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Sumário
- No Brasil, com os dados de atividade econômica piores do que o esperado em março e abril, ficou mais claro que o choque negativo na atividade ao longo do primeiro semestre será considerável. Por isso, revisamos o PIB de 2020 de -1,9% para -6,0% e mantivemos o crescimento em 2,5% para 2021, apesar de reconhecermos que a velocidade da retomada dependerá do sucesso no combate ao vírus e da efetividade das políticas públicas adotadas no curto prazo.
- Diante do cenário de forte contração na atividade e desaceleração da inflação (projeção de IPCA revisada para apenas 0,7% em 2020), acreditamos que a Selic será reduzida para 2,25% a.a. em 2020 e elevada gradualmente a partir do 4º trimestre de 2021 para 3,00%.
- Em meio à materialização de grande parte dos riscos internos e externos à recuperação econômica brasileira, nossa estimativa para o câmbio no final de 2020 passou de R$/US$ 4,70 para R$/US$ 5,50. Para 2021, também revisamos a nossa projeção de R$/US$ 4,60 para R$/US$ 5,50.
- Por fim, existe uma preocupação relevante com a trajetória de casos e mortes causadas pelo Covid-19 no Brasil. Nossa curva ainda não parece dar indícios de achatamento e algumas cidades têm decretado lockdown em maio após a sobrecarga no sistema de saúde. A pressão pela reabertura está aumentando em diversas cidades e o risco de descontrole da situação não pode ser descartado.
A materialização dos riscos
Em nossas últimas revisões de cenário, pontuamos alguns elementos que poderiam representar fontes de riscos à recuperação econômica brasileira. Do lado externo, enxergávamos a possibilidade de agravamento da pandemia e do consequente aumento da incerteza global, e do lado doméstico, víamos que i) as medidas fiscais anunciadas para fazer frente aos efeitos do COVID-19 poderiam ser limitadas em alcance, que ii) o quadro de tensão política poderia deteriorar ainda mais a confiança dos consumidores e empresários, e que iii) a pressão por uma implementação de restrição parcial poderia agravar o quadro econômico e fiscal brasileiro.
Em relação ao cenário externo, tivemos a confirmação de que o grau de retração econômica tem sido maior do que o esperado. O PIB do 1T20 das principais economias do globo surpreenderam negativamente e confirmaram esse entendimento. Exceção à regra, o PIB da China caiu menos do que era previsto pelo mercado. Essa boa notícia, no entanto, não foi suficiente para compensar os fracos números de Estados Unidos e Europa. Assim, a deterioração mais pronunciada das condições econômicas das principais economias do mundo segue trazendo viés negativo para os nossos números.
No lado doméstico, as medidas fiscais anunciadas pelo governo, apesar de apontarem na direção correta, mostraram-se mais limitadas em alcance e tempestividade. A título de exemplo, o desembolso do voucher mensal (aprox. R$ 98 bilhões em 3 meses) teve uma implementação menos tempestiva, o saque do PIS/Pasep (aproximadamente R$ 20 bilhões) através dos fundos do FGTS ainda encontra-se em fase de implementação e está prevista para ocorrer no começo de junho e a antecipação da 2ª parcela do 13º salário de aposentados e pensionistas do INSS, a despeito do debate desse grupo poder ser classificado como grupo vulnerável, também ocorrerá em junho.
O risco político também se materializou. Desde a nossa última revisão de cenário, o Brasil testemunhou a demissão de dois ministros (Saúde e Justiça) e a escalada do conflito do governo federal com governos locais. Além disso, especulou-se que a saída do ministro da economia, Paulo Guedes, poderia acontecer depois do lançamento do esboço do programa Pró-Brasil (plano de recuperação econômica pós-pandemia baseado em gastos públicos) sem a presença de nenhum integrante da equipe econômica. Assim, a polarização política volta a crescer e a impactar ainda mais a confiança de empresários e consumidores. Esse contexto coloca o Brasil na contramão do mundo.
A revisão do cenário econômico
No Brasil, o processo de recuperação tende a ser mais lento do que o observado nas principais economias. A atividade sofre um forte choque negativo e a expectativa para a inflação dos próximos meses é de deflação significativa. O elevado grau de incerteza sobre todas as variáveis implica uma constante revisão do cenário, de tal forma que as informações de curto prazo têm peso relevante.
