Colaboração: Pedro Fagundes
Sumário Executivo
Iniciamos cobertura das ações da C&A Brasil – CEAB3 – com recomendação de Compra e preço-alvo de R$23,0/ação para final de 2020. Com base no fechamento de mercado de 4 de dezembro, vemos potencial de 29% de alta das ações.
A C&A é a terceira maior empresa de varejo de moda no Brasil, com uma marca amplamente conhecida e 283 lojas espalhadas pelo país.
Passado o período de reestruturação interna durante 2016-2018 e a conclusão da oferta primária de ações (IPO), a companhia está pronta para voltar a investir de forma significativa na operação.
O plano de expansão de lojas deve contribuir para a aceleração do crescimento, enquanto a atualização do modelo logístico e lançamento da operação de crédito própria devem fortalecer os pilares estratégicos da C&A e reduzir a defasagem de investimento em relação aos concorrentes.
Crescimento acelerando, a múltiplos atrativos… Esperamos que o plano de abertura de 165 novas lojas nos próximos cinco anos sustente um crescimento robusto por mais tempo. Estimamos um crescimento médio anual de +12% nas vendas, +9% de EBITDA e +18% de lucro líquido para os próximos três anos, com sólidos retornos (ROIC próximo de 13-14%).
Além disso, no nosso relatório “As Ações de Varejo Preferidas para 2020”, publicado em 26 de Novembro, um dos temas que destacamos para o próximo ano é o de recuperação econômica. Nossa preferência é para os segmentos cujo desempenho de vendas em termos reais tenha sido inferior ao do setor como um todo nos últimos anos – que é o caso de vestuário. A Renner (LREN3, Compra) é uma das ações que recomendamos nesse contexto, mas a C&A também deve se beneficiar desse cenário e negocia a múltiplos mais descontados, com P/L de 20,6x para 2020 (contra 28,6x para a concorrente, em função de seu sólido histórico de execução).
… mas não sem riscos. Apesar de reconhecermos a necessidade da atualização do modelo logístico com a implementação do Push & Pull e da ampliação da oferta de crédito, ambas as iniciativas são complexas e requerem forte capacidade de execução por parte da diretoria. Para 2020 em específico vemos poucos riscos, já que a implementação desses projetos será longa e gradual.
Por fim, destacamos o potencial da operação de cosméticos da C&A, que por enquanto está em fase de testes em apenas algumas lojas, e que não incorporamos nas nossas estimativas.
Observação: Para uma melhor experiência de leitura, recomendamos a utilização do índice de conteúdos à esquerda da tela na versão para computador, ou na parte inferior na versão mobile.
A autora gostaria de agradecer ao Marco Nardini por toda a sua ajuda na elaboração deste relatório.
Saiba mais sobre a C&A Brasil
A C&A é uma das maiores redes de vestuário do Brasil, com vendas brutas anuais de R$ 6,6 bilhões (2018) e participação de 3,5% no mercado. A companhia vende roupas e calçados femininos, masculinos e infantis (84% das vendas) assim como os itens categorizados como fashiontronics (16% das vendas), que incluem celulares e eletrônicos. Esses produtos podem ser encontrados nas 283 lojas que a C&A possui (sendo 85% localizadas em shoppings) e na plataforma de e-commerce (com participação de 1,9%).
A C&A é uma marca global com atuação em 24 países através de mais de 1.800 lojas, com destaque para Europa (Alemanha, Espanha, Portugal, entre outros), China e México. A marca foi fundada em 1841 pelos irmãos holandeses Clemens e August e a entrada no Brasil ocorreu em 1976. Desde então, a unidade brasileira se transformou numa espécie de laboratório de inovações para o grupo. Ao contrário das operações internacionais, no Brasil a percepção da marca está associada ao conceito de moda fast fashion para mulheres de classe social B-C.
