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Como andam nossos vizinhos: Preparando para um 2023 desafiador

O caminho da desinflação está traçado, porém as economias da América Latina devem enfraquecer em meio à desaceleração global e condições financeiras apertadas.

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Destaques

  • O processo de desinflação global está mais claro. Condições financeiras apertadas devem levar alguns países do G7 a uma recessão em 2023;
  • Na América Latina, o desempenho econômico superou as expectativas em 2022, mas 2023 será um ano mais duro em meio ao cenário doméstico e externo ainda incerto, e política monetária em campo consideravelmente contracionista;
  • O processo de desinflação deve ser lento na América Latina, e a inflação deve continuar acima da meta dos bancos centrais ao longo do próximo ano, convergindo apenas em 2024;
  • Os ativos financeiros da América Latina continuam descontados refletindo alto prêmio de risco. Incertezas persistentes no ambiente doméstico e externo limitam espaço para valorização

Pano de fundo – Preparando para um 2023 desafiador

O processo desinflacionário deve ganhar tração em 2023. As pressões inflacionárias globais devem arrefecer significativamente no próximo ano devido à acomodação dos preços das commodities, política monetária contracionista e normalização das cadeias de suprimentos. A atividade econômica deve enfraquecer consideravelmente, e alguns países do G7 podem entrar em recessão.

Os preços das commodities devem apresentar estabilização, porém em patamares elevados. Após aumento expressivo ao longo dos últimos dois anos, os preços das commodities diminuíram recentemente, refletindo melhorias nos gargalos de oferta e demanda mais fraca. Prevemos que o preço do petróleo do tipo Brent encerrará 2022 em torno de US$ 90 por barril. Os preços dos metais podem cair ainda mais, refletindo o enfraquecimento da economia global, embora a reabertura da economia da China possa gerar alguma sustentação. Já as cotações das commodities agrícolas devem permanecer elevadas, impulsionadas pela demanda inelástica e condições climáticas que afetam o lado da oferta.

Acreditamos que os EUA irão enfrentar uma leve recessão em 2023. Com a inflação não tão “transitória” quanto o esperado, o Federal Reserve (Fed) foi forçado a aumentar as taxas de juros de forma agressiva neste ano em comparação à condução histórica de sua política monetária. Com os juros em patamar consideravelmente contracionista (atualmente em 4,5%), o banco central se aproxima da taxa terminal, e os últimos ajustes vão depender da evolução dos dados de inflação, mercado de trabalho e atividade econômica.

O mercado de trabalho continua apertado e a inflação permanece significativamente acima da meta de 2%, embora tenha começado a diminuir recentemente. Os principais indicadores de alta frequência sugerem que a economia dos EUA está desacelerando, especialmente o mercado imobiliário. Se os próximos dados se mostrarem benignos, acreditamos que o Fed pode encontrar espaço para interromper o ciclo de aperto mais cedo do que o mercado atualmente projeta. Caso contrário, é provável a implementação de aumentos de 0,25pp no próximo ano, até que os dados comecem a “colaborar”. De qualquer forma, as condições financeiras já se encontram em território amplamente contracionista, o que deve levar a economia americana a uma recessão moderada.

Acreditamos que 2023 será mais um ano desafiador para as economias europeias. A melhora recente nos gargalos das cadeias globais de produção e o início de um inverno menos frio na Europa ajudaram a reduzir o consumo de energia e encher os tanques de armazenamento de gás. No entanto, a incerteza permanece alta em meio a tensões geopolíticas persistentes na Ucrânia, e as condições podem se deteriorar novamente no próximo ano. Além disso, as taxas de juros devem aumentar ainda mais após o posicionamento duro do BCE em sua reunião de dezembro. Apesar da inflação geral aparentemente ter atingido o pico, a medida de núcleo ainda deve permanecer em alta nos próximos meses, já que provavelmente haverá repasses adicionais da elevação dos preços de energia para os preços ao consumidor. Neste cenário, prevemos uma recessão mais profunda na Europa em 2023.

