A Lei nº 15.042, que estabelece as bases para a criação de um mercado regulado de carbono no Brasil, foi publicada no último dia 12 de dezembro no Diário Oficial da União. Como funciona esse mercado e o que muda a partir de agora? Veja abaixo algumas perguntas e respostas e entenda mais sobre o assunto:
O que é o crédito de carbono?
O crédito de carbono surgiu a partir do Protocolo de Kyoto, em 1997, o primeiro tratado internacional que estabelece o compromisso de diversos países com questões ambientais, em particular visando a diminuição dos gases de efeito estufa. Em 2015, esse protocolo foi substituído pelo Acordo de Paris, um documento assinado por quase todos os países do mundo, incluindo o Brasil.
Sendo um marco para a diplomacia climática global, todos os 196 países signatários do Acordo apresentaram metas de redução de gases estufa na tentativa de limitar o aumento da temperatura global bem abaixo de 2ºC acima dos níveis pré-industriais, desdobrando o compromisso para agentes do mercado. De forma geral, essas metas ficaram conhecidas como Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês), sendo que o Acordo de Paris prevê que os países apresentem novas NDCs a cada cinco anos.
Os créditos auxiliam países ou empresas a atingirem suas metas de emissão. Um projeto, como a substituição da frota de veículos movidos a combustíveis fósseis por carros elétricos ou mesmo o reflorestamento, podem gerar créditos que auxiliam na redução de emissão de gases poluentes.
Quanto vale um crédito de carbono?
A redução de uma tonelada de dióxido de carbono (CO2) pode ser convertida em um crédito de carbono, utilizando-se o conceito de carbono equivalente (a cada tonelada de CO2 não emitida à atmosfera ou reduzida gera um crédito de carbono). Com isso, podemos dizer que os créditos de carbono representam, basicamente, uma “não emissão” de gases do efeito estufa (GEE) na atmosfera, ou uma redução na quantidade esperada de emissões.
Qual a diferença entre os mercados regulado e voluntário?
Nos mercados regulados, os governos determinam uma meta para setores específicos e para cada ente regulado (que pode ser empresa ou instalação). Sendo assim, cada agente tem uma meta de emissão de CO2 que, se não for cumprida, torna-se obrigatória a comprar créditos para compensar esse excedente. Do outro lado, àqueles que emitem menos que o valor estabelecido podem comercializar esse saldo em excesso. Lá fora, esse sistema de comércio é chamado de cap and trade.
Já no mercado voluntário, a compra de créditos de carbono é feita de formula voluntária, visando alcançar objetivos de sustentabilidade ou neutralidade de carbono.
Quanto movimenta o mercado de créditos de carbono?
Segundo a Verra, maior certificadora global de crédito de carbono, esse mercado movimenta por volta de US$ 2 bilhões por ano, com 500 milhões de créditos transacionados globalmente. Contudo, ele compensa apenas 1% das emissões globais atualmente, o que mostra grande oportunidade adiante. Desse total de créditos, cerca de 75% são originados por (i) projetos de fontes renováveis de energia (principalmente na Ásia); e (ii) REDD+, que contempla projetos de redução de emissões de desmatamento e degradação florestal, além de conservação e aumento de estoques de carbono florestal e manejo sustentável das florestas (com projetos oriundos principalmente da América do Sul, com destaque para Brasil, Peru e Colômbia).
Existe mercado regulado de carbono no Brasil?
Em 11 de dezembro, o presidente Lula sancionou o projeto de lei nº 182/2024 - sem vetos -, transformando em lei o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), que estabelece as principais diretrizes para um sistema nacional de comércio de emissões sob o regime de cap and trade.
Por que a regulamentação do mercado de carbono do país é importante?
Na nossa visão, regular esse mercado é fundamental para promover um sistema de comércio eficiente e confiável e aumentar o nível de confiança dos investidores ao criar um ambiente regulatório mais previsível, além de reforçar o compromisso do país com a agenda climática.
O que é a Lei nº 15.042?
A Lei nº 15.042 institui o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE) e altera diversas leis relacionadas ao meio ambiente e à regulação de emissões. Com a lei, o Brasil entra para o seleto grupo de países que possuem um sistema regulado de precificação de carbono.
Qual é o objetivo do SBCE?
O SBCE tem como finalidade regular as emissões de gases de efeito estufa no Brasil, promovendo a comercialização de ativos que representem emissões, reduções ou remoções de GEE.
O que são CBEs e CRVEs?
Cota Brasileira de Emissões (CBE): ativo que representa o direito de emitir uma tonelada de CO2 equivalente.
Certificado de Redução ou Remoção Verificada de Emissões (CRVE): ativo que comprova a redução ou remoção de uma tonelada de CO2 equivalente.
Como funcionará o mercado de carbono no Brasil?
Segundo o governo, no mercado regulado, cerca de cinco mil empresas do setor industrial terão metas de descarbonização e poderão cumpri-las aquirindo Cotas Brasileiras de Emissão (CBEs), que são créditos de carbono gerados pelo novo Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). Além disso, do mercado voluntário, participarão empresas não obrigadas a reduzir emissões, mas interessadas em atingir suas metas corporativas de descarbonização.
Como funcionará a governança do SBCE?
