Resumo
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Revisamos nossa projeção para o câmbio de R$/US$ 5,50 para R$/US$ 5,20 ao final de 2020 e de R$/US$ 5,50 para R$/US$ 4,90 ao final de 2021.
Motivado por:
(1) Redução dos riscos globais e domésticos associados à pandemia no médio prazo.
(2) Retorno gradual dos preços de commodities.
(3) Relativa manutenção do diferencial de juros até o fim de 2021.
A estrutura do câmbio
O primeiro semestre de 2020 ficará na história como o início do período de maior incerteza na vida das pessoas, dos governos e, consequentemente, dos mercados financeiros globais. A pandemia do novo coronavírus trouxe à tona de forma bem explícita como em períodos de aversão ao risco, os ativos de maior segurança preponderam. A moeda norte-americana foi o refúgio de alocação de ativos escolhidos em todas as partes do mundo e o Brasil não ficou de fora. O movimento ficou escancarado na nossa taxa de câmbio nos últimos meses.
O intuito deste artigo é atualizar as evidências sobre os fundamentos que operam sob a nossa taxa de câmbio R$/US$ e, a partir de tais variáveis, projetar em base trimestral o dólar até o final de 2021.
Antes de detalhar as variáveis, vale destacar que apesar da cotação R$/US$ ter quebrado recordes nominais nas últimas semanas, o câmbio para a perspectiva macroeconômica também deve ser observado na ótica real, ou seja, aquela que é expressada considerando a inflação brasileira (IPCA) bem como a americana (CPI). Olhando sob essa perspectiva real e considerando a janela desde os anos 2000, vale ressaltar que o recorde de meados de maio foi menor que a cotação vista durante as eleições de 2002.
Nos últimos três meses, observamos um grau de volatilidade sobre a nossa moeda em patamar historicamente alto, fazendo questionar se o nosso câmbio está “descolado” dos fundamentos da economia. Condições financeiras atípicas (como o indicador de incerteza global) ajudam a explicar depreciações de 0,50 cents no espaço de apenas uma semana. Sob um horizonte de tempo mais amplo, a depreciação da nossa moeda já vinha sendo vista ao longo de 2019 com o acirramento da guerra comercial China – Estados Unidos e escalonado em patamar nunca visto agora pelos efeitos da pandemia.
Nos últimos trimestres, os fundamentos que guiam o arcabouço teórico das oscilações entre a moeda americana e a brasileira apresentaram significativa mudança de trajetória. Aqui vale relembrar alguns aspectos idiossincráticos da economia brasileira que devem ser consideradas para explicar nosso câmbio tais como; a elevada relevância das commodities minerais e agrícolas na nossa pauta de exportações; a teoria de paridade de juros sob a métrica de diferencial dos swaps brasileiros com títulos americanos; a produtividade brasileira que pode ser mensurada neste contexto sobre o indicador de termos de troca (exportação/importação) na cadeia de comércio global e, por último, o patamar de risco-país que consegue englobar riscos associados à conjuntura política e fiscal e à própria dinâmica da divisa norte-americana frente a outras economias centrais (movimento ilustrado através do índice DXY). Evidentemente, nem todas as variáveis macroeconômicas conseguem explicar por um todo as oscilações cambiais e, por isso, mesmo visando reduzir ruídos diários, a estruturação de modelagem apresentada abaixo parte de frequência trimestral a partir de janeiro de 2000(¹).
Índice DXY
O índice DXY mensura a força do dólar contra uma cesta de seis moeda (Euro, Iene, Libra, Dólar Canadense, Coroa Sueca, Franco Suíço) e denota o valor relativo da moeda americana no mercado global. Desde o primeiro trimestre de 2018, o DXY vem apresentando valorização e terminou o primeiro semestre de 2020 em nível 10,8% maior que a mediana histórica a partir de 2000.
Termos de troca
O indicador de termos de troca, que trata da razão entre os preços de produtos exportados sobre preço de produtos importados pelo Brasil, tem como intuito comparar o comércio do país com o resto do mundo. Dada a relevância das commodities neste índice e mesmo com toda a crise imposta pelo coronavírus, observa-se um nível de “tt” ao final do segundo trimestre próximo à média historicamente observada, o que traz implicações relativamente benignas e factíveis com o cenário de apreciação do real.
Commodities
A produção brasileira de commodities a rigor segue preços internacionais e esses índices são mensurados pela Commodity Research Bureau Reuters/Jefferies (CRB-RJ) – indicador que fornece informação sobre mercado futuros de commodities como o petróleo – e pelo índice FAO das Nações Unidas, que estima preços sobre produtos alimentícios em escala global. Estes indicadores conseguem impor sensibilidade de oferta e demanda global por tais bens e apresentam poder preditivo significativo para as oscilações da taxa de câmbio RS/US$. Ao fim do segundo trimestre, com a fraca demanda global por petróleo refletida no preço do US$/barril Brent que recuou em níveis observados de há quase 20 anos, o indicador CRB/RJ está cerca de 50% abaixo da média histórica. Já a demanda por produtos alimentícios segue em relativa estabilidade. A expectativa de retomada da atividade econômica global e consequentemente da elevação da demanda por petróleo impõe viés de apreciação para a nossa taxa de câmbio.