Na China, as atenções estão voltadas para as políticas de zero-Covid. A persistência de medidas rígidas de lockdown e os problemas no mercado imobiliário afetaram de forma considerável o crescimento econômico da China em 2022. Estimamos que o PIB crescerá 3,3% este ano, muito abaixo da meta de 5,5% estabelecida pelo governo. Dado que os baixos níveis de inflação na China permitiram políticas monetárias e fiscais expansionistas, acreditamos que a atividade local poderá crescer acima de 5% em 2023, suavizando a desaceleração da economia global. No entanto, as perspectivas permanecerão reféns da política de tolerância zero à Covid-19. O aumento das tensões sociais e o avanço da vacinação de idosos devem reforçar a reabertura da economia, embora a recente elevação de novos casos de coronavírus possa atrasar tal dinâmica.

Na América Latina, o desempenho econômico em 2022 superou as expectativas, mas 2023 será um ano mais duro. No lado da atividade, a alta dos preços das commodities e a demanda reprimida durante a pandemia beneficiaram as economias. Desta forma, a desaceleração da atividade econômica neste ano foi mais suave do que havíamos previsto, em parte devido ao choque positivo nos termos de troca que foi ampliado pelo conflito geopolítico na Ucrânia, o qual impulsionou as contas fiscais e externas. No entanto, esse impacto positivo tem diminuído e continuará nesta trajetória ao longo de 2023 em meio a políticas monetárias muito restritivas e dívida pública crescente. Desta forma, projetamos que 2023 será um ano de crescimento fraco para as economias da região, e alguns países (como é o caso do Chile) devem entrar em recessão.

O processo de desinflação deve ser lento na América Latina. A inflação nos principais países da região parece ter alcançado ou estar próxima do pico, e o processo de desinflação deve ganhar maior tração em 2023. No entanto, as variações mensais continuam rodando consideravelmente acima da tendência histórica, refletindo pressões contínuas oriundas dos preços elevados das commodities, gargalos remanescentes nas cadeias de produção e demanda agregada ainda resiliente. A elevação dos preços de alimentos e energia continua a contribuir significativamente para a alta da inflação, enquanto as pressões têm se espalhado para outros setores da economia. A inflação de bens deve começar a ceder antes, enquanto a inflação de serviços, que continua abaixo da média do índice geral, deve continuar pressionada por mais tempo. O processo de desinflação deve ganhar maior tração nos próximos meses com o reequilíbrio da oferta e da demanda, e devido a um efeito base favorável. No entanto, a inflação deve continuar acima da meta dos bancos centrais ao longo do próximo ano, convergindo apenas em 2024.

Em relação a política monetária, a dúvida reside em quando as autoridades encontrarão espaço para corte de juros. Apesar de alguns bancos centrais já terem sinalizado uma pausa na alta de juros (como é o caso de Brasil e Chile) e outros estarem próximos da taxa terminal (Colômbia e México), a perspectiva de cortes seguirá refém das incertezas domésticas e externas, que podem influenciar a trajetória das expectativas de inflação. Além do quadro de enfraquecimento da economia global em 2023, os países também enfrentam desafios políticos com novos governos no Chile, Colômbia e Brasil tentando implementar mudanças significativas, enquanto a Argentina terá a próxima corrida eleitoral no ano que vem.

A persistência da inflação, efeitos de segunda ordem, indexação de preços e repasse cambial representam um desafio significativo para os bancos centrais atingirem suas metas de inflação no curto prazo. Assim, esperamos que a política monetária permaneça rígida durante a maior parte de 2023, particularmente no primeiro semestre do ano, quando as taxas de juros real devem subir. Os bancos centrais devem encontrar espaço para cortar os juros na segunda metade de 2023 quando (e se) houver evidências mais claras de que a atividade econômica está enfraquecendo, a inflação está em trajetória de convergência para a meta, e as expectativas de inflação estão controladas. No entanto, pode-se esperar heterogeneidade entre países, e alguns bancos centrais (como os do Brasil e México) devem encontrar espaço para cortes apenas no final de 2023 ou em 2024.

