Já não é de hoje que o Brasil parece viver entre a cruz e a espada, entre ser o país do futuro ou ser o país onde até o passado é incerto.
Em 2021, a julgar pela performance dos ativos brasileiros em relação ao resto do mundo e pela expectativa de alguns agentes do mercado, a percepção sobre o Brasil parece estar caminhando mais para o cenário preocupante do que o cenário otimista. O Real é a moeda de pior performance entre os grandes Emergentes em 2021 (-8%), junto do Peso Argentino (-8,3%), enquanto a Bolsa brasileira em dólares também está entre as piores no mundo, -9,6%, o que se compara com +3,6% para o índice MSCI Emergentes e +7,50% para o índice MSCI Global.
Na última semana, a XP organizou – em conjunto com o InfoMoney – uma série de Super Lives com uma lista de vários convidados de peso, visando debater o último ano da pandemia e as perspectivas para o futuro. Ouvimos desde mensagens positivas e otimistas do Ministro da Economia Paulo Guedes e do Presidente do BC, Roberto Campos Neto, como também um debate preocupado com os rumos do Brasil entre alguns dos principais economistas do país, como Alexandre Schwartsman, Pedro Jobim e Luiz Fernando Figueiredo. (veja o link para as Super Lives aqui).
As preocupações de alguns desses economistas incluíam desde os altos gastos fiscais aliados à rigidez do orçamento brasileiro e o pouco interesse aparente no Congresso na necessidade de ajustes das despesas no Brasil. Além disso, a alta taxa de inflação atual e a baixa taxa Selic ajudaram a elevar as taxas de longo prazo para próximo de 10% atualmente, o que preocupa, por conta do elevado nível da relação dívida/PIB brasileira.
Os dois caminhos que dá para se imaginar o Brasil seguindo nos próximos anos parecem ser:
- Otimista (“Copo meio cheio”): a volta de Lula para o cenário eleitoral de 2022 e o recrudescimento da pandemia parecem ter trazido de volta o senso de urgência no governo em acelerar novamente as políticas econômicas, como as reformas, privatizações e o equilíbrio fiscal, além de um foco maior na aceleração da vacinação no país. Esse cenário não parece estar precificado nos ativos brasileiros hoje, e tem uma baixa probabilidade sendo atribuída pelo consenso de mercado. Assim, caso esse cenário aconteça, deveríamos enxergar os ativos do Brasil (Bolsa, dólar e juros) em outro patamar, e fechando o gap em relação aos mercados internacionais.
- Pessimista (“Copo meio vazio”): as dificuldades em aprovar o orçamento de 2021 e a PEC Emergencial indicam que o ajuste fiscal e a trajetória da dívida pública não estão entre as maiores preocupações do Congresso e de setores do governo. Além disso, a volta de Lula como candidato potencial traz um aumento da polarização política, que pode ser prejudicial ao país, pois pode levar a um cenário de maior populismo daqui até o final de 2022. Além disso, a rápida escalada da inflação e o forte ajuste de juros sendo precificada pelo mercado daqui adiante trazem claros riscos do Brasil voltar ao cenário anterior de inflação alta, juros altos e desequilíbrio fiscal. No cenário da pandemia, o país vive o seu pior momento até agora em números de mortes diárias, além de um atraso na vacinação e na entrega das doses necessárias. Isso traz riscos à recuperação econômica, devido a necessidade de novos lock-downs sendo decretados ao redor do país.
O nosso time de alocação modelou esses cenários para o Brasil e expectativas de retornos para os ativos brasileiros em cada um deles, que você pode ler em 5 anos em 5 minutos – março 2021. Esses cenários variam desde inflação a 3,8% a.a., Selic a 5,5% e um retorno médio da Bolsa brasileira de 16%a.a. no cenário otimista, até o cenário negativo com a inflação média próxima de 7%a.a., a Bolsa brasileira com retornos negativos de 4,4%a.a. e o Real muito mais depreciado frente ao Dólar.
