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Os destaques de julho e o que esperar para o restante do semestre

Clique aqui para baixar o PDF | Click here to download the PDF Revisamos o crescimento do PIB 2020 de -6,0% para -4,8%, enquanto 2021 passou de 2,5% para 3,0%Banco Central reduziu a Selic para 2,00% ao ano, mas deixou a “porta aberta” para mais cortes, ainda que com baixa probabilidade.A depreciação do dólar contra […]

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  • Revisamos o crescimento do PIB 2020 de -6,0% para -4,8%, enquanto 2021 passou de 2,5% para 3,0%
  • Banco Central reduziu a Selic para 2,00% ao ano, mas deixou a “porta aberta” para mais cortes, ainda que com baixa probabilidade.
  • A depreciação do dólar contra moedas de países desenvolvidos e a alta do preço do ouro foram os destaques do mês.  

Principais destaques do mês

Julho foi mais um mês de “risk on” para os preços dos ativos, com destaque para a forte depreciação do dólar em relação às moedas de países desenvolvidos e para a forte alta do preço do ouro. Um dólar mais fraco geralmente está associado a um ambiente positivo para emergentes e elevação de preços de commodities. No relatório anterior, mencionamos que a tendência do dólar será variável chave no segundo semestre e hoje iremos discutir os fatores por trás desse movimento. 

O DXY, que é o índice do dólar americano contra uma cesta de moedas estrangeiras (principalmente euro), recuou cerca de 4,0% no mês, maior depreciação mensal da última década. O rápido movimento gerou discussões sobre uma forte mudança de tendência da moeda de reserva do mundo e inclusive questionamentos sobre a possibilidade de o dólar perder esse status. Em primeiro lugar, colocando em uma perspectiva de longo prazo (gráfico abaixo), fica claro que o movimento recente é pequeno e o dólar ainda está dentro de uma fase forte do ciclo da moeda. Geralmente, ciclos de dólar forte são associados à baixo crescimento global e é normal passarmos por “mini-ciclos” de apreciação/depreciação durante esses longos períodos de tendência.

O cenário internacional

Em junho, afirmamos que o número de casos e hospitalizações causadas pelo Covid-19 estavam em alta em diversos estados americanos, dentre os quais muitos estavam atrasando o processo de reabertura ou até mesmo revertendo algumas das medidas de flexibilização. O resultado foi uma desaceleração marginal dos dados de alta frequência de atividade que todos os analistas estão se acostumando a acompanhar. O Fed de Nova Iorque, por exemplo, criou um índice semanal de atividade para os EUA, por meio do qual essa desaceleração na recuperação fica clara ao longo de julho:

Por outro lado, o processo de reabertura na Europa está muito mais controlado, com a 2ª onda do vírus muito menor do que a primeira na maioria dos países. Esse “momentum” é um dos motivos para a melhor performance do euro contra o dólar, movimento que acaba impulsionando a depreciação do dólar contra outras moedas. 

Outros fatores foram importantes para a depreciação do dólar. A ampla liquidez injetada pelo FED e as linhas de swap com outras moedas (estendidas até março de 2021) tiveram o papel de acalmar os mercados e contribuir para a normalização. O Fed, além de se comprometer com taxas de juros próximas de zero por um longo período, realizou a maior e mais rápida expansão do seu balanço, monetizando grande parte da expansão fiscal realizada pelo Tesouro americano. O resultado dessa política é uma forte queda das taxas de juros reais com elevação das expectativas de inflação (dado que os juros nominais ficaram praticamente estáveis nos últimos meses). Juros reais têm correlação inversa com o preço do ouro (Keynes), considerado uma moeda com taxa de juros nominal zero, o que explica a alta de 30% acumulada do ativo em 2020. O gráfico abaixo mostra exatamente esse processo de elevação nas expectativas de inflação, queda dos juros reais e alta no preço do ouro desde março.

Ainda é cedo para dizer se estamos vivendo apenas um “mini-ciclo” de apreciação do dólar ou se a monetização parcial do déficit americano será suficiente para iniciar uma nova fase de dólar fraco no mundo. No entanto, dada a expectativa de novos aumentos no balanço do Fed (QE to infinity and beyond), a manutenção da taxa de juros no limite inferior por muito tempo e outros fatores do balanço de pagamentos americano, consideramos relevante a probabilidade dessa inflexão no ciclo do dólar ao longo do segundo semestre e, principalmente, em 2021. 

Para agosto, o foco do mercado será no provável acordo entre Democratas e Republicanos para um novo pacote fiscal (cerca de US$ 1,5 tri), evitando o chamado “fiscal cliff”, que teria forte impacto negativo no consumo das famílias que deixariam de receber o auxílio financeiro. Além disso, observamos que a equação do vírus x economia está se modificando, com a maior parte dos países/estados realizando restrições seletivas em locais onde o número de casos da Covid-19 começa a aumentar. Parece improvável que o completo fechamento de cidades volte a ocorrer, reduzindo o impacto negativo na atividade de possíveis novas ondas do vírus.

Por fim, vale destacar o otimismo crescente com a descoberta da vacina para a Covid-19. Atualmente existem 6 entrando na última fase de testes, com possibilidade de anúncio da efetividade (ou não) até dezembro. O grupo dos chamados “superforecasters” do Good Judgment Project atribuem uma probabilidade de 37% para que 25 milhões de doses sejam distribuídas até março de 2021 e 78% de chances até setembro de 2021. Dois meses atrás essas probabilidades eram 9% e 35%, respectivamente.  