A combinação de política monetária apertada e espaço limitado para estímulo fiscal devem ter um impacto positivo no câmbio e ativos locais. Projetamos que as taxas de câmbio latino-americanas ainda passem por alguns episódios de fraqueza e volatilidade elevada no início de 2023, à medida que as economias dos EUA e da Europa entram em recessão. No entanto, as moedas latino-americanas devem mostrar tendência de valorização no decorrer de 2023 devido a (1) avaliações baratas contra o dólar americano; (2) melhora das contas externas, impulsionada por uma significativa desaceleração da demanda doméstica, especialmente no Chile e na Colômbia; (3) redução dos prêmios de risco, uma vez que esperamos que os bancos centrais das economias desenvolvidas encerrem seus ciclos de aperto monetário até o final do primeiro trimestre de 2023 e que os mercados precifiquem ciclos de flexibilização até 2024; e (4) preços de commodities ainda elevados, favorecendo as economias da região.

No entanto, acreditamos que os prêmios de risco político permanecerão excepcionalmente altos em comparação com os níveis pré-pandêmicos, impedindo que as moedas encontrem um equilíbrio mais favorável adiante. Ainda assim, estamos particularmente otimistas com o peso chileno, pois acreditamos que os desequilíbrios das contas externas do Chile diminuirão no próximo ano apesar da persistente incerteza política relacionada ao futuro do novo processo constitucional. Também vemos algum espaço para valorização do peso colombiano, impulsionado por ajustes nas contas externas e fiscais da Colômbia. No entanto, continuamos cautelosos, e acreditamos que o espaço para valorização é limitado já que as incertezas em relação ao governo Petro e o futuro dos setores de energia e mineração continuam elevadas, assim como as perspectivas da dinâmica fiscal e do balanço de pagamentos no médio prazo.

México – Desinflação (lenta) em meio a desaceleração econômica

A atividade econômica no México voltou ao nível pré-pandêmico, mas deve desacelerar em 2023. O desempenho econômico surpreendeu positivamente esse ano, e acreditamos que o PIB do México deva crescer 3,1% em 2022 (acima das nossas expectativas de 2,5% no início do ano). A performance melhor do que o esperado pode ser explicada por (1) aceleração do setor de serviços; (2) consumo doméstico mais forte, impulsionado por remessas recordes advindas do exterior e recuperação do mercado de trabalho com aumentos salariais significativos; e (3) crescimento das exportações e do setor manufatureiro, na esteira da redução dos gargalos nas cadeias de suprimentos durante a segunda metade do ano. No entanto, a atividade econômica deve enfraquecer em 2023 em meio a condições financeiras mais apertadas e a desaceleração da economia global. A recessão projetada nos Estados Unidos, o principal parceiro comercial do México, é particularmente relevante. Além do mais, a alta de inflação deve prejudicar o poder aquisitivo dos consumidores e o investimento privado, que se encontra no nível mais baixo desde 2013, deve continuar sendo um fator limitador para o crescimento do PIB. Em contrapartida, o aumento do salário-mínimo de 20% esperado para o ano que vem deve ajudar a parcialmente mitigar o impacto negativo no lado do consumo privado. Ao todo, antecipamos uma dinâmica de crescimento mais fraca para o México nos próximos trimestres, e projetamos que o PIB cresça 1,3% em 2023.

A alta da inflação segue sendo um desafio para o banco central. As pressões inflacionárias persistem em meio à alta de preços importados, grandes aumentos salariais no setor formal, gargalos nas cadeias de produção, e efeitos de segunda ordem. A dinâmica de preços deve apresentar tendência de desinflação nos próximos meses devido às descompressões no quadro internacional, porém o processo deve ser lento. Projetamos que a inflação encerrará 2022 em 8,1%, caindo gradualmente para 5,3% até o final de 2023, acima da meta do banco central de 3%. Desta forma, o Banxico (banco central do México) deve continuar pressionado para manter a política monetária em patamar contracionista por um tempo prolongado. Conforme observado no passado recente, esperamos que o Banxico coordene a trajetória de sua política monetária com a do Fed, mantando um diferencial de juros em torno de 6pp. Desta forma, projetamos que o Banxico encerrará o ciclo de aperto monetário no primeiro trimestre de 2023, com os juros entre 10,75% e 11%. O Banxico pode encontrar espaço para cortar juros no último trimestre de 2023 a depender da dinâmica da desinflação.

