Resumo
- O espaço para cortes de juros nos EUA está se consolidando, e o ajuste pode começar antes mesmo do nosso cenário (em dezembro). Entretanto, os juros nas economias desenvolvidas devem permanecer elevados até a inflação convergir de forma sustentável à meta.
- No Brasil, continuamos a projetar que o PIB crescerá 2,2% em 2024 e 1,7% em 2025. O mercado de trabalho aquecido sustenta a demanda no curto prazo. Adiante, o cenário de juros altos por mais tempo tende a desacelerar o consumo e os investimentos.
- Projetamos déficit primário do governo central em 0,5% do PIB para 2024 e 0,7% para 2025. Os riscos do lado da despesa cresceram e demandam bloqueio de até R$ 16 bilhões no próximo relatório de avaliação bimestral, em julho. Nossa expectativa para as receitas segue abaixo do projetado pelo governo.
- A taxa de câmbio se depreciou mais do que os pares este ano, refletindo a piora na percepção de risco sobre a condução da política econômica. Projetamos agora 5,40 reais por dólar para o final de 2024 e 2025 (5,00 e 5,15 antes), assumindo que parte do incremento de prêmio de risco será permanente.
- Além do câmbio mais depreciado, outros determinantes (demanda aquecida, petróleo em alta) sugerem pressão adicional de inflação a partir do segundo semestre. Elevamos nossa projeção para a inflação (IPCA) de 3,7% para 3,8% em 2024, e de 4,0% para 4,3% em 2025.
- Mantivemos a projeção de taxa Selic estável em 10,50% até o final de 2025, com o Copom mirando a convergência da inflação à meta até 2026. A barra para subir juros, em nossa visão, é alta. Contudo, isso pode ocorrer se a taxa de câmbio se estabilizar significativamente acima do nosso cenário base, levando as projeções de IPCA do Copom para bem acima da meta.

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Editorial - Maior incerteza, maior prêmio de risco
O prêmio de risco sobre os ativos brasileiros aumentou significativamente nos últimos meses. O Real está 13% mais desavalorizado no acumulado do ano, um desempenho inferior ao da maioria de seus pares (ver gráfico abaixo). O mercado de juros futuros apreça mais de 2 p.p. de alta na taxa Selic até o final de 2025. O movimento é descolado da realidade? Na verdade, não.
No mês passado, escrevemos aqui que os números macro para 2024 estavam bem, mas algumas tendências, como o crescimento das despesas primárias e o aquecimento do mercado de trabalho exigiriam alguma reação da política econômica (“A conta vai fechar?” Brasil Macro Mensal, junho/24).
Para cumprir o arcabouço fiscal, estimamos que o governo precisaria bloquear cerca de 16 bilhões de reais em despesas discricionárias no segundo semestre. A sinalização do governo, no entanto, sugere um esforço menor. Alguma clareza aqui ajudaria a reduzir as incertezas e os prêmios de risco.
Na frente monetária, a crescente tensão entre o Banco Central e o Poder Executivo traz dúvidas sobre a independência da política monetária após o término do mandato do Presidente Roberto Campos Neto, em dezembro. Essa incerteza não se dissipará, mesmo com o Copom atuando tecnicamente no curto prazo.
Em nosso cenário base, vemos alguma reação das autoridades e, portanto, algum alívio na percepção de risco. Mas parte dos efeitos já observados tende a ser persistente. Assim, ajustamos nossa previsão de taxa de câmbio de 5,00 para 5,40 reais por dólar neste ano. Como consequência, elevamos nossa projeção de IPCA para 3,8% em 2024 (3,7% antes) e 4,3% em 2025 (4,0% antes).
Acreditamos que isso não será suficiente para que o Copom mude de rumo e inicie um ciclo de alta de juros. Vemos o Comitê mantendo a Selic no nível atual (restritivo) por um longo período, estendendo o horizonte de convergência até 2026.
No entanto, se o prêmio de risco continuar a aumentar e a taxa de câmbio se estabilizar em torno de (digamos) 5,80 reais por dólar ou acima, as projeções de inflação se afastarão significativamente da meta. Nessas circunstâncias, o Copom poderá optar por elevar os juros no segundo semestre.

