Resumo
•O processo de desinflação global está mais claro. Condições financeiras apertadas devem levar alguns países do G7 a uma recessão em 2023;
•No Brasil, a economia segue em recuperação, porém em ritmo menor. Projetamos crescimento do PIB de 3% em 2022, 1% em 2023 e 0,8% em 2024;
•A inflação corrente tem vindo melhor do que o esperado. Prevemos o IPCA de 2022 em 5,8%, e ajustamos marginalmente o IPCA de 2023 de 5,2% para 5,4%. A política fiscal expansionista é um risco para o médio prazo. Projetamos 4% para o IPCA de 2024, acima da meta (3,0%);
•Estimamos que o setor público voltará ao território negativo em 2023 e 2024, devido às sinalizações do governo eleito de expansão de gastos substancialmente acima do teto constitucional;
•Com riscos fiscais crescentes, ajustamos a projeção para a taxa de câmbio no final de 2022, de R$/US$ 5,00 para R$/US$ 5,25. Por ora, mantemos R$/US$ 5,30 para o final de 2023. O balanço de pagamentos segue com dinâmica favorável, mesmo diante das incertezas globais e internas;
•A política fiscal mais expansionista posterga o espaço para cortes de juros. Prevemos agora que a taxa Selic permanecerá em 13,75% até o final de 2023 (10,00% antes), e que recuará gradualmente apenas em 2024. No entanto, se o regime fiscal de fato mudar, os juros nominais podem ficar mais altos por mais tempo. Neste caso, o Copom pode inclusive retomar o ciclo de alta de juros em 2023.
Editorial – Economia brasileira em 2023
Se alguém nos dissesse há um ano que a taxa de juros básica nos EUA ultrapassaria 5%, que haveria uma guerra na Europa, que a taxa Selic chegaria a quase 14% e que a eleição presidencial seria decidida pela margem mais estreita de todos os tempos, certamente diríamos que 2022 seria muito difícil para a economia brasileira e para os preços dos ativos.
Pelo contrário, o PIB cresceu acima do esperado, as pressões inflacionárias começam a diminuir e a taxa de câmbio brasileira foi uma das poucas que se valorizaram frente ao dólar no acumulado do ano.
O que é necessário para manter esta tendência relativamente favorável em 2023?
Do ponto de vista global, o Brasil provavelmente continuará sendo destaque. Está longe das tensões geopolíticas, se beneficia dos altos preços das commodities e da reabertura da China, e é uma das economias “mais verdes” do mundo. O presidente eleito Lula tem sido bem recebido pela maioria dos líderes internacionais.
Riscos externos certamente existem, como apontamos na seção global deste relatório. Mas o Brasil parece bem posicionado para eles.
No âmbito doméstico, o investimento como percentual do PIB atingiu o maior nível em 7 anos, sugerindo um crescimento potencial mais forte à frente (estimamos cerca de 2% ao ano). A inflação está gradualmente recuando, graças ao bom trabalho do Banco Central e à desinflação global de custos. Esse cenário, entretanto, depende fundamentalmente da estabilidade fiscal. Aqui reside o principal risco do país adiante.
Apesar da melhoria recente, a relação dívida/PIB permanece em níveis elevados e as pressões sobre os gastos estão aumentando. Os membros do novo governo têm repetido que o teto constitucional de gastos não é mais desejável. Mas não apresentam uma alternativa. A nosso ver, sem uma regra clara e crível para os gastos, a dívida pública não se estabilizará no futuro previsível, pressionando a confiança dos empresários e as expectativas de inflação.
De fato, nos anos anteriores ao teto de gastos, a inflação estava acima de 6% e a taxa Selic variava entre 12% e 14%. Desta vez, com um Banco Central independente que persegue uma meta de inflação de 3%, a taxa de juros pode ser ainda maior, gerando um feedback negativo sobre a dinâmica da dívida.
Mas é cedo para dizer qual a política fiscal do terceiro mandato de Lula. No momento em que escrevemos este relatório, a nova equipe econômica ainda não havia sido anunciada, muito menos as diretrizes da política econômica. Além do fiscal, outros temas como a reforma tributária, o modelo das parcerias público-privadas, o papel do BNDES e da Petrobras também serão fundamentais para o desempenho econômico brasileiro em 2023 e nos anos seguintes.
Parece ser um cenário de boas oportunidades para o Brasil, mas que não virá sem esforços na direção de uma política econômica saudável.