Diferencial de juros
O Brasil iniciou em 2016 um processo de reformas micro e macroeconômicas que impactaram significativamente as nossas curvas de juros. Entre elas estão a criação da TLP, que retiraram o “custo de meia-entrada” de contratos concessionados pelo BNDES, a criação do teto dos gastos, que impõem um limite aos gastos públicos, a implementação do Cadastro Positivo, que reduz a assimetria de informações para os juros às famílias, e a reforma da previdência, que estabilizou a trajetória do maior gasto obrigatório da União. Todas essas medidas foram fundamentais para que a política monetária do Banco Central pudesse reduzir a taxa básica de juros da economia para patamares mínimos históricos. Este nível de juros mais elevado no passado foi condição suficiente por certa manutenção de fluxo estrangeiro em ativos financeiros de renda fixa no Brasil, ajudando a apreciar nosso câmbio.
Estruturalmente, o diferencial entre os juros brasileiros (SELIC) e os juros americanos (FED Funds) caiu de uma média de 15 anos (entre 2002 e 2016) de 12,1 pontos percentuais para uma média de 2017 até hoje de 5,4 p.p.. Atualmente essa diferença(²) está em 2,1 pontos percentuais. Não obstante dessa nova realidade de juros estruturalmente mais baixos, o próprio diferencial da taxa básica de juros brasileira com um grupo de países emergentes(³) ganha relevância e se configura menos atrativo para o capital estrangeiro que opta por ativos livres de risco, como ilustra o gráfico abaixo. Desde a metade de 2018 essa diferença está negativa para o Brasil, o que explica em parte a fuga de capital estrangeiro para outros países.
Risco
Por último, o fator de maior relevância nos últimos meses: a medida de risco. Na literatura econômica dos dias atuais são disponibilizados ao público diversos indicadores de risco tanto domésticos quanto globais. Do mês de março de 2020 até o final de junho, todos eles apresentaram uma mesma característica, registro de patamares de recorde máximo histórico no grau de incerteza. Como ilustrado anteriormente, o uncertanty index mensura o grau de incerteza sob o aspecto não só econômico, mas também de mídia e de políticas governamentais. Para efeitos de explicação da taxa de câmbio brasileira, a opção por índices de risco mais associados aos mercados financeiros apresenta melhor desempenho preditivo. De âmbito global, o VIX tem boa característica para refletir decisões de investimentos e já no âmbito doméstico o CDS de 5 anos indicador coletado pela Bloomberg de contratos no mercado financeiro é a melhor medida de risco-Brasil.
A maior falta de previsibilidade sobre o câmbio está justamente na variável do risco brasileiro. No momento atual, há elevada incerteza global no campo sanitário sobre os desdobramentos dos números de casos e mortes causados pelo COVID-19 e se haverá e quando uma vacina que permita o mundo voltar a dinâmica “normal”. Já pelo lado doméstico, a dúvida cerca o tema de uma elevação dos prêmios de risco dos títulos soberanos do Brasil por conta da elevação da relação dívida/PIB ocasionada pelas medidas de combate à pandemia.
Portanto, a expectativa é de que no médio/longo prazo o risco-Brasil reflua para patamares acima da média vista ao final de 2019.
O gráfico acima mostra a relação das moedas de países emergentes contra o dólar de 2017 até hoje e retrata a composição dos elementos estruturais do nosso câmbio que foram citados anteriormente. Com exceção do Lira Turca e do Peso Argentino, países que tiveram crises de ordem domésticas mais significativas, o real teve uma depreciação de quase 40% no período e essa dinâmica não irá se alterar sem ganhos de produtividade da economia brasileira e isso passa necessariamente pela agenda de reformas estruturais como a tributária e a administrativa.
Projeções e premissas para a taxa de câmbio 2020/2021
Desde o início do alastramento do novo coronavírus nos países ocidentais no início de março, o risco vem sendo o principal fator de explicação para as oscilações diárias da taxa de câmbio R$/US$. O gráfico abaixo consegue ilustrar a correlação entre o CDS e a depreciação do real nestes últimos quatro meses.
Dado o elevado grau de incerteza na economia brasileira e a manutenção da volatilidade do dólar em níveis historicamente elevados, o cenário poderá ser revisto marginalmente nos próximos meses.
Para os próximos meses, considerando os elementos macroeconômicos como:
- Expectativa de depreciação próxima de 5,0% da moeda norte-americana (DXY) dos patamares observados no segundo trimestre de 2020 até o final de 2021.
- Redução de incerteza global e doméstica; projetamos a CDS de 5 anos do Brasil próximo aos 180 pontos ao final de 2021.
- Retorno dos níveis do preço do petróleo Brent afetará positivamente nossa pauta de exportações. Por ora, esperamos que o índice CRB/RJ acelere até os 180 pontos neste horizonte.
- Relativa manutenção do diferencial de juros Br x US pelos próximos trimestres e expectativa de elevação desta ao final de 2021.
A expectativa da XP Inc. é de gradual apreciação do real para R$/US$ 5,20 ao final de 2020 e R$/US$ 4,90 ao final de 2021.
Notas de rodapé:
(¹) O câmbio se tornou flutuante a partir de 1999.
(²) Diferença em pontos percentuais da SELIC e Fed Funds em junho de 2020.
(³) Chile, Índia, México, Rússia, Turquia e África do Sul.
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