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A Americanas faliu?
Não. Apesar de todo o caso ter tomado grandes proporções, com impacto muito negativo para a empresa, ela não decretou pedido de falência. O que ocorreu foi o pedido de recuperação judicial (RJ), o que significa que a Americanas conseguiu 180 dias de proteção contra execução de credores (ou seja, sem que eles possam cobrar da empresa o pagamento de dívidas), e terá agora que elaborar e apresentar um plano de reestruturação da companhia em até 60 dias, conhecido como plano de recuperação judicial.
Este plano inclui a forma como espera ressarcir todos os seus credores – o que muito provavelmente envolverá extensão de prazos e desconto nos valores, além de necessidade de capitalização e venda de ativos.
O processo de RJ costuma ser longo, por envolver diversas partes e negociação entre elas. Historicamente, em média, processos duraram cerca de um ano, mas podem ser mais longos do que isso.
Atualização (25/01): A Americanas publicou, na manhã do dia 25 de janeiro, a lista de seus credores e valores que deve para cada um. Confira aqui. Assim como esperado, logo após a divulgação, já houve contestação por parte do Banco BV acerca do valor anunciado (que teria vindo maior do que o realmente devido pela varejista). Acreditamos que, a partir de agora, negociações entre as partes aconteçam até chegarem a um entendimento sobre montantes.
Vale destacar que, no caso da aprovação do plano de recuperação judicial, não significa que os credores receberão imediatamente seus recursos, mas sim terão conhecimento da forma e prazo do recebimento.
A falência só ocorrerá caso a Americanas não apresente o plano de RJ dentro do prazo (60 dias), ou ainda se não houver um acordo em definitivo entre a Companhia e seus credores no plano de recuperação judicial.
Entenda os termos financeiros e jurídicos do caso
Como o caso impactou o mercado de renda fixa?
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Nos dias seguintes após o anúncio de descobrimento das inconsistências contábeis (11/01), foi possível observar queda no volume negociado e elevação nos prêmios de risco (spreads) de títulos de crédito privado no mercado secundário. O interessante foi observar que isto não ocorreu apenas nos ativos da Americanas, mas de forma generalizada.
De acordo com gestores de renda fixa, o efeito foi mais acentuado logo nos primeiros dias, o que pode ser explicado por um aumento na aversão a risco de investidores no primeiro momento, tendo sido atenuado conforme se deram os desdobramentos.
Além disso, com elevação de spreads, papeis de renda fixa e cotas de fundos se desvalorizam, devido à marcação a mercado, o que também pode gerar um movimento de resgates por parte de investidores. Gestores, para fazerem frente a estes resgates, podem precisar vender títulos, o que contribui para o aumento nos spreads.
Apesar disso, entende-se que o estresse está controlado e não se equipara ao que ocorreu em março de 2020, no início da covid-19, por se tratar de um caso pontual.
Novas emissões devem ser impactadas?
A magnitude das inconsistências contábeis do caso Americanas, que envolveu dívidas declaradas de mais de R$ 40 bilhões em uma base de mais de 16 mil credores, e com impacto em quase todas as classes de ativos (ações, fundos de investimentos e claro, renda fixa), criou um clima de incerteza no mercado de crédito, o que, no geral, implica em maior prêmio de risco exigido pelos agentes financeiros.
Um movimento de aversão a risco mais amplo no mercado secundário acaba “contaminando” também o mercado primário, ainda que durante uma janela de tempo relativamente curta.
Na prática, isso significa que a leitura do risco de crédito foi reprecificada, e está maior neste momento. Desta forma, é possível que as taxas acordadas com as instituições financeiras das novas emissões que estavam em andamento (de qualquer empresa ou setor) tenham dificuldade para serem mantidas no mesmo patamar praticado anteriormente, ou ainda ocasionar em uma decisão de postergação da emissão.
Investir em debêntures ficou mais arriscado?