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Pano de fundo global: Política monetária apertada… prepare-se para o impacto
O processo desinflacionário deve ganhar tração em 2023. As pressões inflacionárias globais devem arrefecer significativamente no próximo ano devido à acomodação dos preços das commodities, política monetária contracionista e normalização das cadeias de suprimentos. A atividade econômica deve enfraquecer consideravelmente, e alguns países podem entrar em recessão.
Os preços das commodities devem estabilizar, porém em patamares elevados. Após aumento expressivo ao longo dos últimos dois anos, os preços das commodities diminuíram recentemente, refletindo melhorias nos gargalos de oferta e uma demanda mais fraca. Prevemos que o preço do petróleo do tipo Brent encerrará 2022 em torno de US$ 90 por barril. Os preços dos metais podem cair ainda mais, refletindo o enfraquecimento da economia global, embora a reabertura da economia da China possa gerar alguma sustentação. Já as cotações das commodities agrícolas devem permanecer elevadas, impulsionadas pela demanda inelástica e condições climáticas que afetam o lado da oferta.
Acreditamos que os EUA irão enfrentar uma leve recessão em 2023. Com a inflação não tão “transitória” quanto o esperado, o Federal Reserve (Fed) foi forçado a aumentar as taxas de juros de forma agressiva neste ano em comparação à condução histórica da política monetária. O banco central provavelmente levará sua taxa de juros de referência para 4,5% no final de 2022. O tamanho dos ajustes adicionais no ano que vem dependerá da evolução de dados de inflação, mercado de trabalho e atividade econômica.
O mercado de trabalho continua apertado e a inflação permanece significativamente acima da meta de 2%, embora tenha começado a diminuir recentemente. Os principais indicadores de alta frequência sugerem que a economia dos EUA está desacelerando, especialmente o mercado imobiliário. Se os próximos dados se mostrarem benignos, acreditamos que o Fed pode encontrar espaço para interromper o ciclo de aperto mais cedo do que o mercado atualmente projeta. Caso contrário, é provável a implementação de aumentos de 0,25pp no próximo ano, até que os dados comecem a “colaborar”. De qualquer forma, as condições financeiras já se encontram em território amplamente contracionista, o que deve levar a economia americana a uma recessão moderada.
Acreditamos que 2023 será desafiador para as economias europeias. A melhora recente nos gargalos das cadeias globais de produção e o início de um inverno menos frio na Europa ajudaram a reduzir o consumo de energia e encher os tanques de armazenamento de gás. No entanto, a incerteza permanece alta em meio a tensões geopolíticas persistentes na Ucrânia, e as condições podem se deteriorar novamente no próximo ano. Além disso, as taxas de juros devem aumentar ainda mais, uma vez que as medidas de núcleo da inflação ainda devem permanecer em alta nos próximos meses, já que provavelmente haverá repasses adicionais da alta dos preços de energia para os preços ao consumidor. Neste cenário, prevemos uma recessão mais profunda na Europa em 2023.
Na China, as atenções estão voltadas para as políticas de zero-Covid. A persistência de medidas rígidas de lockdown e os problemas no mercado imobiliário afetaram de forma considerável o crescimento econômico da China em 2022. Estimamos que o PIB crescerá 3,3% este ano, muito abaixo da meta de 5,5% estabelecida pelo governo. Dado que os baixos níveis de inflação na China permitiram políticas monetárias e fiscais expansionistas, acreditamos que a atividade local tem poderá crescer acima de 5% em 2023, parcialmente compensando a desaceleração da economia global. No entanto, as perspectivas permanecerão reféns da política de tolerância zero à Covid-19. O aumento das tensões sociais e o avanço da vacinação de idosos devem reforçar a reabertura da economia, embora a recente elevação de novos casos de coronavírus possa atrasar tal dinâmica.
Os ativos das economias emergentes exibiram forte desempenho relativo em 2022, embora o prêmio de risco permaneça elevado. Apesar do dólar dos EUA ter se valorizado consideravelmente devido à maior aversão global ao risco, as moedas latino-americanas têm apresentado desempenho sólido quando comparadas às de outras grandes economias (ex: Euro, Libra, Yuan). Além disso, a maioria das bolsas latino-americanas superaram o índice S&P-500 em 2022 até agora. No entanto, a aversão global ao risco e as incertezas políticas domésticas continuam gerando alta volatilidade e mantendo os ativos descontados. Prevemos que tais incertezas continuarão em 2023, com os preços dos ativos reféns dos desenvolvimentos locais e internacionais. Ademais, as condições financeiras tendem a permanecer apertadas ao longo do próximo ano, e o crescimento econômico deve desacelerar de forma expressiva.
