No dia 10 de janeiro de 2024, foi sancionada a Lei 14.801/24, que criou a debênture de infraestrutura. O tema pode ter causado dúvidas nos investidores, uma vez que já existiam as debêntures incentivadas (Lei 12.431/11), voltadas ao financiamento de obras nos setores de infraestrutura no Brasil. De fato, há diferenças entre as duas, as quais explicamos neste artigo.
Relembrando a debênture incentivada (Lei 12.431/11)
Objetivo
As debêntures incentivadas, criadas em 2011 através da Lei 12.431, são aquelas emitidas por empresas que estão captando recursos para projetos de infraestrutura, como as Companhias dos setores de Energia, Transporte/Logística, Telecomunicações e Saneamento.
Isenção de IR e principais investidores
Por serem investimentos importantes para o desenvolvimento do país, e que necessitam da participação da iniciativa privada para levantar mais recursos, o governo concede benefício fiscal aos investidores pessoa física através de isenção de cobrança de impostos (imposto de renda - IR - e IOF). É importante ressaltar que o tributo incide apenas sobre a rentabilidade, e não sobre todo o valor aplicado.
São beneficiados também fundos de infraestrutura (FI-Infra), que devem ter no mínimo 85% alocados em debêntures incentivadas para serem considerados enquadrados.
Prazo da emissão
Como esses projetos costumam apresentar prazo relativamente longo para realização (estudos, licenças, obras), as debêntures também são mais longas, tendo obrigatoriamente prazo médio ponderado (duration) mínimo de 4 anos.
Remuneração
Outra característica importante desses ativos é que deverão ser remunerados por taxa prefixada, que pode ou não ser acrescida de índice de preços (como o Índice de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA) ou da Taxa Referencial (TR).
O IPCA é o indexador mais comum de encontrarmos no mercado, uma vez que, em geral, as tarifas cobradas pelas concessionárias de infraestrutura são corrigidas anualmente pela inflação, levando a uma proteção "natural" da dívida. Não é permitida a remuneração pós-fixada (CDI).
Riscos
Por serem emissões realizadas por empresas (crédito privado), não contam com garantias como o Fundo Garantidor de Créditos - FGC.
Além disso, é preciso lembrar que são utilizadas para financiamento de projetos, que apresentam risco de construção, execução e operação, por exemplo. Ou seja, o pagamento da remuneração aos investidores dependerá do sucesso do projeto, por isso é necessário que o investidor se atente à qualidade da empresa emissora e de suas contrapartes. Vale mencionar que, no caso de projetos, é comum que as emissões contem com estrutura de garantias, visando reduzir os riscos mencionados.
Ademais, estas debêntures também apresentam riscos comuns a outros investimentos em renda fixa (veja aqui).
Sendo assim, as debêntures de infraestrutura são mais arriscadas do que investimentos mais conservadores de renda fixa e, por isso, oferecem retornos comparativamente maiores.
Para auxiliar nesta decisão, conheça seu perfil de investidor e conte com relatórios de análises, avaliações de agências de ratings e ajuda de especialistas.
As novas debêntures de infraestrutura (Lei 14.801/24)
Objetivo
Com a sanção da Lei 14.801/24, foram criadas as novas debêntures de infraestrutura, que não têm o objetivo de substituir as debêntures incentivadas, e sim de complementá-las.
De forma semelhante às debêntures regidas pela Lei 12.431/11, os novos títulos deverão ser emitidos por concessionárias, permissionárias e companhias autorizadas a explorar serviços públicos, e os recursos deverão ser aplicados em projetos de investimento ou de produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação.
Espera-se que o rol de setores que poderão oferecer debêntures, em geral, aumente, que é o caso de projetos voltados para a eficiência energética, unidades de conservação ambiental, unidades de saúde, além de escolas. Os critérios para enquadramento de projetos como prioritários deverão ser estabelecidos em regulamento a ser editado pelo Poder Executivo Federal.
Setores Prioritários: são os setores das empresas que podem emitir tanto as debentures incentivadas 12.431 como as debentures de infraestrutura. Os setores de educação e saúde foram adicionados como Setores Prioritários em 2023, por exemplo.