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Pano de fundo global - Luz no fim do túnel
Francisco Nobre
Após dados quentes no primeiro trimestre nos EUA, indicadores recentes trouxeram alívio. Em relação ao mercado de trabalho, a geração líquida de empregos tem sido volátil, embora a tendência geral mostre desacelaração, com oferta e demanda por trabalhadores se reequilibrando. Em relação aos preços, índices de inflação apresentaram leituras mais benignas nos últimos dois meses. Destacamos que a abertura dos dados foi ainda mais encorajadora, dado que os grupos de serviços apresentaram surpresas baixistas, aliviando preocupações recentes sobre uma reaceleração nas dinâmicas inflacionárias. Isso deve influenciar a função de reação do Fed consideravelmente. Dito isso, indicadores econômicos permanecem um pouco mais fortes do que os níveis consistentes com o equilíbrio, e projetamos a inflação medida pelo índice core PCE encerrando o ano em 3,0%.


O Fed continua focado no quadro geral. A reunião do FOMC de junho veio com um tom mais duro desta vez. Em relação ao relatório de projeções do comitê, a mediana indicou apenas um corte de 0,25 p.p. em 2024, ante três no relatório anterior. Além disso, a coletiva de imprensa de Powell após a reunião sugere a intenção de manter os juros estáveis até que progresso adicional seja observado no processo de desinflação. Em nossa opinião, isso foi um desenvolvimento positivo, pois uma comunicação firme ajuda a manter as condições financeiras apertadas, aumentando as chances de conter a inflação.
Projetamos corte de juros em dezembro, mas pode ocorrer antes. Ainda pensamos que o risco de cortar juros muito cedo supera o risco de fazê-lo muito tarde, dado que a atividade econômica e o mercado de trabalho permanecem robustos, enquanto a inflação de serviços segue elevada. No entanto, reconhecemos as chances crescentes de corte de juros antes de dezembro. Haverá mais três rodadas de dados até a reunião de setembro e, se os indicadores continuarem fracos, o Fed pode encontrar espaço para iniciar o ciclo de flexibilização monetária. De qualquer forma, o espaço para começar o ciclo de cortes está finalmente se consolidando. Juros mais baixos nos EUA devem trazer alívio para ativos globais e reduzir a pressão sobre as moedas emergentes (tudo o mais constante).
Um início cauteloso para o ciclo de afrouxamento monetário na Europa. O BCE reduziu suas três taxas de juros de referência em 0,25 p.p., em linha com a nossa projeção realizada no fim do ciclo de aperto em setembro. Mas o banco central não quis se comprometer com seus próximos passos, sugerindo apenas que a política monetária permanecerá restritiva por um longo período. Em nossa visão, as condições para continuar com o ciclo de flexibilização deterioraram-se na margem, em meio a preocupações persistentes com salários elevados e possível pressão inflacionária (especialmente nos grupos de serviços), além das incertezas sobre os juros nos EUA. Os próximos passos dependerão da inflação de serviços, da evolução dos salários e do Fed.
Enquanto isso, no Reino Unido, a reunião de política monetária de junho revelou que o BoE provavelmente começará a cortar juros, apesar da surpresa altista na inflação de serviços. No entanto, como é o caso em todas as economias desenvolvidas, mais alívio será necessário para permitir a continuidade do afrouxamento da política monetária.
Portanto, em todos os casos tratados acima, a política monetária deve permanecer em território restritivo até que a inflação tenha convergido sustentavelmente para a meta.

A China continua dependente de estímulos para alcançar sua meta de crescimento de 5%. Em maio, os dados de atividade econômica foram mistos, tendo em vista a produção industrial mais fraca do que o esperado e vendas no varejo surpreendendo para cima, impulsionadas pelo período de férias locais. Enquanto isso, a leitura do PMI de junho sinalizou enfraquecimento adicional. Os indicadores mais recentes de atividade sugerem que a economia precisa de estímulos adicionais diante do risco contínuo de deflação, demanda persistentemente fraca, e prolongada recessão imobiliária. Os indicadores descritos foram divulgados antes do Terceiro Plenário de julho, durante o qual o Partido Comunista da China poderá lançar grandes mudanças para a política econômica.
Cenário Brasil - Copom: pausa para reavaliação
Atividade – Mercado de trabalho aquecido sustenta a demanda
Rodolfo Margato
Demanda interna segue firme em meio à expansão do emprego e da renda. Os principais indicadores do mercado de trabalho continuam a apresentar sinais positivos. Conforme divulgado na PNAD Contínua do IBGE, a taxa de desemprego atingiu 7% em maio (dados mensais e dessazonalizados), o menor nível desde 2014. Mais uma vez, destaque para a geração de ocupações formais. Enquanto isso, os salários reais estão em trajetória de alta desde o 3º trimestre de 2023 (crescimento acumulado de 4% no período), que não deve ser revertida no curto prazo. Desta forma, a renda real disponível às famílias deve crescer aproximadamente 6% em 2024, acima das projeções iniciais, reforçando o cenário favorável para o consumo.