Com os dados de atividade dos meses de março e abril, ficou mais claro que o choque negativo na atividade ao longo do primeiro semestre será considerável. Revisamos o PIB de 2020 de -1,9% para -6,0%, reconhecendo que os riscos pontuados na primeira seção seguem no radar apesar de já terem se materializado de forma significativa. Para 2021 mantivemos o crescimento em 2,5%, apesar de reforçarmos que a velocidade da retomada dependerá do sucesso no combate ao vírus e da efetividade das políticas públicas adotadas no curto prazo.
Na inflação, a piora na atividade levou nossa projeção para o IPCA de 2020 de 2,5% para apenas 0,7%, bem abaixo do limite inferior da meta do Banco Central e com considerável desaceleração do núcleo de inflação. Mesmo com a depreciação de quase 40% do real contra o dólar no ano, observamos intensa deflação de bens duráveis e semiduráveis, provavelmente com as empresas varejistas realizando liquidações após o colapso da demanda e pela necessidade de “fazerem caixa”. Essa demanda não retornará tão cedo, conforme aponta a Sondagem do Consumidor de abril da FGV:
Nesse cenário, o Banco Central adotou uma postura mais estimulativa na última reunião e reduziu a taxa Selic em 0,75% para 3,0% a.a., sinalizando a possibilidade de um corte adicional na reunião de junho. Acreditamos que a Selic será reduzida para 2,25% a.a. (outro corte de 0,75%) e, apesar de o Comitê sinalizar que o próximo corte deva ser o último, reconhecemos a razoável possibilidade de que estímulos adicionais sejam considerados dada a complexidade do cenário. Para 2021, a Selic deverá permanecer praticamente estável durante todo o ano, sendo elevada para 3,0% a.a. apenas no 4º trimestre.
Ademais, nossa estimativa para câmbio no final de 2020 passou de 4,70 para 5,50 reais por dólar. A situação fiscal do país requer bastante atenção, conforme o Banco Central ressaltou no comunicado da última decisão. A pandemia deverá fazer com que o déficit primário de 2020 supere os 10% do PIB, provocando forte elevação da dívida bruta (aprox. 90%). No entanto, é necessário ressaltar que até o momento, boa parte dos gastos com a pandemia ficaram restritos a 2020 e o cenário de taxa de juros mais baixa terá contribuição relevante para manter a trajetória sustentável da dívida bruta, ainda que em patamar elevado.
Entendemos que a forte depreciação do real para algo entre 5,5 – 6,0 R$/US$ já precifica boa parte dessa deterioração do cenário. Em uma perspectiva histórica, a taxa de câmbio real efetiva está no mesmo patamar que o observado em 2004. No entanto, a situação macroeconômica, apesar de delicada, é muito mais sustentável do que 16 anos atrás.
Por fim, além do risco fiscal existe uma preocupação relevante com a trajetória de casos e mortes causadas pelo Covid-19 no Brasil. A opção inicial da maioria dos Estados foi por uma restrição parcial, na contramão da direção tomada por outras economias, que enxergaram no lockdown a melhor alternativa para conter o ritmo de contágio da doença logo no início. Interessante observar que os poucos Estados que tiveram desempenho positivo na Pesquisa Mensal de Serviços do mês de março (ou seja, as medidas de restrição não foram respeitadas ou não existiram), foram os primeiros a decretarem lockdown, pois o sistema de saúde estava colapsando (Amazonas e Maranhão, por exemplo).
Nossa curva ainda não parece dar indícios de achatamento (apenas em alguns locais), com mais cidades decretando lockdown no início de maio após a sobrecarga no sistema de saúde. A pressão social pela reabertura está aumentando em diversas cidades e o risco de descontrole da situação não pode ser descartado. Um dos piores cenários para a economia seria uma nova quarentena após uma reabertura malsucedida ou uma segunda onda de contágio. As próximas 4 semanas serão cruciais para determinar o sucesso ou fracasso do país no combate ao vírus.
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