Colaboração: Mariana Vergueiro
Sumário Executivo
Os preços das ações das empresas de varejo descolaram dos fundamentos… As varejistas da nossa cobertura tiveram forte desempenho no acumulado do ano, com as ações subindo 33% na média contra 23% para o Ibovespa. No entanto, as estimativas de lucro para os próximos 12 meses cresceram em menor proporção (em média 7%), reflexo do ambiente ainda fraco (embora com melhora gradual) para o consumo.
… levando os múltiplos a níveis historicamente altos. Com isso, vimos o múltiplo P/L médio de 12 meses do setor (com base nas estimativas do Bloomberg) alcançar 23,5x atualmente (excluindo Magazine Luiza) – 20% acima da média dos últimos cinco anos. Isso ocorreu principalmente devido ao crescente otimismo dos investidores em relação à (tão esperada) recuperação econômica brasileira. Além disso, acrescenta-se o fato de que os segmentos mais cíclicos de consumo (como varejo e habitação, por exemplo) são os primeiros a se beneficiarem da melhora do momento macroeconômico.
Estamos otimistas em relação a 2020 e esperamos que os múltiplos do setor permaneçam elevados. Ainda estamos no início da recuperação econômica do país, que tem sido impulsionada principalmente pelo consumo. Porém, acreditamos que esse cenário ainda não esteja refletido nos fundamentos das empresas. Por isso, esperamos que a combinação da melhora no ambiente econômico e no crescimento de lucro das companhias mantenha os múltiplos do setor em patamares elevados.
O cenário beneficia a todos, mas não da mesma forma. Embora o setor de varejo como um todo deva se beneficiar da recuperação de consumo, acreditamos que nem todos as ações da nossa cobertura devam se beneficiar da mesma forma. Particularmente, preferimos exposição a (i) segmentos com produtos de preço-médio mais alto – principalmente bens duráveis, em função do ciclo de crédito ao consumidor mais favorável; e (ii) setores cujo crescimento de vendas em termos reais teve um desempenho inferior ao do setor de varejo em geral – principalmente bens duráveis e de vestuário.
Selecionando nossas ações preferidas para 2020. Neste relatório, incorporamos os resultados do terceiro trimestre de 2019 (3T19) e novas estimativas para os papéis da nossa cobertura. Dessa forma, atualizamos nossas teses de investimento e compartilhamos nossas preferências dentro do setor de varejo às vésperas do início de 2020. Nossas recomendações se baseiam em três temas principais (que detalhamos abaixo):
- (1) Recuperação econômica: posicionamento em nomes com maior exposição à melhora no ambiente de consumo, como VVAR3 – Via Varejo (Compra) e LREN3 – Lojas Renner (Compra);
- (2) Dinâmica de resultados favorável: empresas com maior potencial de crescimento de lucro, em função da maior alavancagem operacional e/ou da expansão de lojas, como VIVA3 – Vivara (Compra) e LREN3 – Lojas Renner (Compra)
- (3) Valor: múltiplos descontados que oferecem risco-retorno assimétrico, como PCAR4 – Grupo Pão de Açúcar (Compra).
Rebaixando a recomendação de B2W. Neste relatório, também rebaixamos a nossa recomendação de BTOW3 – B2W para Neutro (contra Compra anteriormente). As ações subiram 31% no acumulado do ano (contra 23% para o Ibovespa). Assim, com o múltiplo EV / GMV (Vendas Online) de 0,8x para 2021e, vemos um potencial de valorização das ações limitado nos preços atuais e acreditamos que a realização dos lucros faz sentido nesse momento.
Por fim, mantemos recomendação de Neutro para LAME4 – Lojas Americanas, MGLU3 – Magazine Luiza e CRFB3 – Carrefour Brasil.
Observação: Para uma melhor experiência de leitura, recomendamos a utilização do índice de conteúdos à esquerda da tela na versão para computador, ou na parte inferior na versão mobile.
O autor gostaria de agradecer ao Marco Nardini por toda a sua ajuda na elaboração deste relatório.