Nossa projeção para o PIB de 2024 permanece em 2,2%. Como discutido em nosso último relatório mensal, a força do mercado de trabalho e a surpresa positiva com os resultados do PIB no 1º trimestre poderiam levar a uma revisão na expectativa de crescimento econômico este ano. No entanto, a tragédia climática no Rio Grande do Sul apagou esse viés de alta. Divulgações recentes de dados de atividade mostraram o impacto das enchentes, como por exemplo na produção industrial, que contraiu de forma disseminada em maio. Estimamos que o PIB tenha aumentado cerca de 0,5% no 2º trimestre em comparação ao trimestre anterior. Não fosse o impacto das enchentes, o ritmo de crescimento registrado no 1º trimestre (0,8%) poderia ser mantido ou até mesmo superado. O choque no Rio Grande do Sul deve reduzir a taxa de crescimento anual do PIB do Brasil em até 0,2 p.p., o que já considera os primeiros esforços de reconstrução do estado ao longo do segundo semestre.
Prevemos desaceleração em 2025 em meio à maior percepção de risco e condições financeiras apertadas. Continuamos a projetar expansão de 1,7% para o PIB do próximo ano, um pouco abaixo do potencial. A maior percepção de risco no ambiente econômico doméstico – sobretudo em relação à dinâmica das contas públicas e inflação – e o cenário de juros altos por mais tempo tendem a arrefecer a demanda ao longo de 2025, principalmente os investimentos e o consumo de bens duráveis.

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Contas Públicas – Despesas crescem e pressionam arcabouço fiscal
Tiago Sbardelotto
Despesas puxam déficit no curto prazo. Em maio, o governo central registrou déficit de R$ 61,0 bilhões, acima do verificado em 2023 (R$ 45,0 bilhões). Do lado da receita, houve crescimento de 9,0% em termos reais, puxado pelos ganhos extraordinários com a tributação de investimentos no exterior (R$ 7,1 bilhões). Este montante foi insuficiente para fazer frente ao alto volume de despesas no mês, que cresceram 14,0% em termos reais. A Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG), por sua vez, atingiu 76,8% do PIB, o maior patamar desde fevereiro de 2022.

Perspectiva de curto prazo levemente melhor. A elevação da taxa de câmbio (ver seção sobre Setor Externo) afeta positivamente a arrecadação tributária, em particular os impostos vinculados a importações e as compensações pela exploração de recursos naturais (royalties e participação especial de petróleo). Dessa forma, alteramos ligeiramente nossa projeção de déficit primário em 2024, de R$ 60,6 bilhões (0,5% do PIB) para R$ 54,5 bilhões (0,5% do PIB). Considerando-se as despesas extraordinárias relacionadas ao auxílio ao Rio Grande do Sul – que já atingiram a marca de R$ 23,4 bilhões –, o déficit deve chegar a R$ 77,9 bilhões (0,7% do PIB). Mas os custos de reconstrução estão apenas começando e podem levar o déficit a valores mais próximos a R$ 100 bilhões
(0,9% do PIB).