Brasil: Início turbulento
Atividade Econômica – Sinais de desaceleração cada vez mais nítidos
O PIB do Brasil avançou a um ritmo moderado no 3º trimestre, dentro do esperado, mas revisões na série histórica devem levar a crescimento um pouco mais forte em 2022. Conforme divulgado na última semana pelo IBGE, o PIB total subiu 0,4% no 3º trimestre ante o 2º trimestre deste ano (3,6% ante o 3º trimestre de 2021), mais ou menos em linha com as estimativas. Porém, revisões de alta no desempenho da atividade doméstica nos trimestres anteriores devem culminar em maior expansão do PIB em 2022.
Desta forma, revisamos nossa projeção de crescimento da economia brasileira este ano, de 2,8% para 3,0%.
Isto posto, sinais de arrefecimento da atividade local estão cada vez mais claros. Os dados de emprego continuam em trajetória positiva, mas com perda de velocidade nos últimos meses. A geração líquida de empregos formais (relatório do Caged) desacelerou de forma relevante em outubro, enquanto a população ocupada total medida pela PNAD Contínua ficou virtualmente estável no mesmo mês, com contração das categorias de trabalhadores informais. Em relação ao mercado de crédito, as concessões seguem em níveis altos, todavia com menor ímpeto nas modalidades mais sensíveis ao ciclo econômico. Além disso, endividamento e comprometimento de renda das famílias estão em patamares historicamente elevados, e as taxas de inadimplência exibem aumento (ainda que moderado) na margem.
Diante da política monetária restritiva, indústria e comércio apresentam desempenho modesto. Os últimos resultados de produção industrial e vendas varejistas trouxeram sinais heterogêneos entre as categorias. Aquelas mais sensíveis às condições de crédito (ex: bens de consumo duráveis e bens de capital) estão em tendência de queda. Já as atividades mais sensíveis à renda ainda mostram expansão, com destaque para bens de consumo não duráveis (ex: alimentos, bebidas, produtos farmacêuticos, artigos de higiene pessoal, combustíveis). O aumento da massa de renda disponível às famílias – os salários reais voltaram a crescer com o aperto do mercado de trabalho e o alívio na inflação – e estímulos fiscais de curto prazo sustentam essa dinâmica.
Enquanto isso, o setor de serviços e a agropecuária mantêm protagonismo. Muitas atividades do setor terciário permanecem em elevação, como reflexo da reabertura econômica e normalização do padrão de consumo. Serviços de transporte, informação, comunicação, hospedagem e alimentação fora do domicílio estão em recuperação desde meados do ano passado, e ainda devem contribuir de forma positiva para o PIB total nos próximos meses. Os benefícios da reabertura devem se dissipar gradativamente. Além disso, algumas atividades menos sensíveis à política econômica – sobretudo a agropecuária – tendem a crescer fortemente no próximo ano (projetamos elevação de 8% para o PIB do setor primário).
Com base nos fatores apresentados acima e no enfraquecimento da economia global, mantemos a expectativa de alta de 1,0% para o PIB do Brasil em 2023. Essa previsão considera um ligeiro ganho de 0,1% para o PIB do 4º trimestre em comparação ao 3º trimestre de 2022 (aumento de 2,4% em relação ao 4º trimestre de 2021) e um efeito de carrego estatístico positivo em 0,5pp para o PIB de 2023.
A condução da política fiscal doméstica impacta, direta e indiretamente, a atividade econômica. A expansão das despesas do governo pode representar um impulso de renda no curto prazo, com destaque à manutenção do benefício médio de R$ 600 do programa Bolsa Família (incorporada em nosso cenário base há alguns meses) e à valorização real do salário-mínimo. No entanto, o aperto adicional das condições financeiras decorrente da deterioração das perspectivas fiscais mais do que compensa esse impulso, em nossa avaliação, especialmente a médio prazo. Neste sentido, postergamos o início do ciclo de afrouxamento monetário em nosso cenário base, com a taxa Selic permanecendo em 13,75% até o final de 2023. Isso explica, em grande medida, as perspectivas de baixo dinamismo da atividade doméstica em 2024.
Prevemos aumento de 0,8% para o PIB de 2024. Ou seja, uma taxa de variação consideravelmente inferior às nossas estimativas recentes de crescimento potencial da economia brasileira (próximas a 2% ao ano). Para mais informações, ver o relatório XP Macro Especial: Discussões sobre recuperação cíclica e crescimento econômico estrutural.
