Destaques
- A atividade e a inflação nos EUA desaceleram, ficando mais próximas ao equilíbrio. Projetamos que o Fed cortará os juros em 0,25pp nas próximas reuniões deste ano.
- Na Europa, o BCE reduziu os juros em 0,25pp pela segunda vez, mas a política monetária deve permanecer restritiva até pelo menos meados de 2025. O BoE, no Reino Unido, também deve continuar cortando, embora gradualmente.
- A atividade econômica da China continua aquém das expectativas, reforçando a nossa visão de que seu crescimento estrutural é mais fraco. O desempenho misto das commodities tem impacto variado na América Latina.
- Na América Latina, o crescimento do PIB no segundo trimestre foi relativamente sólido. O forte crescimento no Brasil compensou pelo fraco crescimento no México (as duas maiores economias), enquanto o desempenho das economias andinas foi misto. Excluindo a Argentina, o PIB da região deve crescer mais de 2% este ano.
- As moedas da região tiveram desempenho fraco no ano. A deterioração ocorreu principalmente em períodos de tensão política, principalmente no México e no Brasil.
- A inflação de curto prazo tem sido relativamente benigna na América Latina, embora a convergência para a meta ainda não seja clara. Esperamos que a inflação termine 2024 e 2025 um pouco acima das metas do banco central.
- Em relação às decisões de política monetária, acreditamos que fatores domésticos terão maior peso do que o ciclo de flexibilização do Fed. A maioria dos bancos centrais da região deve continuar a reduzir os juros, porém em ritmos diferentes. Contrariando a tendência mundial, vemos o BCB entrando em um breve ciclo de alta de juros.
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Estados Unidos: Início do ciclo de flexibilização garantido
Nos EUA, os dados recentes são consistentes com um “pouso suave” da economia. Indicadores econômicos divulgados desde nosso último relatório mostraram que a inflação continua a desacelerar, com leituras benignas para categorias de serviços. Enquanto isso, a atividade econômica segue robusta, apesar da política monetária ainda restritiva. O PIB do segundo trimestre foi revisado para cima (de variação trimestral anualizada de 2,9% para 3,1%), principalmente devido ao aumento no consumo pessoal, enquanto as vendas no varejo e a produção industrial surpreenderam positivamente. Além disso, os dados do mercado de trabalho continuam próximos ao equilíbrio, e a queda da taxa de desemprego para 4,2% em agosto (após uma alta inesperada de 4,1% em junho para 4,3% em julho) amenizou preocupações sobre uma tendência de deterioração. Portanto vemos uma normalização da economia norte americana (pouso suave) e não um cenário de recessão (pouso forçado).
O Fed começará a cortar os juros em setembro; a dúvida é o tamanho do corte. Leituras mais benignas de inflação nos últimos meses aumentaram a confiança do Fed de atingir a meta de 2%. Destacamos que a tendência de desinflação observada desde abril parece mais sustentável do que a vista no final de 2023, sendo mais disseminada entre categorias. O discurso do presidente Powell em Jackson Hole foi claro ao afirmar que chegou a hora de iniciar o afrouxamento monetário. Concordamos com essa visão, porém ainda existem incertezas sobre os riscos para os dois mandatos do Fed (inflação e emprego) e sobre a velocidade de queda das taxas de juros.
Começar com um corte mais moderado seria mais apropriado, em nossa visão. Os mercados atualmente atribuem probabilidade de 50% para um corte de 0,25pp, e 50% para uma redução mais agressiva de 0,50pp. Acreditamos que o Fed deveria iniciar seu ciclo de afrouxamento de forma gradual, dado que não vemos sinais claros de enfraquecimento da economia. Além disso, a inflação caiu consideravelmente, embora ainda esteja ligeiramente acima da meta de 2%, o que implica riscos em ambos os lados. Acreditamos que o discurso do Governador Christopher Waller, após o relatório de emprego de agosto, foi consistente com nossa visão de um primeiro corte de 0,25pp.. Waller descreveu o mercado de trabalho como equilibrado e sugeriu que o Fed deve acelerar o ritmo apenas se surgirem sinais de deterioração.
Por enquanto, não vemos razões fortes para o Fed acelerar o ritmo de afrouxamento, especialmente considerando que a taxa neutra ainda é incerta. Reconhecemos, porém, que a função de reação do Fed tornou-se mais sensível ao mercado de trabalho, dado o recente aumento da taxa de desemprego (apesar de ainda estar historicamente baixa). Reconhecemos que dados mais fracos do que o esperado podem forçar o Fed a entregar um corte de 0,50 pp. nas próximas reuniões. Para a reunião de setembro, acreditamos que o Fed só começaria com um corte mais agressivo em um cenário improvável dados muito fracos referentes às vendas no varejo de agosto (a serem divulgados um dia antes da decisão) ou estresse inesperado nos mercados financeiros.
