O destaque da semana no mundo político foi a prorrogação do auxílio emergencial anunciada pelo governo de Jair Bolsonaro. Serão mais dois aportes de R$ 600 divididos em três parcelas. A ideia do governo é esticar o período de cobertura, com duas parcelas escalonadas que cubram três meses com valores decrescentes, de modo a viabilizar a transição para o Renda Brasil, novo programa de transferência de renda que o governo pretende implementar ao final do coronavoucher.
Pedro Guimarães, o presidente da Caixa, disse que ainda está em estudo a possibilidade de fazer mais de um pagamento do coronavoucher por mês, de modo a viabilizar a “escadinha” sugerida por Guedes. Segundo dados do Ministério da Cidadania, mais de 46 milhões de pessoas já receberam o auxílio emergencial. Apesar de essa hipótese não ter sido comprovada pelas pesquisas de popularidade, o sentimento em Brasília é de que o pagamento do auxílio, em meio a pandemia, tem efeito positivo sobre a avaliação da administração Bolsonaro, mesmo diante das crises recentes na composição do governo e com o Poder Judiciário.
Renda Brasil
O objetivo do Renda Brasil seria perpetuar uma ajuda mensal de R$ 300, pagamento que já vai ser “ensaiado” pelo cofre da União no escalonamento do coronavoucher e que é mais alto que o atual Bolsa Família. O novo formato de assistência social reuniria de forma reciclada outros programas sociais: seguro defeso, abono salarial, entre outros.
Uma porta de saída também é prevista no novo desenho para estimular a reentrada dos beneficiários no mercado de trabalho, por meio do programa Carteira Verde Amarela com a possibilidade de contratação por hora de trabalho, desoneração de encargos e imposto de renda negativo para quem não atingir um salário mínimo.
Reação no Congresso
É necessário, no entanto, atentar para o fato de que a mudança na política de transferência de renda depende de aprovação do Congresso. Há dois riscos principais nesse processo político: o primeiro é que não se chegue a uma formulação e aprovação do novo programa a tempo de substituir o que está sendo pago, o que elevaria a pressão pela manutenção do auxílio atual com grave repercussão nas contas públicas.
O segundo, que o Congresso impeça a extinção de parte dos benefícios que o governo pretende encerrar na tentativa de encontrar receita para o Renda Brasil. A manutenção do novomecanismo de transferência de renda junto com outro benefícios seria mais um caminho de aumento da pressão por gastos.
O escalonamento do pagamento do auxílio emergencial não agradou muito o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia. Ele lembra que a lei sobre o tema só autorizou pagamentos no valor de R$ 600 e não fala de parcelamento. Maia tem chamado atenção também para a complexidade do debate sobre extinguir programas sociais e tornar eficiente um modelo que os reúna, considerando estarão em ano eleitoral e no meio das dificuldades econômicas geradas pela pandemia.
Em estudo
Com efeito, incluindo a proposta de reforma tributária, tudo o que este texto cita até aqui está em estudo, excetuando a prorrogação do auxílio emergencial. No Congresso, lideranças dos partidos de centro mostram discurso ensaiado em defesa da saúde fiscal do país, mas as pressões em ano eleitoral e em meio à pandemia não podem ser desprezadas.
Outro lema que está na ponta da língua dos líderes partidários é a necessidade de avançar ao máximo com a reforma tributária ainda este ano, com a criação do IVA federal (Imposto sobre Valor Agregado). Mesmo com parcela expressiva do Congresso rejeitando, pelo menos por enquanto, falar em tributação de lucros e dividendos, no final da semana, Guedes disse que tema será sim incluído na proposta do governo, ainda em estudo, para a reforma tributária.
“Não quero tributar empresa, mas se o dinheiro sair para o acionista, aí você tributa o dividendo. Não é possível que alguém pague zero sobre dividendo enquanto o trabalhador paga 27,5%”, afirmou Paulo Guedes. Tramitam duas propostas diferentes de reforma tributária, uma na Câmara e outra no Senado.
Eleições em novembro
No tema eleitoral, Câmara e Senado aprovaram a PEC que adia as eleições municipais de 2020 de outubro para novembro com a intenção de reduzir os riscos de contágio por coronavírus para o eleitorado. O efeito da mudança no calendário (1º turno em 15 de novembro e 2º turno em 29 de novembro) é empurrar para frente todo o calendário eleitoral, incluindo o início efetivo da campanha para 26 de setembro.