Tese de Investimento por Empresa
O Atual Cenário para Consumo no Brasil
O ambiente de consumo no Brasil não mostrou uma recuperação significativa nos últimos dois anos. O crescimento das vendas de varejo em termos reais permaneceu praticamente estável, com crescimento próximo de 1 dígito baixo desde o início de 2017 (em média 2%), após recuperação desde seu patamar mais baixo em 2016. E, apesar de termos observado evolução positiva nos principais indicadores atrelados ao consumo, a melhora até agora tem sido mais gradual do que a maioria dos investidores e empresas esperava.
Crédito ao consumidor tem sido o principal destaque até agora. O crédito para consumidores cresceu +15% na comparação anual nos últimos três meses, acelerando em comparação ao crescimento de +12% no 1T19 e de +8% em 2018. Essa evolução ocorreu apesar da estabilidade no patamar de juros cobrado para esse público, que está em 52% ao ano desde meados de 2018. Com isso, o nível de endividamento das famílias apresentou leve aumento, passando de 23,0% em dezembro de 2017 para 25,7% em julho de 2019. Esperamos que o ciclo favorável de crédito ao consumidor e aumento da alavancagem beneficiem as vendas de segmentos de varejo com produtos de preço-médio mais alto.
Bens duráveis e vestuário são as duas categorias com maior defasagem durante a crise. Desde 2010, as vendas de bens duráveis e de vestuário caem, em média, 1% ao ano em termos reais. Para comparação, o setor de varejo como um todo cresceu 1% na média no mesmo período. Com isso, os volumes de ambos os segmentos não retornaram ao patamar observado antes de 2011. Além disso, de acordo com a pesquisa POF (Pesquisa de Orçamento Familiar), a participação das categorias de vestuário e eletrodomésticos dentro dos gastos mensais familiares caíram para 4,3% e 1,7% em 2017, respectivamente (contra 5,5% e 2,6% em 2009). Por isso, esses são os segmentos nos quais vemos maior demanda reprimida.
Rumo ao 4T19. De forma lenta, mas otimistas… O fato de que a recuperação econômica do país deve ser impulsionada principalmente pelo setor privado, e não por estímulo público, é a principal razão por trás da lentidão vista até agora. Portanto, à medida que os investimentos corporativos maturem, especialmente após o progresso observado na agenda de reformas do governo, esperamos que o crescimento econômico acelere e se torne mais sustentável desta vez. A equipe econômica da XP espera uma recuperação de curto prazo impulsionada pelo consumo, levando a um crescimento de +1,6% do PIB já no 4T19.
… com o potencial de melhora em 2020. A combinação de melhora da atividade econômica, redução gradual do desemprego (embora ainda elevado) e inflação controlada em patamares baixos deve contribuir para a aceleração mais significativa do crescimento dos salários em termos reais em 2020. Como resultado, esperamos que o fortalecimento do poder de compra do consumidor contribua para a melhora nos índices de confiança, beneficiando o setor de varejo como um todo.
Como esse cenário impactou os varejistas sob nossa cobertura?
Os nomes de consumo cíclicos (por exemplo, varejo e habitação) são os primeiros a se beneficiar do ciclo de recuperação econômica. Portanto, o otimismo dos investidores fez com que os preços das ações do setor de varejo descolassem dos fundamentos. Para referência, as ações de varejo da nossa cobertura acumulam alta de 33% na média em 2019 contra 23% para o Ibovespa.
Com isso, vimos o múltiplo P/L médio de 12 meses do setor (com base nas estimativas do Bloomberg) atingindo 23,5x atualmente (excluindo Magazine Luiza) – 20% acima da média dos últimos cinco anos. Olhando para frente, esperamos que os múltiplos permaneçam em patamares elevados, em função do contexto de melhora da atividade econômica e dinâmica positiva de crescimento de lucro das companhias.
Cenário para 2020: Três Temas Principais
Abaixo compartilhamos nossas preferências no setor de varejo para 2020, que foram baseadas nos seguintes temas:
Tema #1: Recuperação econômica: um cenário que beneficia a todas, mas não da mesma forma (Compra para VVAR3 e LREN3).