Crescimento das despesas pressiona arcabouço fiscal. Benefícios previdenciários e assistenciais continuam a apresentar crescimento muito acima da inflação. Avaliamos que existe uma subestimativa de aproximadamente R$ 20 bilhões em tais gastos, o que deve pressionar as despesas discricionárias. Do lado das receitas, continuamos com a avaliação de que a arrecadação com medidas relacionadas ao CARF, transações tributárias e mudança nas subvenções de ICMS estão bem aquém das estimativas iniciais, o que implica uma revisão na previsão para o restante do ano.
Pouca mudança em 2025. Houve melhora na margem do indicador de resultado primário para cálculo da meta (que exclui precatórios pagos além do sublimite constitucional), que deve chegar a um déficit de R$ 78,5 bilhões (0,6% do PIB) contra R$ 80,1 bilhões (0,7% do PIB) da projeção anterior. No entanto, em função de uma elevação das despesas com precatórios (de R$ 89 bilhões para R$ 103 bilhões), prevemos déficit de R$ 120,1 bilhões (1,0% do PIB) no indicador cheio do resultado primário.
Governos regionais devem dar contribuição positiva para o setor público. O déficit de R$ 1,1 bilhão em maio foi menor que o registrado no ano passado (R$ 6,8 bilhões), e negativamente influenciado pela aceleração de despesas em função do ciclo eleitoral. Continuamos com uma perspectiva positiva para estados e municípios neste ano, na esteira da recuperação da arrecadação de ICMS e de maiores transferências do governo federal. Com isso, estimamos déficits de R$ 61,9 bilhões em 2024 (0,5% do PIB) e R$ 95,9 bilhões em 2025 (0,8% do PIB) para o setor público consolidado.
Dívida pública continua com tendência de alta. Com juros altos por mais tempo – consequência indireta da política fiscal menos equilibrada – e uma composição com forte peso de títulos pós-fixados, o custo implícito da dívida deve continuar em patamar elevado por bastante tempo. Nossas projeções indicam que a razão entre a DBGG e o PIB deve atingir 77,2% em 2024 e 80,0% em 2025 (contra 77,3% e 80,1% da projeção anterior).

Contingenciamento e bloqueio em discussão. No próximo dia 22 de julho, o governo divulgará mais um relatório bimestral de avaliação de receitas e despesas primárias (RARDP). Esse documento deverá trazer sinais importantes, em particular quanto à necessidade de contingenciamento e bloqueio de despesas discricionárias. Em nossa estimativa, seria necessário um contingenciamento de R$ 41 bilhões (ou R$ 26 bilhões, considerando um “empoçamento” de R$ 15 bilhões) para atingir o limite inferior da meta de resultado primário, e um bloqueio de R$ 16 bilhões para cumprir o limite de despesas. O valor que o governo contingenciar/bloquear será fundamental para demonstrar o compromisso com o atingimento das metas e a manutenção do arcabouço fiscal.

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Setor Externo – Forte depreciação cambial em meio à piora na percepção de risco
Rodolfo Margato
Taxa de câmbio atinge os patamares mais elevados desde o final de 2021. A taxa de câmbio depreciou cerca de 8% em junho e mais de 13% no acumulado do ano, desempenho muito inferior ante os pares emergentes. Esta dinâmica reflete a piora na percepção de risco sobre a condução da política econômica doméstica. As preocupações acerca da sustentabilidade do arcabouço fiscal se intensificaram, dado o aumento acima do esperado das despesas obrigatórias e sinais de esgotamento do ajuste das finanças públicas pelo lado das receitas (ver seção sobre Contas Públicas). Ademais, há questões de credibilidade da política monetária nos próximos anos, com dúvidas crescentes sobre a reação do Banco Central a eventuais pressões políticas em torno das decisões de juros (ver seção sobre Política Monetária).

Projetamos 5,40 reais por dólar para o final de 2024. Entendemos que parte do prêmio de risco incorporado aos ativos brasileiros tende a ser permanente. Assim, a taxa de câmbio continuará pressionada nos próximos meses, acima dos níveis sugeridos pelos fundamentos econômicos (ao redor de 5,25, reais por dólar segundo os nossos modelos de curto prazo). Prevemos alguma descompressão até o final do ano, com o início do ciclo de corte de juros pelo Fed e a dissipação parcial de ruídos políticos. Portanto, nosso cenário base agora prevê 5,40 reais por dólar para o final de 2024, consideravelmente acima dos 5,00 que esperávamos antes da deterioração da percepção sobre a política econômica local. Projetamos 5,40 também para 2025, reconhecendo o grau de incertezas acima do usual no atual contexto.
Revisão metodológica afeta as projeções do balanço de pagamentos. Conforme anunciado pelo Banco Central em sua última Nota de Setor Externo, as compras e vendas de criptoativos serão reclassificadas da balança comercial, dentro de transações correntes, para a conta de capital. Essa mudança metodológica reduziu nossa projeção para as importações em US$ 18 bilhões (0,8% do PIB), gerando impacto correspondente na conta de capital (ver tabela).

