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Reforma tributária: Um grande passo para destravar a Economia

Será que agora estamos diante de uma proposta que, efetivamente, tem chances de ser aprovada depois de tantas tentativas? Entenda o que está em pauta, como os setores podem ser impactados e a importância da reforma tributária para a economia

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A discussão sobre a reforma tributária no Brasil não é nova e, mais uma vez, ela está de volta aos holofotes e ao debate político-econômico. Mas, desta vez, as expectativas sobre uma profunda mudança na carga de impostos do Brasil são maiores devido à pressão do empresariado em relação a uma possível melhora no ambiente de negócios nacional e, também, pelo fato de a reforma seguir o embalo de uma intensa agenda econômica, puxada com maior força pela reforma da Previdência no ano passado.

No último dia 21 de julho, o governo federal, na imagem do ministro da Economia, Paulo Guedes, entregou a proposta do Executivo para a primeira parte da reforma sobre o sistema tributário brasileiro, agora sendo discutida em Comitê Misto no Congresso.

Será que agora estamos diante de uma proposta que, efetivamente, tem chances de ser aprovada para se tornar mais um grande passo rumo ao destravamento da economia brasileira? Confira a análise detalhada produzida pelas equipes do Research e de Política da XP.

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O sistema tributário no Brasil e a importância de reformá-lo

Desde a Constituinte de 1988, todos os presidentes da República tentaram engatar alguma reforma tributária e todos fracassaram, ilustrando como o tema é árido na seara política brasileira. Reflexo de um sistema altamente complexo e difuso, o Brasil figura na posição 184 dentre 190 países analisados pelo Banco Mundial em seu relatório sobre ambiente de negócios no quesito “pagamento de impostos”. Vale notar que o tamanho da carga tributária (hoje em 33% do PIB) não infere no resultado, que é mensurado pelo número de horas desprendidas por empresas pagando impostos.

No Brasil, uma empresa gasta em média o total de 1501 horas por ano mantendo-se “em dia com o fisco”, de acordo com a metodologia aplicada pela instituição, comparado a 256 horas na também emergente Colômbia e 139 na “burocrática” França.

Focando apenas na incidência sobre bens e serviços, os mais de 12 impostos somados a nível federal, estadual e municipal, representam verdadeiros entraves à produtividade e competitividade do setor produtivo brasileiro. Abaixo listamos alguns motivos que fazem da carga tributária nacional um dos principais gargalos da economia do Brasil:

  1.  Má alocação de recursos não somente entre setores mas também entre os entes subnacionais, diante de incentivos muitas vezes distorcidos (como subsídios tributários);
  2.  Alta incidência de litígios e, em certos casos,  inviabilidade financeira do negócio diante do alto custo envolvido no próprio cumprimento da legislação.
  3.  Maior oneração no setor produtivo, tornando o sistema mais regressivo, uma vez que famílias de baixa renda dedicam parcela proporcionalmente maior de seus orçamentos na compra de bens industriais (como produtos alimentícios) enquanto famílias de maior renda consomem mais serviços.

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As propostas em tramitação

Diante desse cenário, três principais projetos propondo mudanças ao atual sistema tributário encontram-se hoje em discussão na Comissão Mista estabelecida no Congresso Nacional. Tendo como objetivo central a simplificação de tributos (por ora, não almejando a mudança de carga tributária), as propostas encontram-se na sugestão de implementação de um Imposto de Valor Agregado (IVA) de alíquota única, a incidir sobre a totalidade de bens e serviços. O pontapé inicial dado pelo governo federal há uma semana não define um período de transição e seriam substituídos, portanto, os tributos PIS e Cofins a nível federal (conforme proposto pelo Executivo no último dia 21 e chamado de CBS), ou de maneira mais abrangente, também ICMS e ISS a nível estadual e municipal, conforme proposto pelas PEC 45 e PEC 110 originárias da Câmara dos Deputados e do Senado, respectivamente.

