O Congresso Nacional promulgou nesta quarta-feira (20) a emenda constitucional 132/2023, que institui a reforma tributária. A proposta foi apresentada em 2019 e aprovada pela Câmara dos Deputados em 15 de dezembro. Pelo Senado, o texto havia sido aprovado em novembro.
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O que é a reforma tributária?
A reforma tributária simplificará e unificará os tributos sobre o consumo. A principal mudança será a extinção de quatro tributos (PIS, Cofins, ICMS e ISS), que serão fundidos em dois: uma Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que será administrada pelo governo federal, um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que estará sob gestão dos estados e municípios. CBS e IBS terão a mesma base de cálculo e as mesmas regras. A proposta prevê alíquotas reduzidas para alguns setores da economia e abre margem para a criação de um sistema de cashback (devolução de parte do tributo pago), que será regulamentada por lei complementar. O texto também prevê pequenas mudanças na tributação sobre patrimônio, com cobrança de imposto sobre meios de transporte de luxo (como iates e jatinhos) e no imposto sobre heranças.
Por que fazer uma reforma tributária?
Especialistas apontam que o sistema tributário atual é muito complexo e disfuncional, já que é cumulativo em grande parte (penalizando setores com maiores cadeias de produção), baseado na tributação na origem (o que onera investimentos e exportações e permite a chamada “guerra fiscal”) e com múltiplas alíquotas (o que reduz a transparência ao consumidor e aumenta a litigiosidade). A reforma tenta solucionar esses problemas, ao adotar a não-cumulatividade plena (ou seja, alíquota incide apenas sobre o valor adicionado em cada etapa da produção), a tributação no destino (no estado e município onde o bem ou serviço é consumido) e a adoção de quatro alíquotas: padrão, intermediária (70% da padrão) reduzida (40% da padrão) e zero.
A reforma vai aumentar a carga tributária?
O texto prevê um teto para manter constante a carga tributária sobre o consumo. Atualmente, esse teto corresponderia a 12,5% do PIB, uma fórmula que considera a média da receita dos tributos sobre consumo e serviços entre 2012 e 2021. As alíquotas serão definidas de forma a não superar esse teto, com uma reavaliação a cada 5 anos. Caso o limite seja superado, a alíquota de referência terá de cair, e a redução seria calculada pelo Tribunal de Contas da União, baseado em dados dos entes federativos e do futuro Comitê Gestor do IBS.
Quais tributos serão extintos pela reforma?
Os tributos federais a serem extintos são o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Eles serão substituídos pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), a ser arrecadada pela União. Inicialmente, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) seria incorporado à CBS, mas foi mantido e incidirá apenas sobre mercadorias concorrentes às produzidas na Zona Franca de Manaus.
Outros dois impostos a serem extintos são locais: o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), administrado pelos estados; e o Imposto sobre Serviços (ISS), arrecadado pelos municípios. Eles serão substituídos pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).
Como funcionarão os fundos?
Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FDR)
Em troca de mudanças que trarão o fim da guerra fiscal entre os estados, o governo criará um Fundo de Desenvolvimento Regional para financiar projetos de desenvolvimento em estados mais pobres. Inicialmente orçado em R$ 60 bilhões por ano a partir de 2043, o fundo foi um dos principais pontos de embates durante as discussões. A aplicação dos recursos será voltada para estudos, projetos e obras de infraestrutura; fomento a atividades com elevado potencial de geração de emprego e renda, com possibilidade de concessão de subvenções; ações para o desenvolvimento científico e tecnológico e à inovação.
O fundo começaria com aportes de R$ 8 bilhões em 2029 até chegar a R$ 40 bilhões no início de 2034; quando subiriam R$ 2 bilhões por ano até atingir R$ 60 bilhões em 2043.
Fundo de Desenvolvimento Sustentável dos Estados da Amazônia Ocidental
Destinado a estados do Norte com áreas de livre-comércio. Inicialmente restrito ao Amazonas, para beneficiar a Zona Franca de Manaus, o fundo foi ampliado para Acre, Rondônia, Roraima e Amapá durante votação no Senado.
Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais
Com recursos da União, o fundo garantirá benefícios fiscais já concedidos pelos estados até 2032. Em 2028, fundo chegaria ao ponto máximo, com R$ 32 bilhões, com os recursos caindo posteriormente. O seguro-receita para compensação da perda de arrecadação dos entes federativos com o fim de incentivos fiscais corresponderá a 5% do IBS. Os critérios de repartição serão:
- estados e municípios com maior perda relativa (em termos percentuais) de arrecadação;
- receita per capita (por habitante) do fundo não pode exceder três vezes a média nacional, no caso dos estados, e três vezes a média dos municípios de todo o país, no caso das prefeituras.
Fundos estaduais para infraestrutura
Fundos estaduais formados por contribuições locais sobre produtos primários e semielaborados poderão continuar a existir até 2032, desde que estejam em vigor em 30 de abril de 2023.
O que é o imposto seletivo?