Nem Suíça, nem Venezuela
O Brasil parece já viver há décadas em uma situação de equilíbrio instável. Em algumas ocasiões, a expectativa dos agentes é que a trajetória positiva do país nos transformará na próxima Suíça, enquanto em muitas outras horas a expectativa se deteriora tanto que muitos passar a ter plena convicção que o Brasil será a nova Argentina ou Venezuela.
Esses momentos de extremo otimismo e pessimismo com o Brasil tendem a gerar grandes oportunidades de investimento, ao se apostar ao contrário do sentimento generalizado.
Alguns fatores parecem nos trazem sempre de volta “ao meio”, no que é conhecido como o fenômeno do retorno à média (“mean reversion”). Além da imprensa e de um grande setor empresariado que são bem atuantes na fiscalização dos governos e governantes, a grande representatividade dos partidos de centro no Congresso também tem um papel importante de controlar quaisquer tentativas de medidas mais extremas no país, pois governar sem alianças com esses partidos já se mostrou impossível.
Um outro fator relevante recente são os mais de 3,6 milhões de investidores na Bolsa, além de outros milhões de investidores brasileiros que passaram a tomar mais risco com o seu patrimônio por conta dos juros baixos. Essa grande camada da população agora se preocupa muito mais com o noticiário e os rumos do país, pois enxerga um impacto imediato no seu patrimônio. Quer um exemplo? As manifestações populares em massa a favor da Reforma da Previdência, uma reforma que impactou muitos benefícios futuros, mas era de extrema importância ao país. Eu chamo isso de “A grande força moderadora”.
Bolsa é lucro!
Para a Bolsa brasileira, esses riscos Macro e Políticos podem impactar o retorno da Bolsa à frente, na medida em que impactam o custo de capital (juros) e o fluxo de capitais para a Renda Variável. Porém, é importante lembrar que, no médio e longo prazo, o fator mais relevante para determinar o preço de uma ação é quanto de lucro e caixa que aquelas empresas geram.
Nesse sentido, o cenário para a Bolsa brasileira se mantém positivo. A nossa Estrategista de Ações, Jennie Li, nos mostrou que a projeção de Lucros para o Ibovespa está em franca recuperação, após forte queda ao longo de 2020. O otimismo com as vacinas e a reabertura econômica, a alta nos preços das commodities e o dólar alto são os fatores principais por trás da forte revisão de lucros.
Isso faz com que a Bolsa se torne “mais barata” na medida em que os indicadores como “Preço/Lucro” ficam mais atrativo. Por exemplo, o Lucro por Ação projetado pelo Consenso Bloomberg para 2021 é de 11.185 pontos. O índice está negociando em 117.669 pontos. Ou seja, o índice Preço/Lucro para o Ibovespa está atualmente em 10,5x, vs. 13,5x que consideramos o valor justo (clique aqui para ler o último Raio-XP da Bolsa).
Já o índice americano S&P500 está negociando com um Preço/Lucro para 2021 de 20,6x. Essa diferença traz um desconto atual do Ibovespa em relação ao S&P de cerca de 50%. Historicamente, nos últimos 10 anos, esse desconto era de 25%. Enquanto a diferença setorial e a grande exposição ao setor de tecnologia para o S&P500 ajuda a explicar uma parte dessa diferença, o aumento dos riscos no Brasil (Macro, Políticos, Pandemia) também explicam o porquê desse desconto estar atualmente quase 2x maior que a média histórica.
O ciclo global é muito favorável, iremos perder essa oportunidade?
Caso o Brasil consiga arrumar a casa e trazer um ambiente favorável às empresas, investidores e empreendedores, o país conseguirá se beneficiar do cenário de forte liquidez global e de recuperação do crescimento econômico. Isso inclui aumento de produtividade (reformas e investimentos em educação e tecnologia), aumento de previsibilidade (segurança jurídica, controle dos gastos fiscais e da trajetória da dívida que permitam a manutenção dos juros baixos) e incentivos à inovação e investimentos produtivos no país.
Por outro lado, caso o país caminhe para mais próximo do precipício, e volte a conviver com as mazelas da inflação alta e juros altos, perderemos assim mais uma oportunidade de se beneficiar de um ciclo econômico global extremamente favorável.