No cenário político, há um ambiente favorável para a discussão, que se vale principalmente do empenho de Rodrigo Maia, atual presidente da Câmara, para que as discussões avancem — mas há também muitos nós a desatar. O primeiro deles diz respeito ao escopo da discussão da reforma no Congresso, já que o governo pretende enviar novas etapas da proposta no mês de agosto, que alcançariam também a tributação sobre renda (hoje não coberta por nenhuma das propostas na mesa) e a criação de uma contribuição sobre transações, que pudesse compensar a desoneração da folha de pagamentos. Ainda não há clareza no Congresso se os temas seriam tratados dentro da mesma discussão ou de maneira separada.

Ao se tratar da reformas por partes, resistências setoriais tornam-se mais evidentes — como a do setor de serviços, que defende a desoneração da folha como maneira de compensar a relativa elevação da alíquota a que fica submetido com a implementação do IVA. Com a discussão do pacote completo, no entanto, somam-se às primeiras resistências por parte de grupos políticos sobre as mudanças na tributação de renda, por exemplo.

Por fim, há de se considerar também que a discussão da reforma acontece no Congresso em um momento em que deputados e senadores estão altamente influenciados pela discussão sobre a sucessão para as presidências da Câmara e do Senado, em fevereiro de 2021, o que pode ter consequências no dia a dia das discussões.

O relator do tema, deputado Aguinaldo Ribeiro, pretende apresentar seu parecer até o final do mês de setembro. Depois disso, a proposta ainda precisa ser apreciada pela comissão especial da Câmara e pelo plenário da Casa, para aí sim seguir ao Senado Federal.

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Potenciais impactos setoriais

Os potenciais impactos de uma reforma tributária seriam certamente diferentes entre os setores da economia, a depender também da natureza do regime finalmente aprovado pelo Congresso e Executivo.

Setor Financeiro

No setor Financeiro, o impacto ainda foi reduzido, mas esperamos maiores mudanças. Com base na primeira proposta do Executivo, foi proposto um aumento de 1,15 ponto percentual para 5,8% no novo imposto de valor agregado (CBS), comparado com a alíquota hoje cobrada pelo PIS/COFINS. Como essa alíquota é deduzida da receita líquida e não do lucro, o impacto que ela traz possui alavancagem operacional e, de acordo com nossas estimativas, pode afetar o lucro de instituições financeiras em 3% em 2021.

Porém vale ressaltar que mudanças que teriam maior impacto podem ainda estar por vir e devem ser analisadas conforme tivermos maior visibilidade, sendo elas:

  • Tributação de dividendos, uma vez que boa parte do mercado avalia os bancos pelos seus descontos;
  • Eliminação do benefício tributário do JCP, o que representa um benefício fiscal importante para bancos;
  • Tributação sobre transações eletrônicas, o que representa receita de serviços  para bancos.

Transporte e Shoppings

Dentro do setor de Shoppings e Propriedades comerciais, estimamos um impacto inicial moderado com a unificação do PIS e do COFINS em um único imposto, e a magnitude do impacto dependerá do percentual do pagamento de impostos que é feito por meio do regime não cumulativo ou cumulativo. Hoje, as companhias operam com um mix híbrido entre regime de lucro real e presumido. Esperamos um impacto inicialmente maior para companhias que operam majoritariamente sob o regime cumulativo (alíquota de 3,65%).

No caso do setor Aéreo, uma parte maior das receitas está sob o regime cumulativo (alíquota de 3,65%), e, portanto, o impacto da unificação dos impostos poderia ser maior em um primeiro momento. Algumas linhas, como receitas de carga e internacionais, por exemplo, estão sob o regime não cumulativo no caso da Azul. Entretanto, essas linhas são menos representativas na receita total.

No caso das locadoras de veículos, uma parte maior do recolhimento do imposto é feito por meio do regime não cumulativo (alíquota de 9,25%), e, portanto, as companhias possuem direito a créditos tributários. Apesar de o aumento inicial da alíquota impactar negativamente (mas em magnitude relativamente menor), a grande questão para metrificar o impacto será o tratamento desses créditos tributários para frente. Por outro lado, outras potenciais mudanças como desoneração da folha e outras isenções (como imposto sobre despesas financeiras) poderiam compensar em algum nível esse impacto negativo do aumento de imposto.

