XP Expert

Zeina Latif: Aberração tributária

Neutralidade, isonomia, simplicidade, transparência e capacidade de arrecadação são princípios básicos de um sistema tributário. Em que pese esses princípios serem, por vezes, conflitantes entre si, o fato é que o Brasil destoa da experiência mundial.

Compartilhar:

  • Compartilhar no Facebook
  • Compartilhar no X
  • Compartilhar no Whatsapp
  • Compartilhar no LinkedIn
  • Compartilhar via E-mail
Onde Investir em 2025 banner

Neutralidade, isonomia, simplicidade, transparência e capacidade de arrecadação são princípios básicos de um sistema tributário. Em que pese esses princípios serem, por vezes, conflitantes entre si, o fato é que o Brasil destoa da experiência mundial.

1) Neutralidade significa a tributação não contaminar as decisões de investimentos. No entanto, no Brasil, as distorções do sistema fazem com que empresários invistam em atividades ineficientes, apenas para pagar menos impostos. O Simples, por exemplo, estimula as empresas a continuarem pequenas, uma vez que o aumento do faturamento implicaria migrar para outro regime, com maior complexidade e carga tributária. Muitas empresas aumentam a informalidade ou criam outro CNPJ. O resultado é um grande número de empresas pequenas pouco eficientes, prejudicando a produtividade da economia.

2) Isonomia significa que os iguais devem estar sujeitos à mesma carga tributária. Não é o que ocorre, por exemplo, na tributação de alguns profissionais. Como pontua Bernard Appy, um advogado que recolhe como pessoa jurídica no lucro presumido pagará muito menos impostos do que na carteira assinada. Menos ainda no Simples. Nesses regimes, o lucro obtido acima do estimado pela Receita Federal é isento de Imposto de Renda. Tampouco há isonomia entre empresas, pois a carga pode variar de acordo com o tamanho, a localização, o setor e o tipo de item produzido – o que também fere o princípio da neutralidade.

3) Simplicidade é artigo raro. O Estado patrimonialista (cada grupo busca seu benefício tributário), combinado ao hábito de protelar reformas (preferimos os “puxadinhos”), gerou um dos mais complexos sistemas tributários no mundo. Desde a Constituição, foram emitidas mais de 403 mil normas tributárias nas três esferas de governo, segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação. Além das diferentes regras, há muitas obrigações acessórias (preenchimento de fichas).

O empresário nunca tem certeza se está cumprindo todas as obrigações. A insegurança jurídica é enorme e custosa. Os problemas começam já na dificuldade de interpretar as regras para classificação e enquadramento do bem ou serviço. Um exemplo singelo: há quatro tipos diferentes de feijoada para fins de tributação, segundo a Endeavor.

A substituição tributária do ICMS é um capítulo à parte. Os Estados exigem das empresas de alguns setores o pagamento antecipado por toda a comercialização posterior até o varejo. É o caso do setor de bebidas.

Depois vêm os problemas na apuração e pagamento. Há dificuldades para definir o que é insumo e, portanto, definir o crédito tributário, e para obter a restituição dos mesmos. Apenas alguns impostos geram crédito tributário, e de forma restrita. O resultado é a elevada cumulatividade, com imposto incidindo sobre imposto. Isso explica a carga tributária mais elevada da indústria.

Percorrido o labirinto, surgem as dificuldades na contestação, por conta das diferentes interpretações das regras por contribuintes, fiscos e Judiciário, havendo ainda morosidade na tramitação dos processos. Fora os setores em “zona cinzenta”, como os de tecnologia, gerando disputa entre os fiscos. O resultado é um exército de advogados e contadores, em vez de engenheiros e pessoal de TI para aumentar a produtividade.

Lorreine Messias e Larissa Longo apontam que as disputas tributárias totais equivalem a 73% do PIB. A título de comparação, o contencioso administrativo federal está em 16,4% do PIB, ante 0,19% na América Latina.

4) Transparência pouco existe, por conta de regras obscuras sobre os tributos devidos, assim como as incontáveis renúncias tributárias. Na esfera federal, elas totalizam mais de 4% do PIB; nos Estados e municípios, não há estimativas. Não há tampouco avaliação de impacto, sendo que muitas delas geram distorções, como a Zona Franca de Manaus (a produção está distante da oferta de insumos e da demanda do bem final), e injustiças, como as isenções de Imposto de Renda (beneficia os mais ricos).

5) A capacidade de arrecadação tem sido o princípio privilegiado pelo Fisco, por conta das despesas públicas crescentes. A saída oportunista tem sido onerar mais onde é mais fácil arrecadar, a tributar proporcionalmente a renda de cada um. Isso agrava a desigualdade e penaliza as empresas mais eficientes. Sem reformas estruturais para conter os gastos obrigatórios, não será possível reduzir a elevada carga tributária.