Entendendo o histórico da operação brasileira. Para melhor compreensão do histórico de desempenho da C&A e das motivações para acelerar o investimento na operação brasileira a partir de agora, dividimos os últimos 10 anos da companhia em três fases:
(1) 2009-2014: Esse foi um momento de êxito para a companhia. A forte expansão de lojas (foram 110 aberturas no período) combinado ao ambiente macroeconômico favorável contribuíram para um bom desempenho de vendas e para que a C&A mantivesse a posição de liderança no setor em número de lojas.
(2) 2014-2016: A crise econômica no país afetou o setor de varejo como um todo. Somado a isso, a C&A passou por um período de instabilidade de sistemas com a implementação do sistema Oracle RMS e de desafio nas coleções, pela elevada participação de importados e mudança de tendência de compra das consumidoras. Por isso, o desempenho de vendas da companhia ficou abaixo do mercado e a rentabilidade caiu. Particularmente em 2015, houve uma mudança na diretoria da empresa e o Paulo Correa (então diretor comercial) assumiu como novo presidente.
(3) 2016-2018: A decisão nesse momento foi olhar para dentro de casa e reestruturar a companhia. Assim, os investimentos em grandes projetos foram temporariamente suspensos. Além disso, o ritmo de abertura de lojas reduziu e, inclusive, muitas lojas cujo retorno estava abaixo do esperado foram fechadas (31 unidades foram descontinuadas entre 2015-2017). Focando na melhora da rentabilidade, a C&A diminuiu a participação dos importados (de 50% em 2015 para 25-30% atualmente), revisou o mix de produtos dando preferência àqueles de maior margem e também fez um aumento seletivo de preços em certas categorias.
Passada a reestruturação interna, uma nova estratégia. Na nossa visão, a diretoria da C&A fez um bom trabalho nesse processo de reestruturação. Um indicador que evidencia isso é a melhora de quase 6 pontos percentuais na margem bruta em 2017 e a manutenção desse patamar nos anos seguintes. Além disso, de acordo com a empresa, a dispersão de desempenho entre lojas reduziu após os fechamentos e atualmente 80% das lojas tem margem de contribuição acima de 15%.
Apesar da estratégia acertada, o período de reestruturação também trouxe outra consequência: o distanciamento entre a C&A e seus concorrentes, não apenas no desempenho de vendas, mas em investimentos na operação. Capitalizadas, a Riachuelo e (principalmente) a Renner continuaram a investir nas operações apesar do cenário econômico desafiador, mantendo o plano de expansão de lojas e executando grandes projetos, como o de logística.
É por isso que acreditamos que a operação da C&A está, em alguns aspectos, defasada em relação aos competidores e com amplo potencial de melhora. E é essa a história de crescimento da companhia para os próximos anos: acelerar os investimentos em áreas estratégicas (como lojas, logística e serviços financeiros) para voltar a crescer de forma mais consistente.
Detalhes sobre a Oferta Primária de Ações (IPO)
Em 24 de outubro de 2019, a C&A Brasil concluiu sua oferta primária de ações (IPO). O preço definido foi de R$ 16,50/ação e o processo movimentou mais de R$ 1,6 bilhão (sendo 50% – equivalente a R$ 814 milhões – de recursos primários, ou seja, direcionados à própria empresa). As ações CEAB3 estão listadas no Novo Mercado, o segmento com os níveis de governança corporativa mais elevados.
Cerca de 90% dos recursos arrecadados na oferta serão usados para pagar o empréstimo (intercompany) que a C&A Brasil detém com o Grupo Cofra (controlador). No final do 3T19, essa dívida somava R$ 807 milhões, com prazos de vencimento entre abril e dezembro de 2023 e taxa média de juros de 10,25% ao ano. Os 10% restantes dos recursos levantados serão usados para suportar o plano de expansão de lojas da companhia.