Incorporadoras

Também com base na primeira proposta de reforma tributária enviada pelo Executivo, avaliamos que o impacto para as incorporadoras é bastante limitado, porém futuras mudanças, como a tributação de dividendos, devem proporcionar maior impacto no setor.

Por ora, as incorporadoras focadas no segmento de média e alta renda submetidas ao regime especial de tributação (RET) ficariam sujeitas ao pagamento equivalente a 4,12% da receita mensal recebida contra 4,0% da alíquota atual, o que representa um ligeiro aumento de 0,12 pontos percentuais. Enquanto isso, para as incorporadas focadas em imóveis residenciais de interesse social, a alíquota atual seguiria sem alterações.

Alimentos & Bebidas

Tendo novamente como base a proposta enviada pelo Executivo, não haveria grandes mudanças na dinâmica de mercado para empresas como JBS, Marfrig e BRF. Conforme informações levantadas com as principais empresas do setor, a possibilidade de reajuste da alíquota do PIS/COFINS não impactaria significativamente os preços de alimentos ao consumidor – especificamente, os preços das carnes bovina, suína e de frango. Já as exportações devem seguir isentas. 

Um ponto em que ainda não há clareza refere-se ao acúmulo de créditos. A indústria de frigoríficos funciona como elo intermediário da cadeia, recolhendo o PIS/COFINS do produtor rural, a ser repassado em nome do consumidor final. Como a maior parte dos produtos finais dos frigoríficos se enquadra dentro da cesta básica, não há cobrança de PIS/COFINS. Deste modo, as empresas acumulam créditos, que podem ser monetizados ou deduzidos de outros impostos. Uma eventual mudança no modelo de tributação da cesta básica, seja ela isenta ou com alíquota zero, poderia abrir outros caminhos para as indústrias, mas tal possibilidade ainda segue em fase de estudos.

Finalmente, a possibilidade de unificar o ICMS entre os estados, como proposto na PEC 45, poderia impactar a dinâmica de origem da matéria-prima e deveria favorecer indústrias menos verticalizadas e com maior abrangência geográfica.

Siderurgia & Mineração e Papel & Celulose

Sobre os setores de Siderurgia & Mineração e Papel & Celulose, agentes do setor relatam que o nível de detalhamento conhecido até então não permitem uma análise de impactos mais acurada. Na nossa visão, os impactos oriundos da proposta do Executivo parecem limitados, principalmente por se tratar de uma simplificação dos impostos – sem, aparentemente, reduzir a autonomia dos estados e municípios. Outras propostas nesse sentido poderiam impactar o setor e requereriam análise posterior.

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Expectativa sobre uma reforma ampla

Como discutido, a eventual aprovação de uma reforma tributária poderá gerar ganhos permanentes de bem-estar social para o Brasil. Entretanto, o tema muitas vezes foi desconsiderado por governantes por apresentar resultados mais concretos apenas em um horizonte de mais longo prazo – além do período eleitoral.

Não obstante, o atual nível de saturação tributária brasileira é tão grande, que no curto prazo o mero debate já impacta positivamente as expectativas. Um exemplo disso pode ser visto na perspectiva de investimentos no país. Maior previsibilidade e certeza jurídica e regulatória, menor complexidade para cumprir as obrigações e redução de ineficiências entre setores e entes da federação já tornam o país relativamente mais atrativo para se investir – seja para investidores domésticos ou estrangeiros.

Finalmente, vale ressaltar que ainda temos um longo caminho para percorrer até que vislumbremos um novo sistema tributário no país. Até então, por exemplo, nenhuma proposta em discussão aborda de maneira ampla regras sobre o Simples Nacional e a Zona Franca de Manaus, ou a retirada de regimes tributários especiais (estados). Também não são tratadas a oneração da cesta básica e a tributação sobre entidades filantrópicas ou o IOF – imposto que pode representar um entrave para a aprovação do Brasil nos Códigos de Liberalização de Capitais da OCDE.

Os próximos passos de como será a tramitação da reforma no Congresso deverão ser conhecidos nas próximas semanas. À medida que ficarem mais claras as alterações e quando elas serão implementadas, as mensurações dos impactos na economia e sobre os seus diversos setores será mais assertiva.

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