoluções do BNDES e a redução da projeção de déficit primário explicam a dívida mais baixa.
- No entanto, apesar do arrefecimento do risco fiscal "agudo", o risco "crônico" persiste. Aliada de curto prazo, a inflação alta pressiona as despesas indexadas e restringe o orçamento da União, além de aumentar a pressão para elevação da taxa Selic – acrescendo, por sua vez, o serviço da dívida. O risco de perda de arrecadação diante da recente decisão do STF sobre a base de cálculo do PIS/Cofins também requer atenção.
Os resultados de abril
Assim como nos meses anteriores, os resultados de abril revelaram um quadro fiscal marcado por receitas robustas e despesas abaixo do patamar histórico.
Do lado da arrecadação, o resultado mensal mais uma vez acima do esperado pelo consenso de mercado (em R$ 156,8 bi frente expectativas de R$ 141,3 bi) aponta para a resiliência da atividade econômica observada no 1T21, uma moeda desvalorizada que impulsiona os impostos de importação, e preços ao produtor pressionados pelo aumento das commodities e desequilíbrios na cadeia de produção. Sobre o impacto dos preços na arrecadação, vale destacar a diferença entre o patamar da inflação ao consumidor (IPCA em 6,76% no acumulado em 12 meses até abril) e a os custos de insumos refletidos em indicadores de preços ao produtor (IGP-M em 37% no mesmo período) – sobre os quais incidem grande parte dos impostos ao longo da cadeia produtiva e determinados contratos. Ou seja, mesmo considerando aumentos deflacionados pelo IPCA, os resultados seguem beneficiados pela alta de preços.
Já do lado das despesas, o resultado de abril indica gastos reduzidos devido ao orçamento ainda pendente (aprovado ao final de mês), especialmente nas despesas discricionárias - que caíram 38,4% no comparativo anual. Nesse sentido, o aumento de gastos relativos ao combate à pandemia esse ano, incluindo a nova rodada de auxílio emergencial e aquisição de vacinas, não foram o suficiente para carregar as contas ao vermelho no mês.
Vale destacar também o resultado dos governos regionais, que registraram superávit de R$ 7,0 bilhões no mês, uma performance quase 10 vezes melhor (em termos nominais) do que a observada em 2019, ano anterior aos impactos da pandemia da covid-19. As razões por trás do desempenho positivo incluem receitas robustas que vão além da sazonalidade positiva observada no início do ano, além de gastos provavelmente reduzidos devido aos desafios da pandemia ainda em curso. O novo pacote de negociação de dívidas de estados, além da garantia ainda obrigatória da União para dívidas de estados com instituições financeiras (por decisão do STF de 2019) também contribuem para a melhoria observada.
Deste modo, o resultado primário do governo geral caiu para 7,08% do PIB no acumulado em doze meses até abril (de 8,79% do PIB em março), levando a uma queda de mais de 2p.p. do PIB da dívida bruta – que fechou o mês em 86,7% (de 89,1% em março).
Revisamos a projeção de Dívida Bruta / PIB para 84,5%
Olhando para frente, esperamos que os gastos finalmente se normalizem após a aprovação do orçamento de 2021, portanto, reduzindo as surpresas mensais positivas. No entanto, os principais fatores observados até agora no lado da receita devem continuar fortalecendo a arrecadação de tributos, principalmente no tocante aos preços ao produtor.
Vale destacar, nesse sentido, um importante risco ao quadro cenário positivo de esperado para a arrecadação, atrelado à recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no tocante a exclusão do ICMS sobre a base de cálculo do PIS/Cofins. De acordo com cálculo da Instituição Fiscal Independente (IFI), a perda de arrecadação por meio de compensações tributárias por parte da União pode chegar a R$ 121 bilhões esse ano – se consideradas, além das receitas já esperadas para o ano, também potenciais passivos relativos ao período entre 2017 e 2020 encerrados ainda esse ano.
Não obstante, diante do quadro descrito acima, alteramos para melhor nossas projeções para as contas públicas nesse ano. Passamos a esperar um déficit primário de 2,6% do PIB (de 3,2%), fruto especialmente da melhora na arrecadação (agora esperada em R$ 1.724 bilhões no ano).
Além de um resultado primário melhor que o esperado, a alta dos preços também contribui para a redução da relação dívida/PIB, conforme gráfico abaixo. Assim, esperamos que a dívida encerre o ano em 84,5% do PIB – 4,3p.p. abaixo do nível observado ao final do ano passado.
Alívio de curto prazo não resolve o risco estrutural
Conforme descrito acima, abril seguiu a tendência dos primeiros meses do ano, e foi marcado por notícias positivas do lado fiscal. A melhora da arrecadação foi resultado o maior crescimento da economia e da inflação pressionada. Com isso, o PIB nominal deve ser (bem) maior do que o esperado, contribuindo para melhorar os múltiplos fiscais (dívidas/PIB; resultado primário/PIB).
De fato, em nosso relatório mensal de maio, escrevemos que o risco fiscal “agudo”, de curto prazo, havia se reduzido com o acordo do orçamento. Este risco se reduziu ainda mais com as novas estimativas de receitas e despesas do governo divulgadas no relatório bimestral de maio. Por um lado, as receitas projetadas do Governo Federal foram elevadas em R$ 108 bilhões, melhorando sobremaneira a projeção do resultado primário. Por outro a projeção de despesas obrigatórias recuou R$ 4,8 bilhões, tornando menos apertado o cumprimento do teto de gastos.
O gráfico abaixo ilustra a melhora do risco “agudo” fiscal. Em outubro do ano passado, projetávamos que a dívida bruta do governo geral, como proporção do PIB, terminaria 2021 acima de 96%. Hoje nossa projeção está próxima a 84%, uma melhora acima de 10 pontos do PIB!
No entanto, o risco “crônico” fiscal, caracterizado pela dívida elevada, juros reais altos e orçamento engessado com mais de 90% de despesas primárias obrigatórias, persiste. Mesmo com a melhora nas projeções para este ano, a dívida brasileira segue significativamente acima da média das outras economias emergentes – conforme gráfico abaixo.
A inflação elevada ajuda as contas fiscais no curto prazo, mas no médio prazo pressiona as despesas indexadas (grande maioria das despesas obrigatórias do governo). A cada 1p.p. de aumento no INPC, são R$ 7,6 bilhões adicionais no total de despesa obrigatórias do orçamento da União.
Além disso, o cenário de preços em alta tende a levar o Banco Central a subir mais a taxa de juros, aumentando o serviço da dívida. Com 46,1% do total da dívida bruta atrelada à taxa Selic e 35% a vencer nos próximos 12 meses, cada 1p.p. de aumento percentual na taxa básica de juros eleva o custo desta em R$ 31,3 bilhões (ou 0,41% do PIB).
Vale lembrar também o potencial de perda de arrecadação oriundo da decisão do STF mencionada anteriormente, cujos efeitos serão provavelmente sentidos ao longo dos próximos anos.
Nesse contexto, a dívida deve retomar sua tendência ascendente já do ano que vem, quando esperamos que um déficit primário de 1,4% do PIB e uma taxa de juros incidente sobre a dívida aproximadamente 1,5p.p. maior do que a observada esse ano elevem a dívida bruta para 87,1% do PIB.
Esta realidade não se reverte no curto prazo. Demandam reformas estruturais que verdadeiramente desobrigue, desvincule e desindexe as despesas. E que aumente a produtividade da economia, aumentando o potencial de crescimento do PIB a longo prazo.
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