Os acionistas vendedores na oferta secundária são todos membros da COFRA, que pertence a cerca de cinquenta descendentes da família holandesa Brenninkmeijer que fundou a C&A. Além das operações da marca C&A no Brasil e no mundo, a COFRA também detém participações imobiliárias e empresas de investimento.
Com relação ao grupo de controle, anteriormente os principais meios de distribuição dos recursos gerados na C&A Brasil ao acionista controlador eram dividendos, pagamento de juros sobre o empréstimo entre partes relacionadas (intercompany) e royalties pelo uso da marca C&A (de 1% das vendas de vestuário). Com a conclusão da oferta, a partir de 2020 o pagamento de royalties será encerrado, assim como o pagamento de juros, já que a dívida com o controlador será quitada. Dessa forma, a geração de caixa da C&A Brasil será usada para investimentos na operação (detalhados abaixo) e distribuição de dividendos.
Mercado de Vestuário no Brasil
Em 2018, o mercado de vestuário e calçados no Brasil reportou R$ 139 bilhões em vendas, de acordo com a Euromonitor. Nos últimos 5 anos, o crescimento médio anual foi de apenas +1,8% e, conforme destacamos em nosso relatório (“As Ações de Varejo Preferidas para 2020“), vestuário é uma das categorias que apresentou maior defasagem de crescimento ao longo da crise.
Com a retomada mais consistente da economia esperada para 2020, acreditamos que o segmento de vestuário será um dos principais beneficiados em função da demanda reprimida e volumes ainda pressionados.
Esse é um mercado fragmentado, em que as cinco maiores marcas de vestuário do segmento (que coincidem com as cinco maiores varejistas de vestuário listadas na Bolsa) detém participação de 16%. A C&A é a #3 em termos de participação (com 3,5%), atrás da Renner e da Riachuelo (com 5,9% e 3,7%, respectivamente).
Os principais competidores da C&A
Levando em consideração o público-alvo, oferta de produtos e tamanho das lojas, acreditamos que a Riachuelo (Guararapes) e Renner são as principais competidoras da C&A. Apesar do posicionamento similar, ressaltamos que a Renner consegue capturar uma consumidora de classe social mais elevada e que, no geral, seus produtos têm preços-médio 10-15% acima da C&A e da Riachuelo.
Renner (LREN3): A Renner é a maior varejista de moda do país, com participação de mercado de 5,9%, vendas anuais de R$ 8,5 bilhões (apenas a operação de varejo) e quase 580 lojas (sendo 368 da marca Renner). As principais marcas da companhia são: Renner (que compete com a C&A), Camicado (segmento de casa e decoração) e Youcom (especializada em moda jovem). Além da operação de lojas, a Renner conta com uma operação de produtos financeiros chamada Realize, que oferece cartão de crédito e empréstimo pessoal. Em operação desde 1922, foi em 2005 que a Renner, após a saída do acionista controlador J.C. Penney, tornou-se uma das primeiras corporações no Brasil, com cerca de 100% de suas ações em circulação no mercado.
Riachuelo – Guararapes (GUAR3): A Guararapes é um dos maiores grupos de varejo de moda, com participação no mercado de vestuário de 3,7%, vendas anuais de R$ 5,1 bilhões (apenas a operação de varejo) e quase 320 lojas. A companhia opera através de um modelo integrado, que envolve os negócios de varejo (com a marca Riachuelo), indústria têxtil (Guararapes) e financeira (Midway). O grupo foi fundado em 1956 com sede em Natal (Rio Grande do Norte) pelos irmãos Nevaldo e Newton Rocha. A Guararapes também é listada na Bolsa de Valores brasileira e atualmente possui cerca de 17% de suas ações em circulação no mercado, enquanto as demais são detidas por membros da família fundadora.
Apesar de reconhecermos que o tema da entrada de marcas internacionais é relevante para o segmento, ressaltamos que a presença delas no Brasil ainda é reduzida. Como exemplo, a marca Forever 21, presente em território brasileiro desde 2014, detém apenas 30 lojas e vem apresentando dificuldades na operação. Além disso, a varejista inglesa Top Shop também apresentou dificuldades e fechou suas lojas no Brasil em 2017.