O imposto seletivo funcionará como uma sobretaxa sobre produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. Entram na lista bebidas alcoólicas e cigarros, com possibilidade de cobrança também sobre combustíveis, agrotóxicos, defensivos agrícolas e alimentos processados e ricos em açúcar. O texto também estabelece alíquota de 1% sobre extração de recursos naturais não renováveis, como minério e petróleo. Segundo a emenda, 60% da receita vai para estados e municípios.
Quais são os próximos passos?
Ao longo de 2024, o Congresso terá de votar leis complementares para regulamentar a reforma tributária. Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, os projetos serão enviados nas primeiras semanas de 2024.
Também no próximo ano, o governo poderá dar início à reforma do Imposto de Renda, com mudanças como a taxação de dividendos (parcela de lucros das empresas distribuídos aos acionistas). Nesse caso, porém, as mudanças ocorrerão por meio de projeto de lei, com quórum menor de votação.
Qual será a alíquota cobrada?
Haverá quatro tipos de alíquota: única padrão, intermediária, reduzida e zero. A alíquota única padrão é estimada em 27,5%.
A alíquota reduzida para 40% da alíquota padrão deve ser aplicada aos seguintes grupos, com cadeia produtiva curta e que seriam prejudicados pelo IVA não-cumulativo:
- Dispositivos médicos;
- Dispositivos de acessibilidade para pessoas com deficiência;
- Medicamentos e produtos de cuidados básicos à saúde menstrual (alíquota de IBS);
Serviços de saúde; - Serviços de educação;
- Produtos agropecuários fora da cesta básica, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura;
- Insumos agropecuários, alimentos destinados ao consumo humano e produtos de higiene pessoal;
Produtos e insumos da aquicultura; - Produções artísticas, culturais, jornalísticas e audiovisuais nacionais;
- Atividades desportivas;
- Bens e serviços relacionados à segurança e à soberania nacional, à segurança da informação e à segurança cibernética;
- Comunicação institucional;
- Produtos de limpeza consumidos por famílias de baixa renda;
- Setor de eventos;
- Nutrição enteral ou parenteral (que previnem ou tratam complicações da desnutrição)
Os profissionais liberais com atividades regulamentadas pagarão 70% da alíquota-padrão do IVA. Na prática, medida beneficia apenas empresas, escritórios e clínicas que faturem mais de R$ 4,8 milhões por ano. Isso porque a maior parte dos profissionais autônomos, que ganham abaixo desse valor, está incluída no Simples Nacional.
Já a alíquota zero é prevista para:
- Cesta básica nacional com possibilidade de regionalização, a ser definida por lei complementar. Atualmente, cada estado tem sua composição;
- Medicamentos para tratamento de doenças graves;
- Serviços de educação de ensino superior: Prouni;
- Pessoas físicas que desempenhem atividades agropecuárias, pesqueiras, florestais e extrativistas vegetais in natura;
- No caso de produtor rural pessoa física, isenção de IBS e CBS vale para quem tem receita anual de até R$ 2 milhões. O produtor que recebe menos que esse valor por ano poderá repassar crédito presumido (tipo de compensação tributária) aos compradores de seus produtos;
- Serviços prestados por Instituição Científica, Tecnológica e de Inovação (ICT) sem fins lucrativos;
- Compra de automóveis por taxistas e pessoas com deficiência e autismo;
- Compra de medicamentos e dispositivos médicos pela Administração Pública e por entidades de assistência social sem fins lucrativos;
- Reabilitação urbana de zonas históricas e de áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística;
- Compras governamentais: isenção, caso seja admitida a manutenção de créditos tributários de operações anteriores; repasse integral da arrecadação do IBS e da CBS recolhida.
A reforma será positiva para a economia?
O fim das distorções causadas pelo atual sistema tributário deve impactar positivamente a produtividade e o crescimento do Brasil. Esses ganhos decorrem da melhora em indicadores como conformidade tributária, nível de exigências administrativas e redução de litigiosidade, que convergiriam para os padrões observados em países semelhantes ao Brasil. Os estudos realizados até o momento convergem em mostrar que o crescimento potencial deve se elevar. Em geral, as estimativas variam de 12% (0,76% ao ano) a até 22% (1,22%) em 15 anos, considerando-se apenas os efeitos diretos da mudança.
Embora positivos, esses efeitos só devem ser verificados em prazos mais longos, uma vez que as mudanças devem ocorrer de forma gradual e seus efeitos tentem a ser menores em um primeiro momento e crescer ao longo do tempo.
Quais as principais mudanças para o consumidor?
Com uma longa lista de exceções e de alíquotas especiais, o novo sistema tributário terá impactos variados conforme o setor da economia. Além disso, haverá medidas que garantam a progressividade na tributação de alguns tipos de patrimônio. Veja alguns pontos da reforma:
Cesta básica
O valor da cesta básica deve ter diminuição quando uma lei complementar definir uma lista nacional de produtos que terão alíquota zero. Ainda não se sabe o impacto final sobre os preços.