No geral, esperamos que o Fed entregue três cortes consecutivos de 0,25 pp. este ano e atinja uma taxa neutra de 3,5% em 2026. Não acreditamos que a taxa de juros do Fed voltará aos níveis pré-pandemia. Primeiro, a sequência de choques econômicos desde a pandemia provavelmente elevou a taxa neutra real (r*) de 0,5% para cerca de 1,0%. Além disso, as tensões geopolíticas e comerciais provavelmente deixarão o ambiente global mais inflacionário do que no passado, e vemos a inflação do PCE em torno de 2,5%. Isso, combinado com um cenário de pouso suave, sugere que o Fed deve adotar um ciclo gradual de afrouxamento.
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Europa: Cautela no ritmo
Na Europa, o BCE cortou a taxa de juros pela segunda vez, mas a próxima decisão não é clara. O Conselho de Governadores decidiu por unanimidade reduzir sua taxa de depósito em 0,25pp, para 3,5%. O banco central também atualizou suas projeções econômicas, e consideramos que as expectativas projeções para o núcleo da inflação em 2024 são otimistas. Isto significa que há uma chance considerável dos dados virem mais fortes do que a autoridade monetária espera.
Na coletiva de imprensa, a presidente Lagarde não deu orientações específicas sobre decisões futuras, reforçando a abordagem dependente de dados em cada reunião, como esperávamos. Portanto, a decisão de outubro permanece em aberto, e o mercado está dividido entre a opção de uma pausa e um outro corte de 0,25pp.
Continuamos vendo um ritmo gradual de afrouxamento na Zona do Euro. Acreditamos que uma pausa em outubro é mais provável, dado que (1) há apenas cinco semanas entre as reuniões intervalo mais curto do que o normal, dando ao BCE tempo e informações limitados; (2) acreditamos que o núcleo da inflação provavelmente surpreenderá as projeções do BCE para cima; e (3) também esperamos que o Fed corte gradualmente. Nosso cenário base considera um terceiro corte este ano, em dezembro. Em 2025, o BCE pode acelerar o ritmo para cortes consecutivos de 0,25 pp., embora esse resultado dependa da inflação (especialmente serviços), crescimento dos salários, produtividade, gastos fiscais e o Fed. Projetamos que o BCE encerrará seu processo de normalização com a taxa de depósito em torno de 2,25% até o final de 2025.
No Reino Unido, o Banco da Inglaterra (BoE) deve continuar cortando gradualmente. A inflação tem se mostrado mais persistente no Reino Unido em comparação com os EUA e a Zona do Euro. Embora a inflação ao consumidor tenha caído para perto da meta do BoE (2,2%), espera-se que ela suba novamente para 2,3% na leitura de agosto devido a efeito base desfavorável. Além disso, o núcleo da inflação deve aumentar de 3,3% para 3,6%, com o componente de serviços excedendo 5%. O próximo relatório de inflação será divulgado um dia antes da próxima decisão de política monetária, na qual o BoE provavelmente não cortará as taxas de juros.
Enquanto isso, o crescimento salarial anual desacelerou para 5,1% em julho e, apesar de ser o nível mais baixo desde junho de 2022, ainda é historicamente elevado. O Comitê de Política Monetária (MPC) provavelmente desejará ver evidências claras de menores pressões salariais e de uma desaceleração na inflação de serviços antes de decidir reduzir os juros novamente. O BoE deve ter espaço para cortar uma ou duas vezes ainda este ano (novembro e dezembro), e em 2025 o ritmo dependerá dos dados. Esperamos que a taxa terminal fique em torno de 3,25%-3,5%.
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China e commodities: Desempenho abaixo do esperado
China enfrenta dificuldades em sua recuperação econômica. Os dados publicados em agosto foram novamente fracos. Destacamos que (1) o PMI Composto – sondagem com empresários sobre as condições econômicas e de negócios – registrou 50,1 em agosto, o menor nível desde dezembro de 2022; (2) a produção industrial cresceu 5,1% em termos anuais em julho, o segundo menor nível desde o último ano; (3) as vendas no varejo contraíram em julho; e (4) os preços de novas residências tiveram a maior queda em nove anos. Em relação ao crédito, os novos empréstimos (em yuans) caíram para o menor nível em 15 anos, devido à contração na demanda das famílias e empresas.