Contas Públicas – O risco da transição sem consolidação fiscal
Resultado positivo em 2022... Em outubro, o setor público consolidado atingiu superávit de R$ 27,1 bilhões graças a um resultado de R$ 30,2 bilhões do governo central e de R$ 0,7 bilhão das empresas estatais, parcialmente compensado pelo déficit de R$ 3,9 bilhões dos governos regionais. No acumulado entre janeiro e outubro, o setor público mostra superávit de R$ 157,9 bilhões. Considerando que os últimos meses do ano costumam ter maiores despesas, esperamos que o setor público consolidado encerre 2022 com superávit de R$ 128 bilhões (1,3% do PIB), dos quais R$ 55,2 bilhões (0,6% do PIB) viriam do governo central e R$ 67,5 bilhões (0,7%) dos governos regionais.
… e aumento de gastos em 2023. O governo eleito encaminhou ao Congresso uma proposta de emenda constitucional para retirar do teto de gastos, por um período de 4 anos, as despesas relacionadas ao programa Auxílio-Brasil, entre outras, com impacto próximo a R$ 200 bilhões. Parlamentares indicam a aprovação de um valor menor, mas que ainda assim levaria a um aumento importante de gastos em 2023 (por volta de R$ 150 bilhões).
Consideramos uma expansão de R$ 140 bilhões por dois anos em nosso cenário. A nosso ver, um valor de R$ 100 bilhões seria suficiente para pagar o benefício Auxílio-Brasil de R$ 600/mês, o adicional de R$ 150 para crianças menores de 6 anos e fazer os ajustes necessários em diversos programas que tiveram suas dotações reduzidas no orçamento do próximo ano. No entanto, em linha com o sinalizado pela discussão parlamentar, passamos a adotar uma expansão de R$ 140 bilhões.
Gastos devem subir como proporção do PIB. Para manter a proporção do gasto em relação ao PIB de 2022 (em torno de 18,4%), calculamos que seria necessário um valor adicional de R$ 57 bilhões em relação aos valores constantes no PLOA. Logo, a elevação de R$ 140 bilhões fará com que a despesa suba até 19,2% do PIB, um aumento de 0,8 pp em relação a este ano. Vale ressaltar que as despesas de 2022 já estão pelo menos R$ 41,3 bilhões acima do teto por conta da Emenda Constitucional nº 123/2022, que instituiu e ampliou diversos benefícios.
Neste cenário, estimamos déficit de R$ 106,9 bilhões (1,0% do PIB) em 2023 e de R$ 87,8 bilhões (0,8% do PIB) em 2024 para o governo central. A expansão de gastos e a desaceleração econômica devem levar o governo central ao campo deficitário nos próximos dois anos, revertendo o resultado de 2022. Entretanto, chamamos a atenção que os nossos cálculos incluem a volta dos tributos federais sobre combustíveis. Sem essa receita, o déficit subiria para R$ 161 bilhões (1,5% do PIB) em 2023 e R$ 143 bilhões (1,3% do PIB) em 2024.
Risco também nos entes subnacionais. Os estados vêm demonstrando perdas na arrecadação de ICMS em decorrência da redução das alíquotas de energia elétrica e combustíveis. Como alertamos neste relatório, isso pode levar a uma piora significativa dos resultados primários se medidas de ajuste não forem tomadas. Por ora, consideramos que os entes subnacionais serão capazes de manter um superávit próximo a 0,1% do PIB em 2023 e 2024.
Dívida pública cairá em 2022, mas deve voltar a subir em 2023 e 2024. O superávit primário e o maior crescimento da economia (inclusive as revisões do PIB nominal) explicam a queda da dívida pública neste ano, que deve chegar a 74,8% do PIB em nossa estimativa mais atualizada. Mas a expansão de gastos sem a sinalização de uma consolidação fiscal crível deve fazer com que o Banco Central mantenha as taxas de juros em patamar elevado por um período mais longo. Assim, adotamos a premissa de que a taxa Selic ficará inalterada até o final de 2023, com recuo apenas em 2024 (ver seção de Política Monetária). Com um custo mais elevado, a dívida pública deve subir mais de 8 pp. nos próximos anos.
