1. Balanço do Trimestre: Otimismo Contagioso - Bolsas globais em alta e otimismo contagia outros setores
2. Made in China - Governo chinês restringe compras de microprocessadores da Intel e AMD
3. 130% Cacau - Problemas na produção africana provocam disparada nos preços do Cacau
4. Europa x Big Tech: Ninguém regula a América? - UE abre investigação contra Apple, Meta e Alphabet
5. Truth Social: A hora da verdade - As ações da Trump Media & Technology Group estrearam na bolsa
1. Balanço do Trimestre: Otimismo Contagioso
Chegamos ao final do 1º trimestre de 2024 da mesma forma que encerramos 2023: bolsas globais em alta e otimismo em relação aos ativos de risco em geral. O ETF de ações globais All Country World Index (ticker: ACWI) subiu 8,2% nos primeiros 3 meses do ano após uma alta de 11,2% no 4T23. Já o ETF do S&P 500 (ticker: SPY), acumulou uma alta de +10,4% no tri após 11,6% de valorização no 4T23.
Podemos atribuir a continuidade do bom momento dos ativos de risco a uma série de fatores, dentre os quais destacamos:
- A temporada de resultados corporativos nos EUA do 4º trimestre de 2023 acima das expectativas, marcando o segundo trimestre consecutivo de crescimento do lucro por ação do S&P 500;
- O otimismo com relação à economia dos EUA, cujas expectativas de crescimento do PIB, neste 1º trimestre, saíram de +0,5% no início do ano para +2,0% nas pesquisas mais recentes;
- A expectativa de cortes de juros pelo Fed que, embora tenham sido adiadas em alguns meses devido a números de inflação menos animadores, seguem sendo o cenário base da maior parte dos participantes do mercado. Além do Fed, outros bancos centrais do mundo desenvolvido já começam a antecipar ciclos de afrouxamento da política monetária ou já começaram, como no caso do Banço Central da Suíça, que reduziu as taxas básicas de 1,75% para 1,5% - o primeiro corte em 9 anos;
- O excesso de liquidez que ainda permeia o sistema financeiro global e;
- O otimismo com os temas microeconômicos com grande potencial de mexer os mercados como a inteligência artificial (setor de semicondutores subindo +28.6% no ano, com Nvidia subindo +82,5%) e drogas para diabetes/obesidade GLP-1 (Lilly +35% e Novo Nordisk +25% no ano)
Digno de nota, também, foi a rotação na liderança das performances ao longo de março, mostrando um “contágio” do otimismo visto nos temas predominantes nos últimos meses (AI, Big Techs, GLP-1). Regionalmente, mercados na Europa e alguns emergentes como México, África do Sul e Coréia do Sul tiveram valorizações acima do ACWI e do S&P 500. Já nos EUA, temas como dividendos e small caps e setores cíclicos como energia e materiais básicos, além de utilidades públicas de destacaram do lado positivo, enquanto os três setores que englobam as empresas de tecnologia (consumo discricionário, comunicações e tecnologia) ficaram aquém do S&P 500 no mês.
2. Made in China
Dando continuidade a um movimento iniciado no ano passado, com a proibição do uso de iPhones por funcionários públicos, o governo chinês implementou novas diretrizes que visam eliminar gradualmente microprocessadores produzidos por empresas americanas, como Intel e AMD, dos computadores e servidores do governo. As novas orientações para aquisição de equipamentos para o governo buscam priorizar alternativas domésticas ao sistema operacional Windows da Microsoft e a softwares de banco de dados estrangeiros. As agências governamentais receberam instruções para adquirir processadores e sistemas operacionais “seguros e confiáveis”, numa medida que faz parte dos esforços da China para impulsionar sua indústria doméstica de semicondutores e reduzir a dependência de tecnologia estrangeira, o que também abrange preocupações com segurança nacional.
Os Estados Unidos também têm implementado medidas para fortalecer sua própria indústria de semicondutores e reduzir a dependência da China e de Taiwan. Um exemplo claro foi a aprovação de CHIPS and Science Act de 2022 pelo governo Biden, em um esforço de apoiar a produção doméstica de semicondutores por meio de ajuda financeira e subsídios para a produção de chips avançados. Ademais, os Estados Unidos têm implementado sanções contra empresas como Huawei e SMIC e buscado restringir exportações direcionadas a equipamentos e tecnologias-chave de semicondutores para a China, numa tentativa de conter o avanço da rival nesse campo.
Apesar de no momento as orientações do governo chinês impactarem apenas compras realizadas por agências governamentais, a medida pode ter repercussões para as vendas como um todo das companhias visadas. Atualmente, 15% e 27% das vendas da AMD e Intel são para o mercado chinês, respectivamente, incluindo vendas diretamente para consumidores finais, companhias e governo.
A medida não é a única notícia relacionada às tensões geopolíticas por avanços tecnológicos entre os países: ainda nessa semana, a China entrou com uma ação na Organização Mundial do Comércio (OMC) contra a Lei de Redução da Inflação dos Estados Unidos, alegando que a lei é discriminatória e distorce a concorrência justa. O governo chinês utilizará o mecanismo de solução de disputas da OMC para contestar os subsídios para veículos elétricos, segundo o Ministério do Comércio da China. As regras em questão exigem que os veículos usem peças de regiões específicas para se qualificarem para os subsídios, excluindo produtos provenientes da China, entre outros países.