Na prática, o adiamento também abre uma janela maior no início do segundo semestre para discussões de outras pautas – período em que Rodrigo Maia tem sinalizado disposição de avançar com a reforma tributária na Câmara, apesar da falta de coordenação no tema com o Senado.
Atalho nas privatizações
No início do segundo semestre, além da pandemia e seus efeitos econômicos começam a surgir outros temas com potencial para voltar a criar ruído político. Um deles foi a comunicação das mesas do Congresso, Senado e Câmara ao Supremo informando que o governo estaria burlando a regra e desmembrando empresas matrizes em subsidiárias menores para facilitar o processo de privatização.
A regra estabelecida pelo STF determinou que a venda da empresa estatal mãe (matriz) só pode ser feita mediante lei aprovada pelo Congresso. O parlamento quer deixar claro que as chamadas “privatizações brancas” são uma forma de burlar a autorização do Congresso para venda desses ativos públicos. Foram citadas como exemplos as vendas das refinarias Landulpho Alves (Rlam) e Paraná (Repar).
Nos bastidores, o relator do tema no STF, ministro Ricardo Lewandowski, não gostou de a manifestação do Congresso ter chegado no último dia antes do recesso, que o impediu de decidir, pelo menos até agosto, para coibir o suposto atalho adotado pelo governo. A decisão sobre o tema fica a critério do presidente do Supremo, Dias Toffoli, no plantão durante o recesso de julho. Toffoli pode ser considerado um defensor da simplificação dos meios de desestatização, enquanto Lewandowski já chegou a suspender todas as privatizações do país. De qualquer forma, o tema terá que ser analisado pelo plenário que assentou a regra em vigor.
Crises agendadas
O Supremo encerrou nesta semana um dos semestres mais intensos da história do tribunal, alimentado pela pandemia do coronavírus e pela crise com o Poder Executivo. Ao final do da primeira etapa de 2020, está mais claro que a composição atual do STF tende a discordar mais do governo na chamada pauta ideológica do que nos temas econômicos. Linha que deve ter continuidade, principalmente após a troca de comando do tribunal, com a posse de Luiz Fux como presidente, em setembro.
Ao longo da pandemia, a postura dos ministros de decidir sobre coronavírus com base em preceitos científicos e as acusações feitas por Sergio Moro na saída do Ministério da Justiça levaram a crise a momentos de quase ruptura. Enfrentando uma espécie de “cancelamento” virtual, ameaças e ofensivas em diversas intensidades, inclusive partindo do governo, vimos o Supremo cada vez mais unido em torno da autoproteção e usando como escudo o controverso inquérito das fake news, que apura ataques contra os ministros da Corte.
A conclusão dentro do STF, externada pelo presidente, Dias Toffoli é de que depois de tanta turbulência a instituição e a democracia saíram mais fortes. A partir de amanhã, Toffoli ficará no plantão para decidir temas urgentes até o final do recesso em agosto.
Segundo semestre
Para o próximo semestre, a tendência é que permaneça o clima de atrito entre o presidente Jair Bolsonaro e o Supremo, mesmo diante da trégua e do distensionamento vistos nas últimas semanas. O presidente eleito, Luiz Fux, no entanto, vai buscar uma gestão atenta aos temas econômicos, com ênfase na proteção das contas públicas, e baseada na busca de consensos, tarefa árdua considerando os temas que o STF tem pela frente.
Os que mais preocupam o Palácio do Planalto são as ações de cassação no Tribunal Superior Eleitoral, mas há outras fontes de ruído já contratadas e que merecem atenção. A decisão sobre o foro no qual deve ser investigado o senador Flávio Bolsonaro no caso da rachadinha ficou para o segundo semestre e deve ter lugar no plenário do STF.
Os inquéritos sobre fakenews (prorrogado por mais 6 meses) e organização/financiamento dos atos antidemocráticos avançam com apuração que alcançam cada vez mais aliados próximos do presidente. Não menos turbulenta será a indicação do sucessor do ministro Celso de Mello, que vai se aposentar em novembro. O PGR, Augusto Aras, desponta como candidato mais aguerrido. Quanto mais perto a troca, mais nomes vão surgir.
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