Este artigo está longe de exaurir o assunto. Temas como os elevados encargos trabalhistas e as injustiças sociais não foram abordados. E não há soluções fáceis tecnicamente. Não existirá tampouco uma reforma tributária ampla o suficiente para corrigir tantos problemas. Sendo os impostos sobre o consumo as maiores fontes de distorções, a criação do imposto sobre o valor agregado (IVA) – o regime que prevalece no mundo – em substituição ao IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS seria um passo importante para reduzir vários dos problemas acima.

Os empresários deveriam se unir em favor de reformas do sistema tributário. Porém, é difícil isso acontecer, pois há muitos interesses conflitantes. O varejo e os serviços, por exemplo, rejeitam o IVA, pois temem ter de pagar tributos como o restante da sociedade, e defendem a volta da distorcida CPMF para poder contribuir menos para a Previdência Social.

Quanto vai ter de piorar para enfrentarmos esse desafio?

Fonte: Artigo replicado do Estadão.

XPInc CTA

Se você ainda não tem conta na XP Investimentos, abra a sua!

XP Expert

Avaliação

O quão foi útil este conteúdo pra você?


Newsletter
Newsletter

Gostaria de receber nossos conteúdos por e-mail?

Cadastre-se e receba grátis nossos relatórios e recomendações de investimentos

Disclaimer:

Este relatório foi preparado pela XP Investimentos CCTVM S.A. (“XP Investimentos”) e não deve ser considerado um relatório de análise para os fins do artigo 1º na Resolução CVM 20/2021. Este relatório tem como objetivo único fornecer informações macroeconômicas e análises políticas, e não constitui e nem deve ser interpretado como sendo uma oferta de compra/venda ou como uma solicitação de uma oferta de compra/venda de qualquer instrumento financeiro, ou de participação em uma determinada estratégia de negócios em qualquer jurisdição. As informações contidas neste relatório foram consideradas razoáveis na data em que ele foi divulgado e foram obtidas de fontes públicas consideradas confiáveis. A XP Investimentos não dá nenhuma segurança ou garantia, seja de forma expressa ou implícita, sobre a integridade, confiabilidade ou exatidão dessas informações. Este relatório também não tem a intenção de ser uma relação completa ou resumida dos mercados ou desdobramentos nele abordados. As opiniões, estimativas e projeções expressas neste relatório refletem a opinião atual do responsável pelo conteúdo deste relatório na data de sua divulgação e estão, portanto, sujeitas a alterações sem aviso prévio. A XP Investimentos não tem obrigação de atualizar, modificar ou alterar este relatório e de informar o leitor. O responsável pela elaboração deste relatório certifica que as opiniões expressas nele refletem, de forma precisa, única e exclusiva, suas visões e opiniões pessoais, e foram produzidas de forma independente e autônoma, inclusive em relação a XP Investimentos. Este relatório é destinado à circulação exclusiva para a rede de relacionamento da XP Investimentos, incluindo agentes autônomos da XP e clientes da XP, podendo também ser divulgado no site da XP. Fica proibida a sua reprodução ou redistribuição para qualquer pessoa, no todo ou em parte, qualquer que seja o propósito, sem o prévio consentimento expresso da XP Investimentos. A XP Investimentos não se responsabiliza por decisões de investimentos que venham a ser tomadas com base nas informações divulgadas e se exime de qualquer responsabilidade por quaisquer prejuízos, diretos ou indiretos, que venham a decorrer da utilização deste material ou seu conteúdo. A Ouvidoria da XP Investimentos tem a missão de servir de canal de contato sempre que os clientes que não se sentirem satisfeitos com as soluções dadas pela empresa aos seus problemas. O contato pode ser realizado por meio do telefone: 0800 722 3710. Para maiores informações sobre produtos, tabelas de custos operacionais e política de cobrança, favor acessar o nosso site: www.xpi.com.br.

A XP Investimentos CCTVM S/A, inscrita sob o CNPJ: 02.332.886/0001-04, é uma instituição financeira autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil.Toda comunicação através de rede mundial de computadores está sujeita a interrupções ou atrasos, podendo impedir ou prejudicar o envio de ordens ou a recepção de informações atualizadas. A XP Investimentos exime-se de responsabilidade por danos sofridos por seus clientes, por força de falha de serviços disponibilizados por terceiros. A XP Investimentos CCTVM S/A é instituição autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil.


Este site usa cookies e dados pessoais de acordo com a nossa Política de Cookies (gerencie suas preferências de cookies) e a nossa Política de Privacidade.