Nem tudo é conflito: nessa semana, o presidente chinês, Xi Jinping, se reuniu com CEOs dos Estados Unidos e afirmou que a economia da China ainda tem perspectivas “brilhantes” de crescimento. Ele reiterou o compromisso do governo chinês em aprovar reformas econômicas e afirmou que a abertura do país irá continuar. A reunião ocorre em um momento em que a China busca retomar a confiança dos investidores estrangeiros em sua economia, especialmente após a queda dos investimentos externos diretos em 2023 e atividade econômica doméstica ainda em recuperação. Os representantes das empresas americanas presentes na reunião demonstraram uma visão mais positiva em relação ao mercado chinês.
O FXI, ETF representativo das grandes empresas chinesas, terminou a semana em alta de 1,6%.
3. 130% Cacau
Às vésperas da Páscoa, é de se esperar um aumento sazonal de preços de doces, afinal, o feriado é tradicionalmente marcado pelo consumo dos ovos de chocolate. Neste ano, porém, um outro fator tem contribuído para a alta dos preços. A doença viral swollen shoot (CSSV), que afeta o cacau e o El Niño, fenômeno climático que provoca ondas de calor em diversas regiões no mundo, têm sido responsáveis por uma queda significativa na produção de cacau da África do Oeste, levando os preços do futuro da commodity de US$ 4.196 no início de 2024 para US$ 9.741 por tonelada, uma alta de 132% no ano, e 275% desde o início de 2023.
A fruta originária da América do Sul hoje tem cerca de 70% de sua produção concentrada na África do Oeste, sendo 44% da produção mundial localizada apenas na Costa do Marfim. A fase inicial do processamento dos grãos de cacau, em que é realizada a fermentação do grão para sua transformação em manteiga, licor e pó de cacau, ocorre próxima à região do plantio. Daí deriva o principal entrave à cadeia produtiva: as fábricas de processamento não estão sendo capazes de realizar a compra dos grãos de cacau devido aos preços que mais que dobraram.
Algumas processadoras afirmaram que interromperam a compra de novos grãos, e o processamento já ocorre com base de consumo do estoque. Grandes empresas globais de trading também enfrentam dificuldades para adquirir o cacau e encerrar posições vendidas para fins de hedge (proteção contra queda do preço), uma vez que a alta dos preços elevou o custo da operação e das margens necessárias. Fundos de investimento que atuaram como contraparte e compraram os futuros são os principais beneficiários da alta dos preços da commodity. O mercado se encaminha para um quarto ano consecutivo de déficit de cacau, e com isso, um repasse da alta de preços para o consumidor final se tornou inevitável.
O mercado, geralmente fortemente regulado em suas fases iniciais pelos governos da Costa do Marfim e de Gana, passa por um estresse devido à escassez de oferta. Comerciantes locais têm pagado um prêmio sobre os preços acordados antecipadamente para garantir o fornecimento, e revendem a preços mais elevados para os compradores globais que possuem contratos com grandes marcas, gerando escassez para as fábricas locais de processamento e um aumento de preços generalizado ao longo da cadeia devido à corrida pelos grãos. Adicionalmente, os governos dos dois principais produtores da região instituíram um limite para a entrega física de cacau a cada vencimento de contrato, que está programado para ser reduzido progressivamente ao longo do ano (de 75 mil toneladas em maio até 25 mil toneladas em dezembro).
A Organização Internacional do Cacau (ICCO) espera que a produção global de cacau caia 10,9% nesta safra, para 4,45 milhões de toneladas, e estima que o descompasso entre oferta e demanda deixará o mercado com um déficit de cerca de 374 mil toneladas, acima das 74 mil registradas no ano passado. De acordo com a organização, o mercado não passa por quatro anos consecutivos de déficit de cacau desde a década de 1960. A inflação de produtos de chocolate ultrapassa os 10% desde o início do ano nos Estados Unidos e 15% no Reino Unido, fenômeno que também é observado em outros países ao redor do mundo.
Para além do cacau, o açúcar, outra importante componente do preço do chocolate para o consumidor final, acumula alta de 9% em 2024. Mondelez, uma das principais produtoras globais de chocolate, identificou o aumento de custos de ingredientes como açúcar e cacau como um dos principais desafios para o ano. A fabricante Hershey’s também já alertou investidores para o impacto da disrupção da oferta no potencial de crescimento da companhia em 2024, e não descarta a possibilidade de novos aumentos de preços, que têm sido cada vez menos aceitos pelos consumidores.
O El Niño é responsável por uma onda de calor e mudança dos padrões de chuva na África do Oeste. O aumento das temperaturas e desmatamento têm contribuído para o aumento da reprodução de cochonilhas, vetores de transmissão do swollen shoot, doença que reduz a produção de cacau e mata uma planta afetada em cerca de três anos. A crise atual no mercado da commodity tem impactado estoques globais, que não devem ser recompostos tão cedo à medida que novas regulações, notoriamente da União Europeia, entram em vigor para banir grãos provenientes de regiões desmatadas.