Proejamos o câmbio em MXN/USD 20,50 no final de 2023. O peso mexicano (MXN) está entre as poucas moedas que se valorizaram contra o dólar em 2022. O valor do MXN foi sustentado pelo equilíbrio nas contas externas, estabilidade política em comparação com países vizinhos, equilíbrio do balanço fiscal e níveis recordes de remessas oriundas do exterior. No entanto, com a desaceleração da atividade econômica e a perspectiva de deterioração (embora moderada) das contas públicas e externas, o MXN pode sofrer uma pequena desvalorização no ano que vem.

Acordo de comércio exterior pode pressionar os ativos mexicanos. O maior risco para os ativos mexicanos é a tensão com os países dentro do bloco de livre comércio (USMCA). Desde agosto, os EUA e o Canadá solicitaram consultas das políticas energéticas do México, argumentando que elas são inconsistentes com as regras do USMCA. O pedido de consulta abrange quatro tópicos: (1) a Lei do Setor Elétrico; (2) inação, atrasos, negações e revogações de permissão das empresas privadas para operar no setor energético do México; (3) adiamento da exigência de fornecimento de diesel de ultrabaixo teor para a empresa Pemex apenas; e (4) ações relativas ao uso do serviço de transporte de gás natural do México. As partes devem chegar a um acordo em 2023, porém, quanto mais as conversas se prolongarem, piores podem ser os impactos para os investimentos estrangeiros e ativos financeiros. No cenário mais pessimista, o custo para o México de não chegar em um acordo com os seus principais parceiros comerciais seria enorme.

Chile – Atividade contrai enquanto incertezas políticas persistem

O Chile deve entrar em recessão em 2023. A economia estava operando acima do nível potencial desde meados de 2021, impulsionada pelo enorme pacote fiscal, com transferências diretas das famílias chegando a quase 15% do PIB em 2020-2021, além de três rodadas de resgates do fundo de pensão desde agosto de 2020, no valor de cerca de 20% do PIB entre 2020 e 2021. Com isso, o PIB do Chile deve crescer 2,2% em 2022. No entanto, a economia deve entrar em recessão no ano que vem em meio à redução significativa dos estímulos monetários, alta da inflação deteriorando o poder aquisitivo dos consumidores e enfraquecimento do mercado de trabalho. Nesse sentido, a atividade econômica mostra sinais de contração desde meados de 2022. Desta forma, projetamos queda de 1,0% no PIB em 2023.

A inflação no Chile esteve entre as mais altas da região em 2022, mas começa a mostrar sinais de descompressão. A alta da inflação deste ano foi exacerbada pela economia superaquecida, além dos impactos vindos da guerra na Ucrânia. No entanto, a inflação já estava em tendência de alta por consequência da depreciação cambial, custo elevado de insumos importados, gargalos nas cadeias de suprimentos e pressões do lado da demanda. Acreditamos que o índice IPC deve encerrar o ano com aumento de 13%. Com a economia entrando em recessão, acreditamos que o processo de desinflação ganhará tração ao longo de 2023. Apesar das pressões inflacionárias ainda serem amplas, os dados mais recentes mostram sinais claros de moderação. No entanto, o processo de desinflação deve ser lento, devido aos efeitos da inércia e indexação relativamente alta. Um estudo feito pelo banco central da China (BCCh) estima que em torno de 31,7% do índice IPC é composto por produtos administrados e/ou com influência de indexação. Acreditamos que estes fatores devem impedir que a inflação ceda para a meta de 3,6% estabelecida para o ano que vem. Portanto, projetamos que a inflação encerre 2023 em 5,6%.

