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Zeina Latif: Primeiros sinais

Crédito é bom, pois permite às famílias anteciparem seu consumo e elevarem seu bem-estar. Desde que sem excessos, porém. Há sinais recentes no mercado de crédito que precisam, pois, ser monitorados.

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Crédito é bom, pois permite às famílias anteciparem seu consumo e elevarem seu bem-estar. Desde que sem excessos, porém. Há sinais recentes no mercado de crédito que precisam, pois, ser monitorados.

O crédito ao consumidor cresce de forma robusta. As novas concessões subiram 14% nos últimos 12 meses encerrados em outubro. O endividamento dos indivíduos atingiu 45% da sua renda anual, um patamar comparável aos do pré-crise, que eram elevados.

O crescimento do estoque do crédito para pessoa física, que atingiu o recorde de 27,5% do PIB, demanda atenção, pois a cifra atingida está acima da tendência histórica da série. Esse diferencial, denominado “hiato do crédito”, é uma variável importante a ser monitorada, pois é apontada na literatura internacional como um alerta robusto de futuros problemas na saúde do sistema bancário.

A preocupação aqui não é com os bancos, que estão sólidos, inclusive pelo rigor regulatório do Banco Central. A questão levantada são as implicações do crédito aquecido na condução da política monetária e na vida das famílias. O endividamento excessivo (ou hiato positivo) guarda elevada correlação com o aumento da inadimplência adiante, depois de 2 a 3 trimestres.

Outro indicador que serve de alerta é o comprometimento da renda mensal dos indivíduos com o pagamento da dívida (principal e juros). Ele voltou a subir, atingindo 20,6% em setembro ante 19,8% há um ano. Sua elevação significa restrições crescentes de liquidez dos consumidores, o que eleva o risco de inadimplência. O ciclo de queda da inadimplência concluiu-se e agora dá sinais de reversão.

A inadimplência bancária da PF exibe elevação, ainda que modesta (de 3,25% em dezembro de 2018 para 3,53% em outubro último), segundo o BC. O movimento é puxado pela inadimplência no cartão de crédito parcelado e no cheque especial. Convém monitorar se vão contaminar as demais categorias de crédito.

As dívidas negativadas aumentaram 7,8% em agosto na variação anual, de acordo com a Serasa Experian, puxadas não só pelas dívidas com bancos/cartão, mas também pelas contas de consumo (água, luz, gás). Nada bom.

O porcentual dos chamados ativos problemáticos no sistema financeiro – soma de inadimplência, reestruturações e risco elevado – cresceu ligeiramente ao longo do primeiro semestre para 6,7%, segundo o BC. O patamar mantém-se baixo. No entanto, uma medida alternativa de ativos problemáticos, que mede o risco de cada “safra” de devedores (e não do estoque total de crédito), retomou uma trajetória firme de alta, colocando o indicador nas máximas históricas da série iniciada em dezembro de 2014.

A deterioração do mercado de crédito parece precoce à luz de uma recuperação da economia que mal começou. A explicação está na lenta melhora do mercado de trabalho, gerando baixo crescimento da massa salarial (1,4% nos últimos 12 meses). A dúvida é se esses sinais, por ora incipientes, tendem a piorar. Já discutimos neste espaço que a geração de vagas seguirá tímida. Se a avaliação estiver correta, isso implicará continuidade da piora dos indicadores de crédito.

Preocupa o fato de o aumento da inadimplência partir de um patamar que não é baixo, pelo menos não para os consumidores. A inadimplência é baixa para os bancos, pois representa parcela ainda modesta da carteira total de crédito. Porém, ela pesa no orçamento dos indivíduos. A razão entre dívidas em atraso por mais de 15 dias e a renda dos indivíduos manteve-se elevada desde o fim da recessão e já ensaia tendência de elevação. A crise econômica deixou marcas de difícil superação.

No contexto descrito acima, é compreensível o tom mais cauteloso do BC em relação às perspectivas da política monetária. A autoridade monetária reconhece que há incertezas quanto à resposta da economia aos juros básicos em patamares inéditos.

Excessos precisam ser evitados. Crescimento sustentado depende da saúde financeira das famílias. 

Fonte: artigo replicado do Estadão.

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