Contas externas seguem favoráveis, apesar da piora em relação ao ano passado. Nossa projeção para as transações correntes seria revisada de -US$ 40,5 bilhões para cerca de -US$ 50,0 bilhões, devido a déficits maiores do que o esperado nas contas de serviços e renda primária no período recente. Considerando a reclassificação de criptoativos, entretanto, prevemos agora menor déficit em conta corrente no final de 2024 (-US$ 34,5 bilhões ou -1,6% do PIB). Para 2025, esperamos saldo de -US$ 31,0 bilhões (-1,4% do PIB) em meio ao aumento da balança comercial. Por sua vez, as projeções para os ingressos líquidos de Investimento Direto no País (IDP) permaneceram em US$ 67,0 bilhões para 2024 (3,1% do PIB) e US$ 73,0 bilhões para 2025 (3,2% do PIB).

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Inflação – Vetores da inflação apontam para cima; projetamos IPCA de 3,8% em 2024 e 4,3% em 2025
Alexandre Maluf
Leituras recentes não mudam quadro geral da inflação de curto prazo... O IPCA-15 de junho surpreendeu o mercado para baixo, sobretudo pela variação negativa em passagem aérea, subitem volátil. A inflação de alimentos segue alta, em razão das enchentes no Rio Grande do Sul e clima adverso em outras regiões do país – esperamos moderação no grupo a partir de julho, o que já tem sido visto em coletas de preços de alta frequência. Bens industriais seguem em trajetória benigna, embora já comecemos a ver alguma aceleração na margem, em linha com a reaceleração dos IPAs - cenário que prevíamos desde a virada do ano. Os serviços subjacentes, que excluem passagem aérea e outros subitens voláteis, arrefeceram na margem, mas seguem em patamar acima de 3%. Com isso, a média dos núcleos de inflação se distanciou ligeiramente da meta, mas continua em níveis historicamente bem-comportados.

No entanto, taxa de câmbio mais depreciada deve pressionar inflação prospectiva. Conforme escrevemos acima, projetamos agora taxa de câmbio a 5,40 reais por dólar em 2024 e 2025. Os impactos sobre a inflação não são imediatos, mas já devem ser percebidos, em maior medida, nos preços de alimentos em 2024 – destacam-se produtos importados, como derivados do trigo e leite. Em relação aos bens industrializados, esperamos reação nos preços a partir do último trimestre deste ano, mas com maior impacto no ano que vem.

Desse modo, elevamos nossa projeção para a inflação de alimentos em 2024 (de 5,0% para 5,5%) e 2025 (de 4,9% para 5,8%). Por sua vez, projetamos a inflação de bens industriais em 2,4% este ano e 3,2% ano que vem (2,1% e 2,7%, anteriormente). Não alteramos substancialmente nossa visão sobre bens monitorados, embora reconheçamos risco de alta em combustíveis já em 2024, dada a defasagem atual em relação aos preços internacionais (veja detalhes na tabela ao lado).
Mercado de trabalho segue positivo, mas traz riscos adiante. Como mostramos na seção de Atividade Econômica, a taxa de desemprego atingiu o menor nível em quase dez anos. Os salários reais voltaram a acelerar na margem, tanto na PNAD quanto no Caged, e notícias mostram que a grande maioria dos acordos salariais coletivos têm sido realizados acima da inflação. Portanto, trata-se de um risco para a inflação prospectiva. Nossa projeção para a inflação de serviços subjacentes situa-se em 5,2% e tem viés de alta. Por ora, o que nos motiva a não elevá-la são as estimativas de Custo Unitário do Trabalho (razão entre salário e produtividade), que ainda não retornaram ao patamar pré-pandemia em muitos setores.
Expectativas de inflação em deterioração. Outro elemento chave para a inflação de médio prazo, as expectativas de inflação seguem subindo. Desde a divulgação do nosso último relatório mensal, a mediana do Boletim Focus para a inflação de 2024 subiu 0,12 p.p. (4,00%); para 2025, houve elevação de 0,10 p.p. (3,87%). Para além dos elementos acima, os riscos fiscais se acumularam na margem e incertezas seguem altas em relação à condução de política monetária adiante. Diante de todos os elementos altistas elencados, projetamos IPCA de 3,8% em 2024 (antes 3,7%) e 4,3% em 2025 (antes 4,0%).