A atividade econômica chinesa permanece aquém das expectativas em meio a desafios crescentes, como riscos de desinflação, exportações fracas e crise no mercado imobiliário. O governo chinês vem sinalizando a intenção de estimular o consumo e expandir a demanda interna e, desse modo, alcançar a meta de crescimento anual de 5%. Dito isso, os dados recentes seguem consistentes com nossa visão de que o crescimento estrutural na China é mais fraco.
Desempenho misto entre as principais commodities. As cotações do ouro dispararam para níveis recordes (acima de US$ 2.500 por onça), refletindo a perspectiva de queda de juros nos EUA. Os preços de outros metais, por sua vez, recuaram consideravelmente, com destaque ao minério de ferro. Os preços do açúcar atingiram um pico mensal de US$ 0,191 centavos por libra, devido a preocupações com a menor produção no Brasil e condições climáticas extremas na Tailândia. Enquanto isso, os preços do gás natural caíram para a mínima de três semanas tendo em vista o excesso de oferta, já que o grau de armazenamento está 12,6% acima da média dos últimos cinco anos. Além disso, os preços do milho e da soja chegaram aos menores patamares em quatro anos, refletindo melhores perspectivas de oferta, projeções de colheita recorde no outono e demanda mais fraca. Já os preços do petróleo do tipo Brent oscilaram entre US$ 72-82 por barril, na esteira de riscos geopolíticos e temores de recessão nos EUA (vetores contrários, portanto). Dado o desempenho misto, o impacto em cada país da América Latina varia a depender da composição das pautas de exportação.
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América Latina: divergência nos ciclos de corte de juros
Na América Latina, as economias mostraram diferentes dinâmicas de crescimento no segundo trimestre. No geral, o crescimento do PIB na região foi relativamente sólido, embora cada país tenha tido uma trajetória diferente. O crescimento do Brasil foi particularmente forte (variação trimestral de 1,4%), impulsionado pelo mercado de trabalho robusto e pela demanda doméstica. A economia brasileira caminha para o terceiro ano consecutivo de crescimento em torno de 3%, surpreendendo as expectativas dos analistas durante todo esse período. No entanto, a política monetária mais restritiva provavelmente levará a uma desaceleração econômica, e projetamos um crescimento de 1,8% em 2025. No México, o crescimento foi o oposto, com o PIB crescendo apenas 0,16% no segundo trimestre. Esperamos um desempenho econômico fraco, em meio a uma política monetária apertada por mais tempo, menor estímulo fiscal, incerteza política e desaceleração do crescimento dos EUA. Projetamos um crescimento de 1,0% para o ano completo de 2024 e 0,8% em 2025. Desta forma, o forte crescimento no Brasil compensou o fraco crescimento no México (as duas maiores economias).
Nas economias andinas, o PIB do Chile caiu 0,6% no segundo trimestre, impactado negativamente por estoques e consumo privado. O investimento fixo e o comércio líquido compensaram parcialmente pelo resultado negativo. Ainda assim, dado que nossa previsão já considerava uma atividade mais fraca, mantemos nossa projeção de crescimento do PIB em 2,2% para 2024 e 2,0% para 2025. Na Colômbia, apesar do PIB do segundo trimestre ser muito inferior às expectativas do mercado e ao que os indicadores de mais alta frequência sugeriam (crescimento de apenas 0,1%), a atividade econômica teve desempenho relativamente bom no primeiro semestre, especialmente a demanda doméstica. Além disso, o crescimento ficou alinhado com nossas previsões e as do banco central. Esperamos que o PIB cresça 1,5% em 2024 e 2,8% em 2025. O PIB do Peru registrou um forte crescimento de 3,6% no segundo trimestre em relação ao mesmo período do ano passado, confirmando sua tendência de recuperação após um desempenho muito fraco em 2023. Esta foi a leitura mais forte desde o terceiro trimestre de 2021. Por fim, a Argentina continua enfrentando dificuldades, e espera-se que o PIB caia mais de 3% em 2024. Excluindo a Argentina, o PIB na América Latina deverá crescer mais de 2% este ano — um desempenho relativamente sólido, considerando a política monetária restritiva que prevalece na maioria dos países.
Nova rodada de choques políticos na América Latina afetou as moedas regionais. Apesar das taxas reais ainda altas em grande parte das economias latino-americanas, as principais moedas da região tiveram um desempenho fraco no acumulado do ano. Apesar de também termos observado impacto da reversão das posições carry no Japão, a maior parte da deterioração ocorreu em períodos de estresse político, especialmente no México e no Brasil. Ainda assim, o desempenho negativo foi generalizado em quase todas as moedas da região, com todas tendo desempenho pior do que a média dos mercados emergentes (gráfico).