E-commerce: cenário atual e como a C&A está posicionada
Cerca de 5% das vendas de vestuário e calçados no Brasil são feitas online, enquanto a média global é de 11% e em alguns países desenvolvidos, como os Estados Unidos, a participação chega a 20%. Apesar dessa penetração ser inferior a outros segmentos, como eletrônicos, acreditamos que são exatamente as categorias de preço-médio mais baixo (como vestuário e cosméticos) que devem ganhar relevância nos próximos anos e contribuir para a chamada “segunda onda” de crescimento online no país.
No universo das varejistas de vestuário listadas na Bolsa, a penetração online ainda é reduzida. As duas principais concorrentes da C&A – Renner e Riachuelo – detém aproximadamente 4% e 1%, respectivamente, das vendas feitas através de suas plataformas de e-commerce. Apesar disso, o tema e-commerce vem ganhando relevância e tem sido uma das prioridades de investimento.
Particularmente para a C&A, estimamos que a penetração online aumente dos 2% atualmente para 6% em 2025e em função dos investimentos anuais de R$ 45-50 milhões que serão destinados ao canal. Dentre eles, destacamos a readequação do aplicativo, melhora da plataforma e atualização dos sistemas.
As iniciativas multi-canais da C&A também tem avançado, sendo que a opção “clique e retira” (em que o cliente compra online e pode retirar o produto na loja) já está disponível para todas as unidades e representa 20% das vendas do e-commerce. Já o envio do produto a partir da loja para a casa do cliente (ship from store), que reduz o tempo e custo de entrega, está restrito apenas a algumas lojas, mas deve ser expandido ao longo de 2020.
Aceleração dos Investimentos
Passado o período de reestruturação interna, a C&A está pronta para retomar seus investimentos em três principais frentes, que discutimos em mais detalhes abaixo. São elas: #1 retomada da expansão de lojas; #2 atualização logística com a implementação do Push & Pull; e #3 operação de crédito própria.
Ressaltamos que as três iniciativas são pilares estratégicos importantes para uma varejista de vestuário de moda e que já estão em estágio avançado e/ou consolidadas nos dois principais competidores – Renner e Riachuelo. Dessa forma, acreditamos que, além de contribuírem para um crescimento mais robusto, esses investimentos devem reduzir a defasagem que o período de reestruturação interna causou entre a C&A e seus concorrentes.
#1 Retomada da Expansão de Lojas
Para os próximos cinco anos, a C&A planeja abrir 165 novas lojas, sendo que as 45 lojas previstas para 2020-2021 já estão mapeadas e em fase de negociação. Apesar da companhia possuir um formato de loja compacto (com área de vendas de até 1.000 m²) , as novas lojas terão 1.800 m² em média e devem se concentrar em shoppings.
Dos três focos de investimento, vemos a retomada da expansão de lojas como:
(i) principal vetor de crescimento nos próximos anos;
O efeito da maturação das novas lojas dentro do crescimento no conceito mesmas lojas (same-store-sales) é representativo no segmento de vestuário de moda, uma vez que a loja demora de 4-5 anos para maturar (ou seja, atingir 100% do seu potencial de vendas).
O fato da C&A ter reduzido de forma significativa a abertura de lojas a partir 2015, inclusive com fechamento bruto de mais de 30 lojas desde então, contribuiu (juntamente com outros fatores) para a desaceleração do crescimento no conceito mesmas lojas.
Nas nossas estimativas, incorporamos uma aceleração do crescimento no conceito mesmas lojas para C&A de +2,5% na média entre 2016-2018 para +8,3% entre 2019-2025e, que à primeira vista pode parecer agressiva.