Em nossa visão, não. Debêntures são títulos de renda fixa emitidos por empresas. Sendo assim, geralmente apresentam risco mais alto do que títulos públicos (uma vez que o governo, em último caso, pode emitir moeda para pagar suas dívidas em reais – dentre outros motivos). Também são mais arriscadas do que títulos bancários, por não contarem com a garantia do Fundo Garantidor de Créditos – FGC.
O caso da Americanas corrobora o entendimento de risco mais elevado das debêntures em relação a outras opções de renda fixa, em troca de uma remuneração comparativamente maior. Mas não torna o instrumento em si mais arriscado e continuamos enxergando as debêntures como uma boa alternativa para elevar o potencial de retorno da carteira (desde que enquadradas no perfil de investidor).
Apesar de, em muitos casos, não termos como prever um default (calote), é possível investir em debêntures e se proteger de impactos muito negativos na ocasião de problemas de crédito. Uma delas é a diversificação.
A diversificação é importante justamente para, quando (e se) houver movimento negativo em algum ativo da carteira, outros poderem amortecer a queda. Por este motivo, quanto mais arriscado o ativo, menor deve ser a exposição do investidor a ele. Em nossa opinião, o ideal ao investir em crédito privado é ter no máximo de 3% a 5% de sua alocação em um mesmo nome – e evitar concentrar muitos nomes de um mesmo setor.
Por que o rating era alto antes?
As agências de rating (S&P Global, Fitch e Moody’s) utilizam uma combinação de informações públicas e privadas (confidenciais) para chegar ao resultado final de sua avaliação.
No caso de empresas abertas (S.A.), que contam com auditoria de grandes empresas do segmento, as agências de classificação de risco utilizam balanços previamente auditados – confiando, assim, neste escrutínio. Afinal, não faz parte de sua função auditar ou identificar possíveis inconsistências contábeis.
Antes do anúncio de renúncia do ex-CEO da Americanas, Sergio Rial, o rating da empresa encontrava-se acima do rating soberano do Brasil, em ‘BB’ (ou Baa2 na Moody’s) na escala global. Sua avaliação acima do rating soberano (possível apenas a empresas que passem em testes de cenários de estresse), era baseada, dentre outros fatores, em sua forte liquidez e estrutura de capital sólida, com cronograma alongado de amortização de dívidas.
Ou seja, tomando-se como base informações auditadas, fornecidas pela empresa e conhecidas pelo mercado em geral até aquele momento, a avaliação das agências de rating era de solidez da Americanas. No entanto, não era possível prever (como demonstrado pela surpresa generalizada no mercado) o que veio a ocorrer.
Sendo assim, nestes casos cabe às agências de rating responderem prontamente aos novos fatos, o que foi feito nos dias posteriores. Ou seja, o fato de a Americanas ter sido classificada com elevada nota anteriormente ao anúncio do dia 11/01 não torna as agências menos confiáveis.
O que acontece agora com os investidores de renda fixa da Americanas?
Marcação a Mercado: Em um processo de RJ, o primeiro impacto sentido pelo investidor de renda fixa é visto na posição de custódia, uma vez que os títulos de dívida da empresa deixam de ser negociados, e têm o seu valor zerado na marcação a mercado. Isto difere das ações, que deixam de fazer parte dos índices da bolsa (veja mais aqui), mas as negociações continuam.
Acompanhamento do Processo: A partir da publicação do quadro geral de credores, que deve ocorrer em até 48 horas da aprovação da RJ, o investidor saberá em que categoria foi classificado, por exemplo, dentro das dívidas com garantia ou sem garantia (quirografárias), e poderá realizar seu voto contra ou a favor do plano em Assembleia Geral de Credores. É comum apoio do agente fiduciário nessa intermediação, e em toda a comunicação sobre as decorrências do processo.
Suspensão dos recebimentos: Com a RJ, a Americanas suspenderá o curso normal de pagamentos de juros e principal de seus títulos de dívida, os quais passarão a ser submetidos às condições do plano aprovado.
Continuaremos acompanhando o andamento do processo de RJ para manter investidores informados.