O SBCE será gerido por um órgão gestor, que deverá: (i) emitir e distribuir CBEs; (ii) propor e implementar o Plano de Alocação; (iii) credenciar a metodologia de Certificado de Redução ou Remoção Verificada de Emissões (CRVE); e (iv) apurar infrações e aplicar sanções. Além dele, o SBCE contará com um órgão superior e deliberativo, conhecido como Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM) e um órgão consultivo, o Comitê Técnico Consultivo Permanente, reunindo representantes dos entes federativos e da sociedade civil.
Quais são as penalidades para infrações?
Com a regulamentação, o Brasil passa a ter um sistema obrigatório e fiscalizado, ou seja: o governo poderá aplicar sanções para empresas que não se adequarem às normas estabelecidas. As penalidades podem incluir advertências, multas e até a suspensão de atividades, dependendo da gravidade da infração. Conforme previsto na lei, a multa pode chegar em até 3% do faturamento bruto das companhias, ou 4% em caso de reincidência.
Quando a lei entra em vigor?
A Lei nº 15.042 entra em vigor na data de sua publicação, que ocorreu em 12 de dezembro de 2024.
O que muda com a Lei nº 15.042?
Após a sanção da Lei nº 15.042, começa agora a contagem regressiva para a implementação de um mercado regulado de carbono no país. Durante a fase 1, planejada para começar no início de 2025 e durar 12 meses (postergável por mais 12), esperamos dois desenvolvimentos importantes:
- definições de governança, com decisões pendentes sobre liderança e composição dos órgãos consultivos e de supervisão; e
- cálculo dos limites de emissões, sendo necessário esclarecer se os tetos estipulados (10 mil e 25 mil toneladas de dióxido de carbono equivalente anualmente) serão aplicados a grupos econômicos (empresas) ou instalações individuais (por exemplo, fábricas).
De modo geral, consideramos essa fase inicial como fundamental para mitigar os riscos de execução e reforçar a confiança do mercado, dando o tom para o sucesso das próximas fases.
Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a medida impulsionará as exportações brasileiras. “Esse tema é essencial para o sucesso econômico do país porque a falta de atenção à preservação dos biomas pode servir de pretexto para a elevação de barreiras [comerciais] contra produtos brasileiros”, afirmou, durante sua participação na plenária do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável, em 12 de dezembro, em Brasília.
Ainda de acordo com o governo, projeções do Banco Mundial indicam que o sistema tem potencial para impulsionar o crescimento do PIB, o que se reflete em aumento da renda da população e, principalmente, no cumprimento do objetivo central da política: a redução das emissões de gases de efeito estufa.
Quais setores devem ser mais impactados?
O mercado regulado brasileiro será focado em emissões. Entre as maiores fontes de emissões diretas de gases de efeito estufa, cinco indústrias merecem destaque: energia; indústria (siderurgia, petroquímica e mineração); construção civil; transporte e logística; e resíduos e saneamento.
Quais são as fases de implementação do SBCE?
De acordo com o governo, serão 5 fases:
Fase 1 (12 a 24 meses): regulamentação inicial, criação do órgão gestor e definição dos setores que serão regulados. Nesse momento, serão definidos os detalhes operacionais do sistema e as bases jurídicas para o funcionamento do mercado.
Fase 2 (12 meses): operacionalização do sistema de monitoramento, relato e verificação (MRV) das emissões. As empresas terão de reportar suas emissões de forma padronizada, criando uma base de dados que permitirá a fiscalização do mercado.
Fase 3 (24 meses): início da obrigação de apresentar relatórios de emissões e planos de monitoramento, o que fornecerá os dados necessários para o primeiro Plano Nacional de Alocação (PNA).
Fase 4 (12 meses): início do primeiro ciclo de alocação de CBEs e operacionalização dos primeiros leilões. Será publicado o PNA, que definirá as regras de distribuição de cotas e o volume inicial disponível para o mercado. Nessa fase, as primeiras CBEs começam a ser emitidas e negociadas, com a participação das empresas reguladas.
Fase 5: implementação plena do mercado, com o primeiro leilão de CBEs e o início do mercado secundário, que permitirá negociações entre empresas.
Quais as metas para redução de GEE?
Durante a COP29, no Azerbaijão, o Brasil submeteu sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês) atualizada à Convenção do Clima, reafirmando metas de redução de GEE para 2035, com corte entre 59% e 67% em relação a 2005. Segundo o governo, o plano inclui todos os setores da economia e projeta uma redução absoluta de emissões entre 1,05 e 0,85 gigatoneladas de CO2. A meta faz parte de uma estratégia mais ampla para reposicionar o Brasil no cenário climático global, recuperando a ambição inicial assumida no Acordo de Paris. O Brasil tem o objetivo de zerar as emissões de gases de efeito estufa até 2050.
Por que olhar para investimentos ESG?
Os temas ESG, mesmo considerando a natureza inerente de longo prazo, estão cada vez mais associados a novas oportunidades de investimento. Muitas empresas fizeram grandes promessas climáticas no início dos anos 2020, definindo o ano de 2030 como prazo comum, o que marca esta década como fundamental para a ação climática.
Confira cinco principais tendências para ficar de olho em 2025
Fontes: Research XP; Agência Gov; Agência Senado.
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