Em termos de política monetária, o Chile deve ser o primeiro entre os principais países da região a cortar juros. O BCCh reiterou recentemente que seu processo de aperto monetário terminou, mas sinalizou que não terá pressa em iniciar o ciclo de flexibilização. Mais especificamente, a avaliação dos membros do comitê de política monetária de que os desequilíbrios macroeconômicos persistentes (inflação alta e déficit em conta corrente por volta de 10% PIB) ainda levarão um tempo para serem eliminados, deve manter os juros no nível atual (11,25%) por mais alguns meses. De todo modo, projetamos que o BCCh comece a reduzir a taxa de juros no segundo trimestre de 2023, encerrando o ano em 7%.

Projetamos a taxa de câmbio em CLP/USD 875 no final de 2022 e uma valorização para CLP/USD 805 até o final de 2023. O CLP iniciou o ano mostrando forte valorização, impulsionado pela alta nos preços das commodities e diferencial de juros elevado. No entanto, o CLP sofreu forte desvalorização no meio do ano devido à combinação entre (1) queda nos preços do cobre, (2) aumento das incertezas políticas e (3) deterioração das contas externas. A intervenção cambial do BCCh ajudou o CLP a recuperar apenas parte do valor perdido. Para 2023, vemos espaço para apreciação do câmbio, impulsionada principalmente por uma melhora nas contas externas. Acreditamos que, com a queda agressiva no nível do consumo privado projetado para os próximos meses, o déficit em conta corrente deve diminuir de 8,6% em 2022 para 4,0% em 2023. Por outro lado, os riscos políticos devem continuar elevados, o que pode manter os ativos domésticos em níveis descontados.

O próximo ano será dominado por uma forte reforma e agenda política, que será fundamental para o destino da economia, não apenas em 2023, mas nos próximos anos. Primeiro, o governo Boric introduziu seus planos de reforma tributária e royalties de mineração, pretendendo aumentar gradualmente a arrecadação líquida de impostos até atingir 3,6% do PIB por ano a partir de 2026. No entanto, o governo enfrenta dificuldades para passar esta proposta no Congresso, e provavelmente terá que reduzir o impacto da proposta para 3,2% do PIB. Segundo, o governo apresentou seu plano para a reforma da previdência, que dificilmente será aprovada em sua atual forma, forçando alterações. Por último, após rejeição no referendo realizado em setembro, o processo para eleger uma nova Constituição terá que continuar no início de 2023, e o resultado pode exercer forte influência na implementação de políticas públicas no futuro.

Colômbia – Novas políticas públicas podem alterar a dinâmica do balanço fiscal

Apesar da forte recuperação nos últimos dois anos, a economia da Colômbia deve desacelerar em 2023. Após a contração de 6,8% no ano da pandemia, o PIB da Colômbia expandiu 10,6% em 2021 e deve apresentar crescimento de 8% em 2022. O desempenho superior da economia colombiana foi explicado principalmente por (1) alto estímulo fiscal; (2) um processo de normalização da política monetária defasado em relação aos pares regionais; e (3) choque positivo nos termos de troca – exacerbado pelo conflito na Ucrânia, que foi maior do que na maioria das outras economias emergentes. Além do mais, conforme detalhamos no nosso último relatório, o nível do consumo privado está acima da tendência de crescimento de longo prazo. No entanto, a dinâmica de crescimento deve enfraquecer em 2023 em meio a condições financeiras mais apertadas e queda dos índices de confiança dos consumidores e empresários. Ademais, acreditamos que o investimento deve estagnar em 2023 em meio a condições de crédito mais caras e incertezas geradas pelas reformas e agenda ambiciosa de gastos do recém-eleito presidente Gustavo Petro.

