Após 2 anos de forte desempenho, a indústria de semicondutores passa por um período de desaceleração. No curto prazo, enxergamos alguns desafios para o setor como: i) a normalização das cadeias de abastecimento, ii) arrefecimento da demanda global com perspectivas de desaceleração econômica, iii) ajustes nos estoques das companhias e iv) compressão de margens com aumento de custos e perda de pricing power. Todavia, o longo prazo segue promissor, uma vez que os chips estão no centro de diversas tendências estruturais e tecnologias disruptivas. Continuamos vendo de forma positiva essa temática para um horizonte de investimento estendido, mas acreditamos que o curto prazo seguirá desafiador até que haja uma melhora no contexto macroeconômico global.
Uma breve recapitulação
Nos últimos dois anos, a indústria de semicondutores foi fortemente impulsionada pela pandemia. As restrições de mobilidade pra controlar o contágio da COVID-19 acabaram acelerando o processo de transição digital, tanto das empresas como dos consumidores. E com a reabertura econômica, houve uma escassez global de chips à medida que as cadeias de abastecimento globais foram ficando cada vez mais congestionadas.
Mas e agora, o vento virou? Após 2 anos de um forte desempenho, as ações de empresas ligadas a semicondutores têm sofrido mais do que o S&P 500 em 2022. Até agora no ano, o índice MVIS US Listed Semiconductor acumula perdas significativas de -27,4%, bem atrás do S&P 500 que apresenta uma correção de -14,6% durante o mesmo período.

Atualmente, a indústria passa por um período de normalização. O congestionamento das cadeias de abastecimento já está em níveis bem menores, empresas já conseguiram retomar grande parte dos seus estoques, e a deterioração do cenário macroeconômico com uma inflação mais elevada deverá resultar em um arrefecimento e até mesmo destruição de demanda. Na outra ponta temos as empresas do setor ainda com margens operacionais elevadas e com características de topo de ciclo. A combinação destes fatores explica grande parte do pessimismo do mercado em relação ao setor de semicondutores, que deverá passar por um período conturbado no curto prazo.
Acreditamos que esta volatilidade poderá perdurar até que os apertos monetários globais desacelerem e o cenário para o crescimento econômico fique mais claro. Um contexto recessivo pode reduzir bastante a demanda por estes componentes eletrônicos e, nesse cenário, podemos ver uma compressão nos lucros desse tipo de empresa.
Por outro lado, o aumento da demanda por semicondutores é estrutural, eles estão no centro de diversas tecnologias como: robotização, inteligência artificial, veículos elétricos e dispositivos inteligentes. Consequentemente, em um horizonte alongado, o setor deverá continuar sua tendência de crescimento.
Normalização nas cadeias de abastecimento

Dados do Federal Reserve de Nova York apontam que as cadeias de abastecimento já estão bem menos congestionadas e mais próximas a condições normais de operação do período pré-pandemia. Isto tende a ser negativo para as produtoras de chips, pois pode reduzir o seu poder de precificação no curto prazo e pressionar margens. Além disso, o período de escassez durante a pandemia, fez com que as companhias realizassem pedidos maiores que o necessário para reabastecerem seus estoques. Consequentemente, com a normalização vista agora, devemos ver uma demanda menor mesmo que o cenário macroeconômico não se deteriore de maneira mais dura.
Esta dinâmica marca o fim do vento de cauda visto pelas empresas nos últimos anos. A demanda excessiva e a falta de oferta nos últimos dois anos levaram a preços mais altos por componente na indústria, o que beneficiou as empresas do setor e contribuiu para a expansão de suas margens. Porém, agora, o vento vira para o outro lado e devemos ver o crescimento no faturamento das empresas majoritariamente em função de um aumento no volume de vendas, mas que pode ser prejudicado por uma redução substancial na demanda, a depender do cenário macroeconômico global daqui para frente.
A indústria vai passar por uma desaceleração no curto prazo