Sustentabilidade das contas públicas é fundamental para desempenho econômico. O novo governo ainda não sinalizou como financiará a elevação de despesas. A instituição de um arcabouço fiscal que permita retornar a uma trajetória sustentável para a dívida púbica é condição necessária para a convergência das expectativas de inflação, a redução das taxas de juros e maior crescimento da economia nos próximos anos. Se houver a indicação de uma nova regra crível que caminhe nesse sentido, as taxas de juros podem se reduzir mais rapidamente, tornando o trabalho de ajuste fiscal menos custoso. Assim, é fundamental que o novo governo encaminhe uma proposta de arcabouço fiscal nos primeiros meses do mandato.
Inflação – Curto prazo melhor, médio prazo incerto
Os dados recentes mostram início do processo de desinflação. O IGP-M de novembro registrou queda mensal de 0,56%, após cair 0,97% no mês anterior. O componente de preços ao atacado (IPA) registrou deflação pelo quarto mês consecutivo. A descompressão de custos tende a chegar ao consumidor mais adiante.
Inflação de serviços também começa a mostrar dinâmica mais favorável. Na prévia de novembro, medida pelo IPCA-15, a inflação de serviços anualizada arrefeceu para 3,93%, de 5,91% em outubro (média móvel 3 meses, com ajuste sazonal). O grupo de serviços subjacentes – preços mais sensíveis ao ciclo econômico – recuou de 8,08% para 7,21% na mesma base de comparação.
A desaceleração da economia, como resposta ao ajuste monetário implementado pelo Banco Central, reforça a tendência de queda da inflação nos próximos trimestres.
Desta forma, mantemos nossa projeção para o IPCA de 2022 em 5,8%, após forte elevação de 10,1% em 2021.
A desinflação deve continuar nos primeiros trimestres de 2023. Ajustamos levemente a projeção para o IPCA do ano que vem, de 5,2% para 5,4%, por conta de mudanças pontuais nas projeções de alguns itens, como educação e combustíveis.
Entretanto, as projeções de médio prazo já refletem a política fiscal expansionista. Como já discutido na seção de Atividade, a expansão das despesas do governo representa um impulso de renda no curto prazo. Além do efeito sobre a demanda agregada, a política fiscal expansionista eleva preços de ativos, o grau de incerteza e expectativas de inflação. Para mais informações, ver o relatório Expectativas de médio prazo são fundamentais para que a estratégia do Copom funcione.
Para o IPCA de 2024, nossas estimativas apontam alta de 4,0%. A política fiscal mais expansionista do que o esperado tende a contaminar as expectativas dos agentes econômicos para prazos mais longos e pode elevar a taxa de juros neutra da economia. Entendemos que essa pressão sobre as expectativas levará o Copom a manter a taxa Selic por mais tempo (ver seção de Política Monetária). Entretanto, mesmo com os juros em patamar contracionista por mais tempo, acreditamos que a convergência da inflação à trajetória de metas ainda não ocorrerá em 2024.
Setor Externo: Riscos fiscais domésticos impedem redução da taxa de câmbio
A taxa de câmbio brasileira apresentou elevada volatilidade nas últimas semanas, refletindo o aumento de riscos fiscais. As perspectivas de deterioração das contas públicas domésticas vêm exercendo pressão altista relevante sobre a taxa de câmbio, que oscilou entre cerca de R$/US$ 5,05 e R$/US$ 5,40 nas últimas semanas. Os riscos locais contrabalançaram os efeitos positivos de fatores externos, como a alta dos preços das commodities e o enfraquecimento do dólar no período recente (o índice DXY, que mede o valor da moeda dos Estados Unidos em relação a uma cesta de seis moedas fortes, recuou 5% no mês passado).
Ajustamos a projeção para a taxa de câmbio no final de 2022, de R$/US$ 5,00 para R$/US$ 5,25, e mantemos a expectativa de R$/US$ 5,30 para o final de 2023. A piora do quadro fiscal continuará pesando sobre a taxa de câmbio no próximo ano, em nossa avaliação. Em contrapartida, alguns sinais de alívio no cenário global, com destaque à expectativa de desinflação na maioria das regiões (potencial de maior apetite ao risco) e reabertura da China (manutenção dos preços de commodities em níveis altos), devem evitar uma depreciação cambial mais acentuada no Brasil. Considerando uma dinâmica semelhante, prevemos R$/US$ 5,40 para o final de 2024.
