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Solução para precatórios resolve um problema, mas cria outro

O governo solicitou a declaração de inconstitucionalidade da emenda que estabeleceu o limite de pagamento de precatórios. A proposta não deve abrir espaço nos exercícios seguintes. Entretanto, vemos como problemática a mudança na classificação de despesa primária e financeira dos juros de mora dos precatórios.

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A Advocacia Geral da União (AGU) solicitou ao Supremo Tribunal Federal que declare a inconstitucionalidade dos artigos 114 do ADCT e do § 11 do art. 100 da Constituição Federal que instituíram o limite de pagamento de precatórios e a possibilidade uso de precatórios para pagamento de obrigações junto à União.

Além disso, a fim de resolver o estoque de precatórios expedidos e não pagos, inclusive Fundef, requereu ao STF que admitisse o pagamento do montante acumulado por meio de crédito extraordinário, de forma segregada entre o valor principal da causa e os encargos financeiros, que seriam quitados por meio de despesa primária e financeira, respectivamente. Solicitou ainda que eventual descumprimento da meta de resultado primário por conta do pagamento não implique penalização segundo as regras fiscais.

A proposta é positiva promover a quitação do estoque de precatórios expedidos e não pagos até o momento. Ao colocar em dias as obrigações do governo, diminui-se substancialmente a pressão adiante. As informações disponibilizadas indicam um estoque de aproximadamente R$ 95 bilhões considerando-se os valores acumulados nos orçamentos de 2022, 2023 e 2024, o que deve elevar a dívida pública em 0,9 pp. – mas, nesse caso, trata-se de reconhecer um valor já existente e não contabilizado.

Mas a mudança na classificação das despesas é problemática. A fim de justificar uma interpretação diferente, o parecer da STN/PGFN aponta que os precatórios expedidos e não pagos constituiriam dívida consolidada. A nosso ver, tal leitura é equivocada: os precatórios continuam representando obrigações relacionadas à sua natureza original. Despesas com pessoal que se originam de precatórios continuam sendo uma despesa de pessoal, ainda que sejam pagas anos depois, logo a natureza primária se mantém.

Alega também que os juros de mora têm natureza autônoma em relação à natureza jurídica da verba em atraso. Com isso, pretende-se impor uma visão legal/jurídica sobre um conceito técnico. Entretanto, pode-se argumentar o mesmo para as receitas decorrentes de juros de mora do pagamento de tributos, que são receitas primárias. Logo, acatar a interpretação da STN/PGFN implica adotar com um tratamento diferenciado para juros de mora relacionados a receitas e despesas dentro das estatísticas oficiais.

Mudança em precatórios não deve afetar orçamento de 2024. A princípio, o orçamento de 2024 tem uma previsão de R$ 16 bilhões destinados integralmente ao pagamento de precatórios expedidos e não pagos (possivelmente do ano de 2022), respeitando a fila criada pela emenda constitucional nº 114/2021. Com o pagamento desses precatórios, o valor deve ser preenchido por precatórios que seriam pagos regularmente em 2024, o que não altera a previsão orçamentária.

Não obstante, considerando que uma parcela das sentenças judiciais pode ser classificada como despesa financeira (que é exceção ao limite de despesas), há possibilidade de que se crie algum espaço no orçamento. Não está claro se esse espaço será ocupado pelo restante dos precatórios do exercício ou por outras despesas. Considerando o valor de R$ 66,4 bilhões, com 30% de despesas financeiras, um espaço de aproximadamente R$ 20 bilhões seria criado.

Solução afeta os exercícios seguintes. Com o fim do limite de pagamento, o orçamento para os anos de 2025 e 2026 deve contemplar a totalidade de precatórios expedidos pela Justiça. Uma parte significativa desses valores continuaria a ser classificada como despesa primária (caso o argumento do governo seja aceito), e possivelmente os valores ficariam acima do limite de pagamentos. Isso deve gerar uma pressão sobre o limite de despesas, comprimindo as despesas discricionárias como ocorreu no passado. Aliás, não é inevitável que um novo “meteoro” atinja o orçamento federal. Com um alto grau de judicialização, em especial de benefícios previdenciários e assistenciais, é pouco provável que essa despesa cresça de forma comportada nos próximos anos.

Mudanças impactam indiretamente as receitas. O pagamento de obrigações junto ao governo utilizando-se precatórios não constitui receita primária. Com o fim dessa possibilidade, o governo deve ser beneficiado na medida em que mais recursos devem entrar no seu caixa. A mudança deve afetar inclusive as obrigações decorrentes de decisões proferidas no CARF por meio do voto de qualidade, na qual admitia-se o uso de precatórios para pagamentos de parcelas.

Ao fim, mudança é positivamente líquida. Ao quitar os precatórios expedidos e não pagos, o governo evita um problema em 2027 que provavelmente resultaria em outra postergação de pagamentos. Ainda há dúvidas com relação ao orçamento de 2024, mas a proposta não deve abrir espaço nos exercícios seguintes por conta do volume de sentenças judiciais. Entretanto, vemos como problemática a mudança na classificação de despesa primária e financeira dos juros de mora dos precatórios.

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