Cenário doméstico     

No Brasil, o Ibovespa teve forte alta no mês (+8,3%), a curva de juros nominais recuou desinclinando e o real apreciou 4,5% contra o dólar.  O destaque foi a decisão do Banco Central que reduziu a Selic em 25bps, para 2,00% a.a., em linha com as expectativas do mercado, mas deixando a “porta aberta” para mais cortes, ainda que tenha elevado a barra para um corte adicional.

Uma inovação foi a introdução de uma espécie de forward guidance com o trecho:“...o Copom não antevê reduções no grau de estímulo monetário, a menos que as expectativas de inflação, assim como as projeções de inflação de seu cenário básico, estejam suficientemente próximas da meta de inflação para o horizonte relevante de política monetária, que atualmente inclui o ano-calendário de 2021 e, em grau menor, o de 2022”. Com a projeção de inflação de 2021 em 75 bps abaixo do centro da meta e de 2022 também 10 bps abaixo em seus modelos com trajetória de Selic do relatório Focus, entendemos que o BCB tenta limitar a alta de juros ao que está no relatório de consenso de analistas ou que, pelo menos, tem alguma margem para acomodar surpresas positivas para atividade econômica.

O que esperar daqui em diante?

Política monetária

Entendemos que o BC deverá manter a taxa SELIC em 2,00% ao ano na próxima reunião do comitê em setembro. Com a inflação de 2022 começando a ganhar relevância para a política monetária, a nossa avaliação é de manutenção do patamar de juros em 2,00% condizente com o nosso cenário macroeconômico até o segundo semestre do ano que vem, quando esperamos ver um ciclo de normalização dos juros eleve a Selic para 3,00%.

O que pode mudar o cenário? O BC ressalta no comunicado a importância da manutenção do atual regime fiscal (leia-se “teto de gastos”) à ancoragem das expectativas de inflação. Como ressaltamos na carta passada, o risco fiscal é crescente e a pressão pela criação de despesas permanentes irá aumentar nos próximos meses com a discussão do orçamento de 2021, em meio a recessão e elevação da taxa de desemprego, que atingiu 22,5% quando ajustamos para uma força de trabalho constante desde janeiro 2020 (muitas pessoas deixaram de procurar em emprego).

Políticas fiscais

Diante do cenário incerto, acreditamos que o governo irá prorrogar o auxílio emergencial até dezembro, elevando nossa projeção de déficit primário para o final de 2020 para 15,1% do PIB, e a relação dívida bruta/PIB para 96%. Não obstante o considerável impacto da extensão do auxílio no resultado deste ano, acreditamos que hoje o maior risco fiscal para o cenário base siga sendo a prorrogação de tais políticas contra cíclicas para 2021. Isso poderia ser possível com a manutenção do decreto de calamidade e do Orçamento da Guerra para o próximo ano ou mesmo outras “ferramentas de contabilidade criativa”, como o uso de créditos extraordinários aprovados e não utilizados em totalidade em 2020 (recursos destinados para o combate a pandemia, por exemplo).

Não enxergamos motivos para o Congresso e o Executivo decidirem sobre o tema antes do último bimestre do ano, mas já observamos bastante ruído na imprensa. O auxílio emergencial como desenhado tem impacto significativo na renda das famílias de menor renda, contribuindo positivamente para a popularidade do presidente. No entanto, trata-se de um gasto de R$ 50 bilhões ao mês, e a sua manutenção em 2021 seria percebida como uma brecha permanente ao teto de gastos, com impacto certamente negativo nos preços dos ativos e efeitos secundários deletérios sobre formação de expectativas.

Atividade econômica

Na atividade, revisamos o crescimento do PIB em 2020 de -6,0% para -4,8%, enquanto para 2021 alteramos de 2,5% para 3,0%, conforme detalhado no artigo “Por que esperar uma queda menos negativa do PIB em 2020?” . Parte da revisão foi motivada pela revisão do desempenho da atividade econômica no segundo trimestre, com os principais indicadores mostrando que o “fundo do poço” foi menor do que o esperado logo no início da pandemia, percepção destacada no relatório mensal de junho. Na abertura por setores, a agropecuária praticamente passa incólume pela pandemia do novo coronavírus e deverá crescer +2,6% em 2020. Já a indústria, com maior dinâmica de recuperação, deverá retrair -5,5% em 2020 e acelerar +5,9% em 2021. O setor de serviços, o mais afetado pelas medidas de distanciamento social, deverá ter recuperação gradual após queda projetada de 5,2% em 2020 e alta de 2,2% em 2021.

Inflação

Por fim, fizemos marginal revisão na projeção do IPCA 2020, passando de 1,0% para 1,1% em função de maior pressão nos preços dos alimentos, com destaque para carnes. Para 2021 nossa projeção segue em 3,0%, mas com os núcleos bem-comportados e perto do limite inferior da meta de inflação. Apesar da revisão positiva do PIB, reconhecemos que o hiato do produto seguirá negativo por um longo período, permitindo uma retomada do crescimento sem pressões inflacionárias pelo lado da demanda. Como mencionado acima, o mercado de trabalho seguirá fragilizado ao longo do próximo ano, minimizando qualquer inflação de salários. Nesse cenário, o Banco Central poderá manter a Selic em nível bastante estimulativo por um muito tempo, iniciando o processo de normalização da política monetária apenas ao final de 2021, e com parcimônia.

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