Esse relatório tem o objetivo de apresentar um overview do ambiente político nos últimos dias referente à votação de projetos que impactam diretamente o setor financeiro e bancário. Além de explicarmos o conteúdo das propostas e seus possíveis impactos.
Contexto político
Com a conclusão da votação do projeto de socorro aos Estados no início de abril, o Senado redefiniu uma nova agenda de votações para as próximas semanas. No bojo das discussões voltaram a figurar o projeto que trata do aumento da CSLL, que fixa um teto para os juros dos cartões e cheque especial e o que suspende o pagamento do consignado por parte dos aposentados durante a pandemia.
A reapresentação desses temas tem como background um movimento por parte de alguns setores do Senado, que passaram a adotar o discurso de que o sistema financeiro/bancário também deve contribuir nesse momento de crise. Ressaltamos que a tentativa de se ampliar a taxação do setor não é algo novo, há na história recente dezenas de iniciativas como essa dentro do Congresso.
O fato é que com a agenda do Senado aberta houve alguns avanços nas discussões na semana do dia 11 de abril. Na ocasião, chegou-se a cogitar a possibilidade de votar o projeto que trata do teto de cartões/cheques no dia 12 e na sequência, no dia 20, a do aumento da CSLL.
Nesse meio tempo, representantes do setor entraram em campo e conseguiram, num processo de convencimento e esclarecimento, adiar as discussões. Ainda é muito cedo para se saber até quando esses projetos deixarão de ser discutidos.
Por outro lado, há um entendimento, por parte desses representantes do setor, que estiveram reunidos nos últimos dias com a cúpula do Senado, de que o presidente da Casa, Davi Alcolumbre, está mais propício a deixar essas duas propostas em banho maria. Dessa forma, a chance de na reunião de segunda-feira (25) o tema ser adiado novamente é considerável.
Diante desse cenário podemos considerar que o tema será adiado por tempo indeterminado? Acreditamos que não. É preciso ter em mente que atualmente Davi Alcolumbre tem trabalhado pela sua reeleição ao comando do Senado. A disputa está prevista para acontecer em fevereiro de 2021. Em razão de estar se movimentando nesse intuito, o senador possivelmente não vai bater de frente com as demandas dos demais pares. Agradar agora pode ajudar no convencimento quando a disputa pela presidência do Senado for oficialmente lançada, o que deve acontecer apenas no fim deste ano. Por isso, existe sim a possibilidade de o tema ficar indo e voltando dos holofotes nas próxima semanas. Mas como ressaltando anteriormente, hoje, os sinais de Davi Alcolumbre são no sentido de ganhar tempo e segurar o quanto puder a votação dos projetos.
Mesa de negociação
Apesar de as propostas (cartões/cheques e CSLL) poderem ser colocadas num segundo plano no curto prazo, o projeto que trata da suspensão do pagamento dos consignados por parte dos aposentados pode ganhar tração.
A votação desse projeto pode servir para atender em parte os setores do Senado que têm adotado o discurso de que o sistema financeiro/bancário também deve contribuir nesse momento de pandemia.
É assim que funciona na política, em negociações. Existe a proposta ideal, a boa e a mínima. Não se pode ganhar em todas as frentes. Neste caso, o projeto dos consignados pode ser considerado como um preço a ser pago pelo não avanço das demais.
O projeto (PL 1328/2020)
Art. 1º A Lei n° 10.820, de 17 de dezembro de 2003, que dispõe sobre a autorização para desconto de prestações em folha de pagamento, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 6°-C No caso de decretação de calamidade pública em razão da emergência sanitária resultante da crise do novo coronavírus (COVID-19), ficam excepcionalmente suspensos, durante esse período, os pagamentos das obrigações de operações de créditos consignados em benefícios previdenciários.
§1º Não será considerado inadimplemento de obrigações de pagamento, nem serão cobrados multas, taxas, juros ou demais encargos.
§2º São beneficiários da suspensão dos pagamentos das obrigações de operações de créditos consignados, beneficiários adimplentes ou cujos atrasos nos pagamentos das obrigações financeiras devidas até 31 de março de 2020 sejam de, no máximo, 180 (cento e oitenta) dias contados a partir da data de seu vencimento regular.
§3º A suspensão de que trata o caput alcançará́ 4 (quatro) parcelas, para os contratos das operações de créditos.”
Câmara dos Deputados
Reforçamos que todos os projetos mencionados, uma vez aprovados no Senado, deverão também ser discutidos pela Câmara. Na Casa, apesar de também haver propostas similares até o momento, não houve nenhum movimento por parte do presidente Rodrigo Maia em colocá-los em discussão.