A inflação deve chegar ao pico até o final do ano, e reverter para um processo gradual de desinflação. Projetamos que a inflação encerrará o ano em 12,7%, permanecendo acima dos 10% ao longo do primeiro semestre de 2023. A persistente alta da inflação provocou aumento de 16% do salário-mínimo, o que deve prolongar as pressões sobre preços. Outros fatores que devem provocar pressões adicionais no próximo semestre incluem (1) a desvalorização do câmbio, (2) a decisão do governo de permitir aumentos graduais nos preços de combustíveis para controlar o déficit acumulado no Fundo de Estabilização de Preços dos Combustíveis, e (3) o fim de benefícios tributários que foram implementados durante a pandemia. Desta forma, projetamos que o processo de descompressão de preços ganhe tração apenas no segundo trimestre de 2023, culminando em inflação de 7,5% no ano.

Os ativos financeiros continuam descontados, precificando alto prêmio de risco político. Os nossos modelos sugerem que o peso colombiano (COP) continua desvalorizado, abrindo espaço para apreciação no ano que vem. No entanto, esta valorização depende de uma melhora nas contas públicas e externas. Nós projetamos que o déficit em conta corrente recuará de 6,1% em 2022 para 4,8% em 2023, enquanto o déficit fiscal deve cair de 5,1% em 2022 para 4% em 2023. A avaliação barata do COP também pode ser explicada pela incerteza sobre a abordagem do presidente Petro de desincentivos para o futuro dos setores de energia e mineração, bem como preocupações sobre a dinâmica fiscal e balanço de pagamentos no médio prazo.

Por exemplo, a reforma tributária apresentada pelo governo, que foi aprovada no Congresso, visa aumentar a arrecadação em 1,4% para sustentar novos gastos, porém o governo não apresentou ao Congresso a parcela do acréscimo orçamentário que será utilizado para aumentar os gastos públicos e para reduzir o déficit fiscal.

Ademais, a atual proposta para de reforma da previdência é risco para a economia da Colômbia. Na proposta atual, 90% das contribuições dos trabalhadores aplicadas na previdência privada (cerca de 1,3% do PIB por ano) seriam realocados para gastos públicos correntes. Em nossa opinião, essa situação seria prejudicial para a estabilidade macroeconômica e fiscal da Colômbia e poderia exercer pressão adicional sobre o câmbio e outros ativos financeiros. No entanto, muitos detalhes ainda estão pendentes, e o projeto de lei só deve ser apresentado em abril.

Argentina – Preparando para corrida eleitoral em meio a desequilíbrios econômicos

A dinâmica inflacionária na Argentina, que já era complicada, piorou ainda mais ao longo de 2022. Após registrar alta de 50,9% em 2021, a inflação deve encerrar 2022 em 92,8%, a mais alta entre os principais países da região. A alta expressiva nos preços aos consumidores reflete o persistente desequilíbrio macroeconômico na Argentina, que foi agravado pelos choques externos. Em resposta à alta da inflação, o banco central da Argentina subiu os juros consideravelmente, (estabilizando em 75%) mas as taxas reais permanecem em campo negativo. Neste contexto, vemos espaço limitado para melhora no ano que vem, e projetamos que a inflação encerrará 2023 em 62%.

No lado positivo, além do título na Copa do Mundo, a atividade econômica na Argentina veio acima do esperado. Apesar dos desafios econômicos, a Argentina estará entre as economias da região que mais cresceram neste ano. Projetamos expansão do PIB de 6,0% em 2022. Acreditamos que o fato de o governo da Argentina ter conseguido chegar em um acordo com o FMI para renegociar sua dívida ajudou a sustentar o desempenho econômico neste ano. No entanto, a Argentina continua a enfrentar desafios para cumprir com os requisitos estipulados no acordo com o FMI, o que pode ser um obstáculo para novos investimentos e crescimento da economia nos próximos anos. Ademais, apesar do forte crescimento das exportações neste ano, que devem registrar a máxima histórica, a arrecadação tributária ficou estável, o que, na nossa visão, destaca os desafios que o governo e a economia estão enfrentando.