A elevação das temperaturas médias a nível global é uma ameaça considerável para a produtividade agrícola e segurança alimentar nos anos vindouros, e especialistas em cacau alertam que o pior ano para a produção da commodity ainda está por vir, considerando a tendência climática.
4. Europa x Big Tech: Ninguém regula a América?
A União Europeia segue avançando em direção à maior regulação do mercado digital, e as grandes empresas de tecnologia são o principal alvo do Digital Markets Act (DMA), uma legislação inovadora destinada a limitar o poder de mercado dessas plataformas "guardiãs" (gatekeepers), que são vistas como controladoras de pontos-chave do acesso ao mercado digital. O ato estabelece uma série de obrigações e proibições para garantir a concorrência justa e a escolha do consumidor.
Nesta semana, o bloco europeu iniciou uma investigação sobre três dessas empresas: Apple, Alphabet (controladora do Google) e Meta Platforms (dona do Facebook e Instagram).
A Apple está sob escrutínio por uma possível violação das regras do DMA que estabelecem que as empresas devem informar aos clientes sobre opções alternativas de lojas de aplicativos, além de examinar se a Apple está dificultando a remoção de aplicativos próprios e troca de configurações padrão dos aparelhos para beneficiar seus próprios programas. Essa investigação vem poucas semanas após uma multa substancial de EUR 1,84 bilhão por regras injustas no segmento de streaming de músicas.
A Alphabet, por sua vez, também está sendo investigada pelo direcionamento a sua loja de aplicativos, Google Play, em aparelhos que rodam em Android e pelo favorecimento de resultados em pesquisas no Google. Ao dar tratamento preferencial aos seus próprios serviços, como o Google Shopping, Google Flights e o Google Hotels, que poderia ser uma violação das disposições do DMA.
Já a Meta precisa fornecer mais detalhes sobre seu modelo de “pay or consent” (pagar ou consentir) no qual oferece aos usuários a escolha entre pagar uma subscrição pelos seus serviços ou “vender” seus dados pessoais para que a empresa possa fazer publicidade direcionada. Essa discussão sobre direitos de propriedade de dados, suplementar aos direitos de privacidade, tem ganhado relevância em diversos países, inclusive no Brasil, e pode representar um mercado de centenas de bilhões de dólares.
Com multas previstas em até 10% das receitas globais, essas investigações baseadas no DMA representam um grande risco potencial para as Big Tech. Além disso, do outro lado do Atlântico, nos EUA, existe um movimento para maior regulação dessas empresas. Nesta semana, o governador da Florida, Ron DeSantis, sancionou uma lei dificultando o acesso de menores de idade às redes sociais no estado que pode servir de exemplo a outros estados ou mesmo ser a base de uma legislação federal.
5. Truth Social: A hora da verdade
As ações da Trump Media & Technology Group (TMTG) fizeram sua estreia na bolsa de valores nesta semana após a fusão da Digital World Acquisition Corp (DWAC) com a companhia. A TMTG é a controladora da rede social Truth Digital, criada pelo ex-presidente dos EUA, Donald Trump, em resposta ao seu banimento das outras redes mais tradicionais, como Facebook e Twitter (agora X), após os eventos de 6 de janeiro de 2021.
A DWAC era uma empresa de aquisição com propósito específico (SPAC - Special Purpose Acquisition Company – na sigla em inglês) que é um veículo usado para levantar fundos e acelerar o processo de abertura de capital sem precisar passar por todos os trâmites de um IPO. Porém, demorou 2 anos e meio para conseguir aprovar a fusão com a TMTG pois enfrentou diversos processos e acusações ao longo dos meses que sucederam sua criação, em outubro de 2021.
Com a finalização do processo de fusão na sexta-feira, dia 22/03, a DWAC passa a se chamar, oficialmente, Trump Media & Technology Group e o símbolo das suas ações deixam de ser DWAC e as ações passar a negociar com o ticker DJT (iniciais de Donald John Trump). A empresa não divulga dados de usuários ativos, mas as estimativas variam entre 500 mil a 5 milhões, uma pequena fração dos 3 bilhões do Facebook ou 2 bilhões do TikTok.
Apesar disso, o negócio mostrou-se um sucesso para Trump, após a valorização expressiva na semana (+67,7%) o valor de mercado da TMTG ultrapassou os US$ 8 bilhões e a participação do ex-presidente, estimada em 60%, tem um valor de mercado aproximado de quase US$ 5 bi.
Embora haja uma série de restrições para a venda imediata das suas ações, o aumento de patrimônio chega num momento crucial para Trump. Em meio a uma campanha eleitoral, o ex-presidente arrecadou menos que seu oponente, Joe Biden, em contribuições (US$ 155mi x 74mi) e enfrenta diversos processos judiciais, os quais são custosos e requerem, muitas vezes, o pagamento de fianças milionárias às cortes.
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