Entretanto, cerca de 45% advém do efeito da maturação das novas lojas, de forma que o crescimento das lojas maduras que estimamos é, na realidade, próximo à inflação em 2019-2020 e acelera gradualmente a partir de 2021 com os efeitos da implementação do Push & Pull e da operação de crédito própria (que discutiremos em mais detalhes abaixo).
Além disso, estimamos contribuição anual média de +2,7% proveniente do novo espaço.
(ii) menos complexa no que se refere à execução.
O histórico de abertura de lojas tanto da C&A quanto dos competidores nos deixa mais confortáveis com relação à complexidade da retomada da expansão em relação às demais iniciativas.
Até 2015, a C&A era líder em número de lojas, mas perdeu o posto pela combinação de competidores capitalizados acelerando a expansão com o momento de reestruturação interna da companhia, que focou na reavaliação do parque atual de lojas e não em mais aberturas. Por esse motivo, vemos espaço para a C&A acelerar o ritmo de expansão e reduzir a distância em número de lojas em relação aos concorrentes, que hoje é de quase 90 lojas para Renner.
Além disso, analisando o histórico do número de aberturas líquidas por ano, as três empresas já entregaram no passado cerca de 30 novas lojas por ano (a Riachuelo, inclusive, chegou ao máximo de 45 lojas em um único ano). Sendo assim, estamos confortáveis com o ritmo de 25-30 novas lojas por ano projetados para a C&A.
Ainda nesse tema, realizamos uma análise proprietária avaliando o potencial para abertura de lojas da C&A nos shoppings existentes no Brasil. Para referência, nossa análise foi baseada nos dados divulgados pela Associação Brasileira de Shopping Centers (ABRASCE), através dos quais mapeamos a localização das lojas da Renner e da Riachuelo e comparamos com as da C&A.
Nossa conclusão é que existem 69 shoppings em que apenas a Renner está presente, 19 shoppings em que apenas a Riachuelo está presente e 65 shoppings em que tanto Renner quanto Riachuelo estão presentes, mas a C&A não.
Por esse motivo, acreditamos que esses são 153 shoppings em que a C&A poderia abrir uma loja, lembrando que o plano de expansão total inclui 165 novas lojas. Ressaltamos que na nossa análise excluímos o potencial de shoppings a serem inaugurados nos próximos anos (greenfields) e também os 220 shoppings que atualmente não possuem lojas de nenhuma das três marcas.
Dito isso, todo plano de expansão de lojas traz riscos implícitos. Particularmente no caso da C&A, vemos como principais riscos: (i) ausência de área disponível nos shoppings, dado que as lojas da C&A são grandes (média de 1.800 m²) e existem outras empresas com planos de expansão de lojas agressivo competindo pelo mesmo espaço (como Centauro e a própria Renner ou Riachuelo); e (ii) falta de incentivo por parte dos shoppings que já possuem uma Renner e/ou Riachuelo em trazer mais uma âncora de vestuário de moda para o seu portfólio de lojas e a qual custo de ocupação.
#2 Implementação do Push & Pull
Explicando o Sistema de Abastecimento Push & Pull
Na cadeia de fornecimento, o sistema tradicional de abastecimento de lojas é baseado no conceito push (em inglês, que significa “empurrar”). Nele a varejista, a partir de uma decisão interna, inicia a produção e planeja o abastecimento desses produtos para as lojas.
Já no modelo baseado no conceito pull (em inglês, que significa “puxar”), a varejista se baseia em quais produtos estão sendo mais vendidos nas lojas em tempo real para iniciar a produção e planejar o abastecimento. Portanto, essa versão leva em consideração a demanda atual por parte dos clientes e, dessa forma, garante maior assertividade na cadeia de fornecimento. Ou seja, garante que o produto certo, estará na loja certa e no momento correto.
Os efeitos da implementação de um modelo de abastecimento misto (Push & Pull) são: (1) mais vendas, já que o cliente vai encontrar o que procura nas lojas dado que a decisão de produção e abastecimento foi baseada nas suas próprias compras; e (2) menor necessidade de desconto e, consequentemente, melhor margem, pois reduz as chances de um produto que não está sendo bem aceito pelo consumidor estar nas lojas.