Remédios
O texto prevê a alíquota reduzida em 60% para medicamentos e produtos de cuidados básicos à saúde menstrual. Medicamentos usados para o tratamento de doenças graves, como câncer têm previsão de alíquota zero.
Combustíveis
A reforma tributária estabelece um regime de tratamento diferenciado para combustíveis e lubrificantes. A cobrança será monofásica (em uma única etapa da cadeia), com alíquotas uniformes e possibilidade de concessão de crédito para contribuinte.
Veículos
A cobrança de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) passará a incidir sobre veículos aquáticos e aéreos, como jatos, helicópteros, iates e motos aquáticas. A reforma também estabelece que o imposto será progressivo, conforme o impacto ambiental do veículo, ou seja: quem polui mais paga mais.
Durante as negociações para a reforma tributária, no entanto, foi criada uma lista de exceção para evitar a cobrança sobre veículos usados para a agricultura e para serviços. A relação abrange aeronaves agrícolas e certificadas para prestar serviços aéreos a terceiros; embarcações de pessoa jurídica com outorga de serviços de transporte aquaviário; embarcações de pessoa física ou jurídica que pratique pesca industrial, artesanal, científica ou de subsistência; plataformas que se locomovam na água sem reboques (como navio-sonda ou navio-plataforma) e tratores e máquinas agrícolas.
Serviços
A reforma tributária poderá impactar os preços dos serviços. Isso porque o setor, sem cadeia produtiva longa, se beneficiará menos de créditos tributários. Entretanto, como a maior parte dos serviços aos consumidores finais se enquadra no Simples Nacional, não deve haver mudanças.
Alguns tipos de serviço também terão regimes tributários específicos: serviços de transporte coletivo, de hotelaria, parques de diversão e parques temáticos, restaurantes, agências de viagem e missões diplomáticas.
Serviços financeiros, seguros, operações com bens imóveis, cooperativas, planos de assistência à saúde e apostas terão alíquotas específicas, tratamento diferenciado nas regras de creditamento (aproveitamento de créditos tributários) e na base de cálculo; e tributação com base na receita ou no faturamento (em vez do valor adicionado na cadeia).
Herança e doação
A reforma prevê progressividade do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). A alíquota subirá conforme o valor da transmissão. Além disso, o texto inclui cobrança sobre heranças no exterior e isenção de ITCMD sobre transmissões para entidades sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social, inclusive as organizações assistenciais e beneficentes de entidades religiosas e institutos científicos e tecnológicos.
O que a reforma tributária muda no JCP?
A discussão sobre juros sobre o capital próprio (JCP) não está no texto atual. A pauta foi tratada durante a discussão da MP nº 1185/2023. Entre as principais mudanças, o texto prevê retirar do cálculo da remuneração:
- o capital social que não for integralizado (ou seja, o que não está efetivamente na empresa, mas apenas no papel);
- as variações positivas no patrimônio líquido decorrentes de atos societários entre partes dependentes, que não envolvam efetivo ingresso de ativos à pessoa jurídica, com aumento patrimonial em caráter definitivo, independentemente do disposto nas normas contábeis; e
- reservas de capital formadas com lucro líquido decorrente de doações ou subvenções governamentais para investimentos.
Ainda sobre a reserva de capital, só valerão para fins de cálculo do JCP as reservas “constituídas pelo ágio entre o preço de emissão das ações e o valor nominal ou aquelas formadas na constituição da companhia se o valor nominal não for fixado".
Leia também:
https://conteudos.xpi.com.br/acoes/relatorios/possivel-fim-do-jcp-entenda-os-impactos-no-setor-de-varejo/
Uma segunda rodada de modificações, com possível extinção da JCP ou sua substituição por outro mecanismo, deve ser tratada na reforma tributária sobre a renda, que deve ser apresentada ao Congresso em 90 dias.
Quando entra em vigor a reforma tributária?
As mudanças ocorrerão aos poucos. A nova tributação das mercadorias e dos serviços começará a entrar em vigor em 2026 e só terminará em 2033. A transição para a cobrança do imposto no destino (local de consumo) se iniciará em 2029, levará 50 anos e só será concluída em 2078.
Veja as datas previstas para a transição:
- 2026: início da cobrança da CBS e do IBS em 2026, com alíquota de teste de 0,9% para a CBS e 0,1% para o IBS;
- 2027: extinção do PIS/Cofins e elevação da CBS para alíquota de referência (a ser definida posteriormente pelo Ministério da Fazenda);
- 2027: redução a zero da alíquota de IPI, exceto para itens produzidos na Zona Franca de Manaus;
- 2029 a 2032: extinção gradual do ICMS e do ISS na seguinte proporção:
– 90% das alíquotas atuais em 2029;
– 80% em 2030;
– 70% em 2031;
– 60% em 2032.
- 2033: vigência integral do novo sistema e extinção dos tributos e da legislação antigos;
- 2029 a 2078: mudança gradual em 50 anos da cobrança na origem (local de produção) para o destino (local de consumo).
(Com informações de Agência Câmara de Notícias e Agência Brasil)
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