Na divulgação dos dados do balanço de pagamentos de outubro, o Banco Central promoveu revisões tanto ordinárias quanto extraordinárias, com destaque para alterações na conta de Transportes – Fretes. Como resultado, o déficit da conta corrente em 2021 aumentou de US$ 27,9 bilhões (-1,7% do PIB) para US$ 46,4 bilhões (-2,9% do PIB). Por sua vez, o déficit entre janeiro e setembro de 2022 subiu de US$ 29,6 bilhões para US$ 39,4 bilhões – as alterações na conta de Transportes representaram aproximadamente 90% da revisão total. As transações de Investimento Direto no País (IDP) apresentaram mudanças sutis (por exemplo, de US$ 70,7 bilhões para USD 68,4 bilhões para o período entre janeiro e setembro de 2022).
Incorporando os resultados de outubro, assim como as alterações metodológicas promovidas pelo Banco Central, revisamos para cima as projeções de déficit em transações correntes e para baixo a expectativa de ingresso líquido de IDP em 2022. Prevemos que o saldo em conta corrente atingirá -US$ 57,8 bilhões em 2022 (-3,0% do PIB) – nossa estimativa anterior apontava para -US$ 41,6 bilhões (-2,4% do PIB). Por sua vez, projetamos que o IDP totalizará US$ 84,5 bilhões este ano (4,4% do PIB) – anteriormente, prevíamos US$ 89,0 bilhões (4,7% do PIB).
Para 2023, revisamos as projeções na mesma direção, com saldo em transações correntes e IDP em -US$ 60,5 bilhões (-3,0% do PIB) e US$ 78,3 bilhões (3,9% do PIB), respectivamente. Anteriormente, as projeções apontavam para -US$ 46 bilhões (-2,3% do PIB) e US$ 77,0 bilhões (3,9% do PIB). Para 2024, acreditamos que o déficit em conta corrente avançará de forma mais moderada, chegando a US$ 63,0 bilhões (-3,1% do PIB), e que o ingresso líquido de IDP recuará para US$ 76,0 bilhões (3,7% do PIB).
Embora com folga menor e diante das incertezas globais e domésticas, a dinâmica favorável do setor externo permanece. O IDP deve continuar em patamares elevados, a despeito de alguma desaceleração projetada para os próximos anos. Por sua vez, a ampliação do déficit em conta corrente tende a perder força nos próximos anos, em linha com o arrefecimento da demanda doméstica e os níveis depreciados da taxa de câmbio.
Política Monetária – Fiscal mais expansionista adia flexibilização monetária
A estratégia do Banco Central parece estar funcionando. A taxa Selic em patamar contracionista está controlando a demanda doméstica e as expectativas de inflação de curto prazo. Os efeitos da desinflação global sobre os preços domésticos estão ficando mais claros, principalmente com a taxa de câmbio reagindo relativamente bem ao aperto monetário global.
No entanto, o aumento do risco fiscal pode comprometer a convergência da inflação no médio prazo. A política fiscal mais expansionista esperada para 2023 em diante (veja a seção sobre Política Fiscal deste relatório) tende a manter as expectativas de inflação para 2024 acima da meta.
Se a sustentabilidade da dívida estiver ameaçada, as expectativas de inflação de longo prazo tendem a refletir o risco de algum grau de monetização da dívida. As projeções para 2024, que já estão acima da meta da pesquisa Focus do Banco Central e dos mercados futuros (taxa de inflação implícita), podem subir mais.
Diante disso, adiamos para o primeiro semestre de 2024 o ciclo de flexibilização que esperávamos acontecer no segundo semestre de 2023. Acreditamos agora que o Copom manterá a taxa Selic em 13,75% até o final de 2023. Nossas simulações replicando o modelo do Copom indicam que tal trajetória é suficiente para compensar o aumento das expectativas de inflação gerada pela política fiscal mais expansionista, o que passamos a contemplar em nosso cenário.
A política monetária em 2024 dependerá crucialmente da nova âncora fiscal. Com maior previsibilidade na dinâmica da dívida, a taxa Selic poderá voltar gradativamente a um patamar mais neutro (em torno de 5% em termos reais).
Assim, projetamos a taxa Selic em 10,00% até o final de 2024. Entretanto, ressaltamos que o nível neutro também depende da dinâmica da dívida e do risco fiscal. Antes do estabelecimento do teto de gastos, a taxa Selic estava entre 12% e 14%, e a inflação girava em torno de 6%.
Ou seja, se a política fiscal for ainda mais expansionista do que o esperado em nosso cenário base, e o regime fiscal estiver mudando, o nível de equilíbrio da taxa Selic também pode mudar tanto em termos reais quanto nominais. Isso torna a projeção de política monetária no Brasil uma tarefa ainda mais desafiadora.