Embora o setor de varejo como um todo deva se beneficiar da recuperação de consumo, acreditamos que nem todas as ações da nossa cobertura devam se beneficiar da mesma forma.
Sendo assim, as ações que estão relativamente melhor posicionadas para acelerar o crescimento de vendas são aquelas que possuem pelo menos um dos seguintes atributos: (i) segmentos com produtos de preço-médio mais alto – principalmente bens duráveis – em função do ciclo de crédito favorável; e (ii) setores cujo desempenho de vendas em termos reais foi inferior ao setor de varejo como um todo – principalmente bens duráveis e vestuário.
Nossas recomendações: Via Varejo (Compra) e Lojas Renner (Compra). Ambas as empresas são líderes em seus respectivos campos de atuação (duráveis e vestuário), com fortes vantagens competitivas (valor da marca, oferta de crédito, escala e produto – principalmente para a Renner) em segmentos do varejo com maior demanda reprimida.
Portanto, consideramos que as duas empresas estão bem posicionadas para se beneficiar da recuperação de consumo e, por esse motivo, esperamos que ambas apresentem crescimento de vendas acima da média do setor nos próximos anos (veja imagem abaixo).
Outras ações: Também acreditamos que a Magazine Luiza (Neutro) está bem posicionada nesse cenário, por possuir características semelhantes às mencionadas anteriormente – além de sua robusta estratégia multicanal tanto na categoria de duráveis quanto de vestuário, com a aquisição da Netshoes. No entanto, mantemos a recomendação de Neutro por não enxergar potencial significativo de alta das ações nos preços atuais.
Tema #2: Dinâmica de resultados favorável: maior potencial de crescimento de lucro (Compra para VIVA3 e LREN3).
A dinâmica de crescimento de vendas para o setor de varejo deve favorecer o crescimento de lucro das empresas em 2020. Estamos apenas no início de um período único para o ambiente de consumo, com inflação controlada, juros baixos e retomada da atividade econômica.
Além disso, o fato de que, durante a crise, muitas empresas fizeram um esforço adicional para diminuir a estrutura de despesas faz com que as companhias estejam mais eficientes, de maneira geral. Como exemplo, as despesas (SG&A) da Via Varejo permaneceram praticamente estáveis como porcentagem de vendas entre 2017-2019, apesar do fraco desempenho de vendas.
Dessa forma, as empresas que acreditamos estar relativamente melhor posicionadas para acelerar o crescimento de lucro são aquelas com maior participação de despesas fixas e, consequentemente, maior potencial de alavancagem operacional. Além disso, acreditamos que as empresas com um plano de expansão de lojas mais robusto também devem apresentar um crescimento mais forte no relativo.
Abaixo apresentamos uma análise do potencial impacto nas margens para cada 5% de incremento nas vendas. Para esse cálculo, usamos nossas estimativas da participação de despesas fixas em cada uma das companhias:
Nossas recomendações: Vivara (Compra) e Lojas Renner (Compra). Ambas as empresas têm uma parcela relativamente maior de despesas fixas e, portanto, estão bem posicionadas no quesito alavancagem operacional. Estimamos uma expansão média da margem EBITDA de 125bp e 85bp por ano entre 2021-2022, para Renner e Vivara, respectivamente. Além disso, o plano de expansão de lojas de ambas as empresas deve contribuir significativamente para o crescimento de vendas. Esperamos que a Renner e a Vivara reportem contribuição média anual de novo espaço de 4% e 13%, respectivamente, para o mesmo período. Como resultado, acreditamos que o crescimento de lucro de ambas será superior ao desempenho das outras empresas de varejo da nossa cobertura (veja imagem abaixo).
Tema #3: Valor: múltiplos descontados, com risco-retorno assimétrico (Compra para PCAR4).