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Política Monetária - Quão alta é a barra para subir juros?
Caio Megale
O mercado de juros futuros apreça um ciclo de alta no segundo semestre. Ao mesmo tempo, os membros do Copom disseram explicitamente que a taxa Selic já está em nível suficientemente restritivo e que aumento de juros não está no “plano de voo” do Comitê. Algum lado terá que ceder.
A política monetária encontra-se, de fato, em território restritivo. O Copom elevou sua estimativa para a taxa de juros real neutra de 4,50% para 4,75% (estimamos em 5%). Ainda assim, a taxa neutra continua consideravelmente abaixo dos atuais juros reais ex-ante (cerca de 7%).
Contudo, todos os outros determinantes da inflação sugerem pressão adiante. Os preços internacionais das commodities estão em alta no ano; o Real se depreciou como resposta à maior percepção de risco; e o potencial influxo de capital gerado pelo balanço de pagamentos positivo é inferior ao previsto, conforme mostrou um estudo oficial recente[1]. O banco central reconheceu que a atividade econômica vem surpreendendo para cima, e que o hiato do produto está mais estreito do que o estimado anteriormente.

Por último, mas não menos importante, a política fiscal continua expansionista. As despesas primárias cresceram acima de 10% no primeiro semestre (em termos reais), muito acima do limite estabelecido pelo arcabouço fiscal. O crescimento de receitas também foi forte, mas não o suficiente para equilibrar o orçamento. A política fiscal expansionista é, em nossa visão, uma das razões por trás das pressões inflacionárias mencionadas acima.
Em nosso cenário base, mantivemos a projeção de taxa Selic constante. Nossas simulações sugerem que, com os valores atuais dos determinantes de inflação (taxa de câmbio, petróleo, expectativas, hiato do produto), a taxa Selic estável manteria as projeções de inflação do Copom apenas um pouco acima da meta em 2026 (ver tabela ao lado). Assim, mantivemos a projeção de taxa Selic em 10,50% até o final de 2025.
Uma pior combinação de taxa de câmbio e expectativas, no entanto, colocaria em risco a trajetória da meta com a taxa Selic estável (ver tabelas). Se a taxa de câmbio se estabilizar em, por exemplo, 5,80 reais por dólar ou mais, nossos modelos sugerem que as expectativas de inflação do IPCA (na pesquisa Focus do Banco Central) para 2025 e 2026 subiriam para 4,1% e 3,7%, respectivamente. Com essa combinação, o modelo do Copom com taxa Selic constante apontaria para inflação de 3,8% em 2025 e 3,5% em 2026. Em nossa opinião, esse é o limite a partir do qual o Copom passaria a elevar os juros.


Nessas circunstâncias, estimamos que o Copom precisaria aumentar a taxa Selic em 1,25 p.p. - 1,50 p.p. a partir do segundo semestre deste ano para trazer a previsão de inflação em 2026 de volta à meta (ou 2,00 p.p. para trazer a previsão de 2025 para a meta).
Analistas de mercado (e alguns membros do Copom) podem ter uma visão diferente em relação ao limite para a reação da autoridade monetária. As tabelas apresentam estimativas para a inflação (IPCA) em 2025 e 2026 a partir do modelo do Copom, considerando a taxa Selic constante em 10,50% e diferentes combinações de expectativas de inflação e taxa de câmbio. Se, por exemplo, alguém acreditar que a projeção de inflação para 2026 acima da meta já é o limite para subir juros, as condições atuais exigiriam uma reação contracionista do Copom.
Assim, na ausência de melhora no prêmio de risco (que traga algum recuo nas cotações do dólar), é possível que comecemos a ver decisões divididas nas reuniões do Copom, com um ou mais membros votando pelo aumento da taxa básica de juros.
[1] Boxe do Relatório Trimestral de Inflação 2024 T1.