Ademais, os títulos deverão ser emitidos até 31 de dezembro de 2030 para contar com o benefício fiscal, assim como nas debêntures incentivadas (explicação a seguir).
Isenção de IR e principais investidores
A principal diferença que podemos apontar entre os dois instrumentos é o público-alvo do incentivo fiscal: as novas debêntures de infraestrutura irão beneficiar as empresas emissoras em relação ao recolhimento de IR. Isso ocorrerá através da dedução dos juros pagos da apuração do lucro líquido, sendo também possível deduzir 30% dos juros das debêntures da determinação da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Com a isenção, as empresas terão espaço para repassar parte do benefício para o investidor com emissões a taxas mais atrativas.
Além disso, novos "bolsos", que não tinham acesso à isenção das debêntures incentivadas, deverão ser atraídos a aplicar nestes títulos, como fundos de pensão, dentre outros. Isto deve permitir um alongamento do prazo médio investido por estas instituições, permitindo acesso a remunerações mais altas aos investidores.
Prazo da emissão
De maneira semelhante às debêntures incentivadas, as debêntures de infraestrutura deverão apresentar duration superior a quatro anos.
Remuneração
Como a lei é muito recente, ainda não houve emissões por ela regidas, o que ainda deixa espaço para interpretações. No entanto, alguns escritórios de advocacia com especialidade em mercados de capitais publicaram seus pareceres sobre a Lei 14.801/24 e seu entendimento de que, assim como nas debêntures incentivadas, as debêntures de infraestrutura deverão ser remuneradas por taxa de juros prefixada, que poderá ser vinculada a índice de preço (como o IPCA) ou à TR. É vedada a pactuação total ou parcial de taxa de juros pós-fixada.
A novidade da Lei 14.801/24 é a possibilidade de emissão com cláusula de variação da taxa cambial, conforme autorização a ser dada por ato do Poder Executivo Federal, o que tende a tornar o papel mais atrativo aos investidores estrangeiros.
Riscos
Os riscos destes títulos, para investidores que optarem por eles, são os mesmos das debêntures incentivadas (mencionados acima).
Nova Debênture de Infraestrutura vs. Debênture Incentivada
*A remuneração deve ser prefixada e/ou indexada a índice de preços ou à TR. O índice mais comumente utilizado é o IPCA. No caso da Lei 14.801/24, será importante o acompanhamento das emissões à medida em que forem realizadas para entendimento de qual indexador será o mais utilizado.
Qual o impacto para os investidores pessoa física?
O que muda
Tributação: Investidores brasileiros pessoa física serão tributados na fonte, como em qualquer outro investimento de renda fixa, seguindo a tabela regressiva de acordo com o tempo de investimento (alíquota de 22,5% a 15%). Ou seja, não serão isentos de imposto de renda.
Em geral, os investidores estrangeiros pagarão 15% de IR sobre os ganhos com as debêntures de infraestrutura. Se o investidor estrangeiro for residente em país com tributação favorecida, o IR será de 25%, em linha com os acordos internacionais dos quais o Brasil faz parte para evitar a evasão fiscal.
O que tende a mudar
Maior liquidez no mercado secundário: No entendimento de agentes do mercado, uma vez que mais investidores institucionais terão incentivos para escolher esses novos títulos, a tendência é de aquecimento do mercado secundário - o que acaba por afetar positivamente investidores como um todo com a maior liquidez disponível. Vemos isto como um fator positivo para a continuidade de desenvolvimento do crédito privado local.
Melhor remuneração: A expectativa do mercado é de que, com os benefícios fiscais da captação, as empresas possam repassar melhores condições de remuneração aos investidores.
O que permanece igual
Acesso: as debêntures de infraestrutura também serão distribuídas ao mercado, assim como as debêntures comuns e incentivadas, oferecendo acesso aos investidores pessoa física a estes instrumentos.
Debêntures incentivadas: As já conhecidas debêntures com isenção fiscal para os investidores pessoa física continuarão existindo, sem mudanças relevantes em suas características. As novas debêntures, como citado anteriormente, vêm como um complemento ao rol de opções de títulos voltados ao financiamento de infraestrutura e não têm como objetivo substituir ou extinguir as debêntures incentivadas.
Fontes
Presidência da República
Câmara Legislativa
B3
Lefosse
Tozzini Freire
Infomoney
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