Atualmente, o abastecimento de produtos na C&A é feito por mini-pacotes (mini-pack), e não por unidades (SKU), e o modelo é 100% push (“empurra”). Os três centros de distribuição são cross-docking, ou seja, as mercadorias não ficam estocadas, apenas entram e imediatamente são enviadas para as lojas.
Essa é uma grande desvantagem competitiva da C&A em relação à Renner e à Riachuelo, por exemplo, que já fazem o abastecimento de lojas por unidades (SKU) e com um modelo misto de Push & Pull. Esse fator é muito relevante principalmente porque a velocidade das mudanças de tendência no segmento de moda fast fashion é alta, fazendo com que a assertividade de abastecimento se torne ainda mais relevante.
É por esse motivo que um dos focos de investimento da C&A será em logística, com a implementação do sistema de abastecimento Push & Pull. Ressaltamos, no entanto, a complexidade dessa iniciativa e a necessidade de elevados investimentos (estimamos R$ 320 milhões até 2022e), que incluem expansão e atualização dos centros de distribuição atuais com novos sorters e sistemas, novo centro de distribuição no Nordeste e implementação do RFID.
Ciente desses desafios, a diretoria da companhia planeja uma implementação gradual (o que vemos com bons olhos), de forma que o projeto estará 100% finalizado apenas em 2024.
Renner: Estudo de Caso
Dentro do nosso universo de cobertura, a análise da implementação do processo de Push & Pull na Renner traz leituras importantes para o caso da C&A. Na apresentação do Investor Day de 2017, a gestão da companhia compartilhou alguns indicadores para evidenciar o benefício desse projeto.
Dentre eles, destacamos: (i) a redução em 50% no nível de ruptura (ou seja, o cliente ir buscar um item em específico na loja e não encontrar o produto) no primeiro semestre de 2017; e (ii) aumento de 7 pontos percentuais no crescimento das vendas. Ambas as métricas foram mensuradas através da avaliação de dois grupos de controle de itens básicos. Notamos que na época, a participação do Push & Pull no abastecimento de produtos era de 40% (contra 60% atualmente).
Sendo assim, para a C&A preferimos ser mais conservadores e não incorporamos mudanças no patamar da margem bruta de vestuário nas nossas estimativas em função do push & pull. No entanto, para o crescimento de vendas no conceito mesmas lojas, assumimos impacto positivo médio de 0,9 ponto percentual por ano entre 2021-2024e devido a esse projeto.
#3 Operação de Crédito Própria
A maneira como a operação de serviços financeiros da C&A está estruturada é uma das principais desvantagens da companhia em relação aos concorrentes e acreditamos que explica (ainda que parcialmente) o desempenho de vendas mais fraco.
Hoje a companhia atua em parceria exclusiva com a Bradescard (do Bradesco), oferecendo aos clientes serviços financeiros (como cartão de crédito). De acordo com o contrato (firmado em 2009 com vigência de 20 anos), a C&A é responsável pela parte comercial, ou seja, por ofertar os produtos através de área dedicada à operação dentro das lojas. Já as demais atividades (incluindo aprovação, limite de crédito, definição das taxas cobradas, etc) são de responsabilidade do Bradesco.
Com políticas de concessão de crédito mais conservadoras por parte do Bradesco para essa operação, a penetração dos cartões bandeirado (co-branded) e próprio (private label) nas vendas da C&A é de apenas 23% e se compara a 44% e 45%, respectivamente, para Renner e Riachuelo. Atualmente, as taxas de aprovação do Bradesco estão próximas de 20%, o que significa que 4 de cada 5 clientes da C&A que aplicam para receber os cartões são recusados.