As eleições presidenciais estarão no centro das atenções em 2023. A corrida eleitoral será cercada pelas consequências da condenação da ex-presidente e atual vice-presidente, Cristina Fernandez de Kirchner, a seis anos de prisão pelo desvio de recursos públicos. Após a condenação, Kirchner anunciou que não disputará nenhum cargo político em 2023. Esta mudança foi importante, uma vez que a expectativa era que ela pudesse ser uma das principais candidatas à Presidência da República. A eleição deve favorecer os partidos de oposição do governo atual, uma vez que sua popularidade caiu muito devido à persistente alta da inflação e aos problemas com a segurança pública. Os nomes que surgiram para possíveis candidatos de oposição incluem o literato Javier Milei, o ex-presidente Mauricio Macri, o prefeito de Buenos Aires, Horacio Rodríguez Larreta, e a atual presidente do partido Proposta Republicana, Patricia Bullrich. Quanto aos possíveis candidatos de dentro da coalizão do atual governo, o presidente Alberto Fernández pode decidir se candidatar à reeleição; o atual ministro da Fazenda, Sergio Massa, também é uma possibilidade. O primeiro turno das eleições está marcado para o dia 13 de agosto, e o segundo turno para 22 de outubro.

Brasil – Início turbulento

Para acessar as informações completas sobre os desdobramentos da economia brasileira e as nossas análises, veja o relatório econômico mensal.

Se alguém nos dissesse há um ano que a taxa de juros básica nos EUA ultrapassaria 5%, que haveria uma guerra na Europa, que a taxa Selic chegaria a quase 14% e que a eleição presidencial seria decidida pela margem mais estreita de todos os tempos, certamente diríamos que 2022 seria muito difícil para a economia brasileira e para os preços dos ativos.

Pelo contrário, o PIB cresceu acima do esperado, as pressões inflacionárias começam a diminuir e a taxa de câmbio brasileira foi uma das poucas que se valorizaram frente ao dólar no acumulado do ano.

O que é necessário para manter esta tendência relativamente favorável em 2023?

Do ponto de vista global, o Brasil provavelmente continuará sendo destaque. Está longe das tensões geopolíticas, se beneficia dos altos preços das commodities e da reabertura da China, e é uma das economias “mais verdes” do mundo. O presidente eleito Lula tem sido bem recebido pela maioria dos líderes internacionais.

Riscos externos certamente existem, como apontamos na seção global deste relatório. Mas o Brasil parece bem posicionado para eles.

No âmbito doméstico, o investimento como percentual do PIB atingiu o maior nível em 7 anos, sugerindo um crescimento potencial mais forte à frente (estimamos cerca de 2% ao ano). A inflação está gradualmente recuando, graças ao bom trabalho do Banco Central e à desinflação global de custos. Esse cenário, entretanto, depende fundamentalmente da estabilidade fiscal. Aqui reside o principal risco do país adiante.

Apesar da melhoria recente, a relação dívida/PIB permanece em níveis elevados e as pressões sobre os gastos estão aumentando. Os membros do novo governo têm repetido que o teto constitucional de gastos não é mais desejável. Mas não apresentam uma alternativa. A nosso ver, sem uma regra clara e crível para os gastos, a dívida pública não se estabilizará no futuro previsível, pressionando a confiança dos empresários e as expectativas de inflação.

De fato, nos anos anteriores ao teto de gastos, a inflação estava acima de 6% e a taxa Selic variava entre 12% e 14%. Desta vez, com um Banco Central independente que persegue uma meta de inflação de 3%, a taxa de juros pode ser ainda maior, gerando um feedback negativo sobre a dinâmica da dívida.

Mas é cedo para dizer qual a política fiscal do terceiro mandato de Lula. No momento em que escrevemos este relatório, as diretrizes da nova política econômica ainda não haviam sido anunciadas. Além do fiscal, outros temas como a reforma tributária, o modelo das parcerias público-privadas, o papel do BNDES e da Petrobras também serão fundamentais para o desempenho econômico brasileiro em 2023 e nos anos seguintes. Parece ser um cenário de boas oportunidades para o Brasil, mas que não virá sem esforços na direção de uma política econômica saudável.

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