As probabilidades de o México aprovar reformas controversas impactaram negativamente a credibilidade institucional e a atratividade para novos investimentos. Consequentemente, o risco de rebaixamentos da nota de crédito no próximo ano aumentou. Enquanto isso, os problemas fiscais recorrentes do Brasil se agravaram este ano, com preocupações sobre a sustentabilidade do quadro fiscal do governo e seu comprometimento com as metas. Isso levantou incertezas sobre a capacidade do BCB de atingir sua meta de inflação de 3%, especialmente considerando a primeira troca de presidente desde que o banco central se tornou oficialmente independente. Não surpreende que as moedas desses dois países tenham tido desempenho pior do que seus pares neste ano.
Inflação de curto prazo benigna, embora a convergência para a meta ainda seja incerta… A inflação de curto prazo tem sido bem-comportada na maioria dos países da região, e as leituras de agosto foram benignas de forma geral. Por exemplo, a média móvel de três meses dessazonalizada e anualizada (3M SAAR) – medida de tendência da inflação no período mais recente – do núcleo da inflação caiu mais próxima das metas bancos centrais (gráfico). No entanto, ainda há uma notável discrepância entre a dinâmica da inflação de bens e a inflação de serviços, que ainda é uma preocupação para a política monetária. Além disso, o fraco desempenho das moedas levantou dúvidas sobre se isso poderia gerar mais desafios para convergência da inflação para a meta. De fato, as expectativas de inflação para os próximos 12 meses permanecem acima da meta na maioria dos países, e esperamos que a inflação ao consumidor feche acima da meta este ano e no próximo.
… e cada país tem suas particularidades. No Chile, o núcleo da inflação foi novamente benigno em agosto, embora a inflação total deva permanecer elevada ao longo do próximo ano devido ao aumento nas tarifas de eletricidade. No México, apesar a inflação de serviços ter surpreendido para cima em agosto, o núcleo da inflação veio em linha com as expectativas. A boa notícia é que a recente depreciação do peso mexicano ainda não se refletiu nos preços ao consumidor, e o enfraquecimento da demanda deve parcialmente compensar pelo risco cambial. Na Colômbia, tanto a inflação total quanto a medida dos núcleos provavelmente cairão abaixo das projeções do BanRep (6,3% e 5,5%, respectivamente, para o final do do terceiro trimestre de 2024). Pressões de curto prazo devem ser temporárias, dada a performance relativamente boa do câmbio, demanda moderada e estímulo fiscal reduzido no segundo semestre de 2024. Embora a inflação tenha caído pela metade no último ano, ela ainda está longe da meta. No Brasil, o IPCA de agosto e sua composição foram melhores do que o esperado, embora ainda vejamos pressão à frente, em meio à forte demanda, altas expectativas de inflação e desempenho fraco da moeda.
Em relação às decisões de política monetária, acreditamos que fatores domésticos terão maior peso do que o ciclo de flexibilização do Fed. Teoricamente, o início do ciclo de afrouxamento nas economias desenvolvidas (especialmente o Fed) este ano é positivo para a continuação dos cortes de juros que começaram no ano passado na América Latina, pois alivia as pressões sobre os fluxos de capitais e sobre as moedas regionais. Contudo, as condições internas têm prevalecido sobre os fatores externos, pelo menos no curto prazo, levando a diferentes velocidades de cortes de juros na região.
A maioria dos bancos centrais da região deverão continuar a reduzir as taxas, e esperamos que os menos avançados nos seus ciclos de flexibilização proporcionem cortes maiores nas taxas (Colômbia e México). Esperávamos que os bancos centrais destes países cortassem suas taxas de juros de referência em 2,00 pp. e 0,75 pp. até ao final do ano, respectivamente, e continuem cortando até chegar no nível terminal 6,5% e 8,0% no próximo ano.
Por outro lado, os bancos centrais que estão mais avançados no seu processo de normalização reduziram o seu ritmo de flexibilização e deverão ser ainda menos dependentes da Fed (Chile e Peru). Ambos os países têm taxas neutras estimadas mais baixas. Esperamos que o Chile corte mais 1,00-1,25 pp. para uma taxa terminal de 4,25%-4,50% no terceiro trimestre de 2025. No Peru, espera-se que o banco central reduza os juros em mais 1,50-2,00 pp., para uma taxa terminal de cerca de 4,0%-4,5% no próximo ano. Por último, ao contrário da tendência global, vemos o BCB no Brasil entrando num breve ciclo de alta de juros em meio ao forte crescimento, depreciação cambial, preocupações fiscais e expectativas de inflação desancoradas. Esperamos um aumento de 1,50 pp. ao longo das próximas quatro reuniões, para uma taxa terminal de 12,0% em janeiro.