Análise de impacto
Mantemos recomendação de Compra no Banco do Brasil, Bradesco, e Neutro em Itaú e Santander Brasil. Porém, não assumimos que tais medidas serão aprovadas no nosso cenário base. Caso tais medidas sejam aprovadas, iremos rever nossas estimativas para o setor.
Aumento da contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL). Existem vários projetos no Congresso que visam o aumento do imposto corporativo para bancos. Para entendimento, bancos pagam 25% de imposto de renda e 20% de CSLL, totalizando 45% de imposto. Caso alguma das três principais propostas (que detalhamos a seguir) sejam aceitas, o imposto de bancos pode ficar entre 65% e 75%.
- No curto prazo, pode ajudar. Nem tudo é negativo, pois existe um impacto positivo no curto prazo de reavaliação dos ativos líquidos tributários dos bancos, o que gera ganhos contábeis. Assim como aconteceu no quarto trimestre de 2019 (4T19), bancos podem utilizar tal ganho para suavizar os efeitos da pandemia (aumento de provisões).
- O aumento não é o mostrado. A taxa efetiva de imposto dos bancos se difere da taxa teórica, uma vez que: i) bancos pagam juros sob capital próprio que deduz imposto a ser pago; ii) nem todas as operações dentro de um banco são taxadas com a CSLL de banco, uma vez que bancos possuem subsidiárias com taxa de imposto diferente; e iii) bancos possuem diferentes benefícios fiscais. Como cada banco possui uma política de distribuição de JCP, bem como estruturas de receitas e benefícios diferentes, o aumento da taxa vai impactar de maneira diferente cada um.
- Projetos divergem em impacto. Seguem os três projetos e suas características: i) Projeto de Lei 911/2020 aumenta em 30% a CSLL para 50%, totalizando 75% de imposto. Atinge bancos e seguradoras e possui vigência indeterminada; ii) Projeto de Lei 1276/2020 aumenta em 30% a CSLL para 50%, totalizando 75% de imposto. Atinge grandes bancos (patrimônio líquido acima de 1% do PIB e enquadrados como S1 e S2 pelo BACEN) e possui vigência de dois anos; e iii) Projeto de Lei 1522/2020 aumenta em 20% a CSLL para 40%, totalizando 65% de imposto. Atinge instituições financeiras e mineradoras com faturamento acima de R$ 10 milhões e possui vigência até 2030.
- Simulação. Considerando que o valor atual pode ser agressivo e que pode ser alterado para baixo, fizemos um aumento progressivo na CSLL de 5% a 20% na CSLL para os bancos sob cobertura. O impacto médio no nosso preço-alvo com um aumento de 20% na CSLL seria de 27%. Lembrando que: i) o aumento na CSLL pode chegar a 30%; ii) parte dos negócios de bancos (seguros, adquirência etc.) podem não participar do aumento, então não consideramos aumento cheio nos bancos; e iii) a distribuição de proventos também seria afetada, conforme demonstrado na tabela a seguir.
Teto de juros no cheque especial e rotativo do cartão de crédito. O Projeto de Lei nº 1166, de 2020 limita em 30% o juros cobrado nas modalidades de crédito cheque especial e crédito rotativo de cartão de crédito e obriga os bancos a manterem o limite dos clientes na modalidade. As mudanças, se implementadas, estariam em vigor durante a vigência do estado de calamidade pública. A medida, se aplicada, é negativa para o setor e possivelmente traria rentabilidade negativa nas linhas destacadas.
- Impacto relevante em juros. O teto de 30% se compara as seguintes taxas em março: i) 312% para cheque especial de empresas; ii) 147% no cartão de crédito rotativo para empresas; iii) 130% no cheque especial para pessoas físicas; e iv) 326% no rotativo para pessoas físicas.
- Impacto relevante em saldo. Embasados nos dados do Banco Central, chegamos a um saldo de R$ 87.5 bilhões para as linhas em março, sendo: i) R$ 4,6 bilhões em cartão de crédito rotativo corporativo; ii) R$ 46 bilhões em cartão de crédito rotativo pessoa física; iii) R$ 11 bilhões em cheque especial pessoa jurídica; e iv) R$ 19,6 bilhões em cheque especial pessoa física.
- Rentabilidade negativa nas linhas. O projeto cita que bancos teriam retorno de 30% sob as linhas, porém desconsidera o custo de crédito. Tais linhas possuem as maiores taxas de juros em parte pela insegurança do recebimento: são créditos “clean”, sem garantia. A inadimplência do cheque especial é de 15%, enquanto no cartão de crédito rotativo para pessoas físicas chega a 35%. Tudo mais constante, a rentabilidade das linhas seria negativa.
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