A oferta de serviços financeiros pelas varejistas de vestuário é um fator que contribui de forma significativa para as vendas, principalmente para as companhias cujo público-alvo é uma consumidora de classe social B-C que, no geral, é mais sensível ao acesso à crédito.
Um pouco do contexto histórico dos serviços financeiros na C&A. Anteriormente, a C&A oferecia serviços financeiros aos seus clientes de forma independente através do Banco Ibi, que foi criado em 2001. No entanto, a operação foi vendida ao Bradesco em junho de 2009 por R$ 1,4 bilhão e, nesse momento, a parceria entre Bradescard e C&A que mencionamos acima foi firmada. De acordo com notícias da época, nos anos de 2007 e 2008 a qualidade de crédito do Banco Ibi deteriorou com incremento na inadimplência e queda nos retornos, o que levou a Fitch Ratings a rebaixar a classificação de risco do banco.
A oportunidade do lançamento do cartão próprio digital (digital private label). Ciente das limitações da parceria atual com o Bradesco, a diretoria da C&A planeja lançar um cartão próprio digital de forma independente visando incrementar o acesso ao crédito para seus clientes. Em termos de cronograma, o processo de estruturação desse produto está previsto para acontecer ao longo do primeiro semestre de 2020.
Apesar de vermos o potencial dessa operação, ressaltamos dois riscos relacionados a essa iniciativa. Primeiro, é preciso a aprovação do Bradesco para que a C&A dê inicio a essa operação, em função da cláusula de exclusividade. Caso o Bradesco não aprove, a C&A tem a opção de recomprar a operação de serviços financeiros como um todo, mediante pagamento de multa estabelecida no contrato. O segundo é o risco inerente a uma operação de serviços financeiros, em que a qualidade dos créditos concedidos é fator importante na rentabilidade.
Tendo em vista a incerteza com relação à aprovação do Bradesco, por enquanto preferimos tratar o lançamento do cartão próprio digital como uma opcionalidade não incorporada nas nossas estimativas.
Estimativas e Cálculo do Preço-Alvo
Nosso preço-alvo de R$23/ação para CEAB3 deriva da combinação dos métodos de fluxo de caixa descontado e múltiplo (cada um com peso de 50%). Além disso, incluímos o valor presente do crédito de ICMS referente à exclusão do mesmo da base do PIS/Cofins e saldo de prejuízo fiscal acumulado. Veja abaixo os detalhes de ambas metodologias de avaliação:
Fluxo de Caixa descontado (R$20,2/ação). Baseado em um Fluxo de Caixa para os acionistas (FCFE) de 10 anos, utilizando um custo de capital próprio de 12,0% e uma taxa de crescimento de longo prazo de 5,5%.
Múltiplos (R$20,1/ação). Com base em um múltiplo de P/L de 21x para 12 meses, aplicado à nossa estimativa de lucro líquido para 2021.
Valor presente do crédito de ICMS e saldo de prejuízo fiscal acumulado (R$2,9/ação). Assumindo a conversão de ambos os montantes para caixa em aproximadamente quatro anos (concentrados nos três primeiros anos).
Para mais detalhes, acesse aqui a nossa tese de investimento completa.
Com relação às nossas projeções:
- Receita: estimamos crescimento médio anual de +12% para 2019-2022e, impulsionado pela abertura de novas lojas (contribuição média do novo espaço por ano de +2,7%) e crescimento no conceito mesmas lojas de +8,3%.
- EBITDA: estimamos crescimento médio anual de 9,4% para 2019-2022e. Nesse mesmo período, projetamos margem bruta praticamente estável e pressão de 1 ponto percentual de margem EBITDA em 2020, seguida de recuperação gradual.
- Lucro Líquido: estimamos crescimento médio anual de 18% para 2019-2022e, impulsionado pelo crescimento de EBITDA mencionado acima e menores despesas financeiras com o pagamento do empréstimo com a COFRA.
Estrutura da Diretoria da C&A Brasil
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