Com o setor negociando a um múltiplo P/L médio de 12 meses de 23,5x (20% acima da média dos últimos 5 anos), concentramos nossas preferências nas ações com maior potencial de crescimento de lucro. No entanto, ainda vemos algumas ações em que múltiplos e crescimento estão descolados.
Nossa recomendação: Grupo Pão de Açúcar (Compra). As ações do GPA caíram 20% desde o pico anual alcançado no final de abril, reflexo principalmente do processo de reestruturação societária da empresa. Por meio dele, o GPA deve adquirir o Grupo Éxito – a maior varejista de alimentos da Colômbia – também controlado pelo Casino.
Dessa forma, embora alguns argumentos contra o mérito dessa transação sejam válidos, devido a sinergias limitadas, acreditamos que o atual desconto de múltiplo é excessivo. Em nossas estimativas, as ações do GPA atualmente negociam a 14,2x P/L para 2020e (contra a média de 23,5x para o setor e 16,9x para o Carrefour Brasil). Considerando apenas a operação brasileira do GPA (assumindo uma participação no Éxito de 96%), o múltiplo é de 11,6x.
Outras ações: Também acreditamos que a Via Varejo (Compra) ofereça um risco-retorno assimétrico, embora com um risco maior, dado o processo de recuperação da empresa. O lucro da companhia está comprimido, após um período de erros operacionais que levaram a um fraco desempenho de vendas. Porém, acreditamos que a nova diretoria da Via Varejo tem focado nas alavancas e incentivos corretos para retomar o crescimento.
Esse motivo, somado à melhora econômica, nos faz acreditar no potencial de alta superior das ações da Via Varejo. Ainda assim ressaltamos que a recuperação dos resultados deve ser gradual e repleta de desafios.
Uma Palavra sobre E-commerce
Os maiores nomes de e-commerce da nossa cobertura (B2W e Magalu) não estão entre as nossas ações preferidas do setor para 2020. No entanto, esperamos que a migração do canal offline para online continue sendo um tema relevante no próximo ano. Esperamos que o setor de e-commerce brasileiro dobre de tamanho nos próximos 4 anos, alcançando vendas de R$ 180 bilhões em 2023 e penetração de 10% no varejo total (contra 7% atualmente).
Esperamos um crescimento forte. Estimamos um crescimento médio anual de 19% para o e-commerce brasileiro entre 2019-2023. Nesse ambiente, esperamos que os produtos de preço-médio mais baixo (as categorias que pertencem a “segunda onda” de crescimento online, como vestuário e cosméticos) ganhem relevância e impulsionem o crescimento. Para referência, mais de 20% das vendas de vestuário nos Estados Unidos são feitas online, o que se compara a 5% no Brasil. Este deve ser um veículo de crescimento relevante para empresas como Lojas Renner e Magazine Luiza (após a aquisição da Netshoes / Zattini).
Processo de consolidação deve continuar. O mercado de e-commerce brasileiro já é bastante concentrado, com as quatro principais empresas somando 77% de participação de mercado em 2019 (contra 60% dois anos atrás). Entretanto, esperamos que o setor se consolide ainda mais. O progresso alcançado pelas maiores plataformas de varejo online do país em termos de variedade de produtos, logística, escala e experiência do cliente aumentou a diferença entre elas e o resto do mercado. Nas nossas estimativas, a participação de mercado das 4 gigantes do e-commerce (Mercado Livre, B2W, Magazine Luiza e Via Varejo) deve alcançar 87% em 2023e.
E a concorrência internacional? Vemos risco limitado no curto prazo. As vantagens competitivas das principais empresas de e-commerce que mencionamos acima são difíceis de serem replicadas por um competidor internacional. Para referência, cerca de 70% de todos os pedidos de estoque próprio (1P) da Magazine Luiza são entregues em até 48 horas. No caso da LET’s, operada pela B2W e Lojas Americanas, essa proporção é de mais de 50%. Além disso, o mercado de varejo online brasileiro já apresenta um alto nível de consolidação, o que cria uma barreira de entrada significativa para empresas como Alibaba ou Amazon.
Se você ainda não tem conta na XP Investimentos, abra a sua!