As projeções da indústria já apontam para uma desaceleração do setor na margem. Após o forte crescimento de 24,5% em 2021, as estimativas mostram uma redução de crescimento para 9,5% em 2022, em grande parte explicada pela base de comparação elevada. Por outro lado, à medida que o risco de recessão em diversas regiões do mundo aumenta, devemos ver uma pressão ainda maior nestes números.
Olhando para as subindústrias, vemos a demanda arrefecendo de maneira mais acentuada nas frentes beneficiadas pela pandemia como: smartphones, computação pessoal e videogames. As empresas mais dependentes destes segmentos deverão sofrer o maior impacto. Em contrapartida, as subindústrias mais resilientes deverão ser aquelas que ainda não se recuperaram da pandemia, como a automotiva e as que dependem de chips de menor tecnologia, além do segmento de computação voltada para servidores e data centers. A infraestrutura digital adquirida pelas empresas ao longo dos últimos anos não deverá ser desfeita, e a demanda por computação e armazenamento em nuvem deve continuar sendo um grande impulsionador daqui pra frente.
Estoques mais próximos do período pré-pandemia deverão reduzir a demanda, mas ainda é cedo para falarmos em excesso de oferta

A proporção de estoques por vendas das empresas nos EUA se aproxima de padrões históricos, mas ainda não se encontra no mesmo nível pré-pandemia. Tendo isso em vista, é difícil falarmos em um excesso de oferta de maneira generalizada, ainda que alguns setores já estejam sinalizando excesso de estoques. Acreditamos que este pode ser um evento ainda concentrado em algumas indústrias, mas uma oferta maior do que a demanda ainda não parece ser um fator de grande preocupação para as empresas de semicondutores.
O setor possui características cíclicas e margens parecem próximas do pico

Apesar do histórico limitado do índice MVIS US Listed Semiconductor, identificamos o caráter cíclico das margens do setor ao longo dos últimos 8 anos. Como apresentado no gráfico, nos ciclos anteriores (2015-2016 e 2018-2020), a margem operacional das empresas do índice contraiu, no agregado, cerca de 6 pontos percentuais. Olhando para o atual ciclo, acreditamos que potencialmente já passamos pelo pico das margens operacionais, mas as mesmas contraíram apenas 2,5 p.p. até o momento. Sendo assim, comparando com dados históricos, há espaço para as margens caírem mais e a alta inflação global pode corroborar para uma contração ainda mais acentuada que nos ciclos anteriores.
Valuation em linha com a média histórica não se traduz em um ponto de entrada favorável

Em termos de precificação, ainda vemos um cenário levemente otimista para as empresas do segmento. Vemos um Preço/Lucro (P/L) ainda em linha com a média histórica. Na nossa visão, este nível de valuation ainda não fornece um desconto interessante para configurar um bom ponto de entrada nestas empresas no cenário atual. O risco de revisão das estimativas de lucro tente para o lado negativo e a volatilidade nas taxas de juros deve continuar limitando retornos provenientes de uma expansão de múltiplos.
Por outro lado, a tendência estrutural permanece
Os chips estão no centro de diversas tendências estruturais e novas tecnologias sendo desenvolvidas. Eles se beneficiam desde o avanço da penetração dos veículos elétricos até o desenvolvimento de tecnologias complexas de inteligência artificial. Daqui para frente, o mundo não irá parar de avançar tecnologicamente e a tendência é que os dispositivos se tornem cada vez mais "inteligentes", necessitando da capacidade de processamento fornecida pelos semicondutores.
Conclusão
A característica cíclica do setor continuará pesando na performance das ações enquanto a perspectiva for de deterioração macroeconômica global. Ainda não enxergamos um ponto de entrada muito atrativo para que os investidores iniciem uma exposição à esta temática, mas seguimos construtivos em relação ao longo prazo da indústria. Os chips possuem um papel fundamental na economia global, uma vez estão no centro do avanço e desenvolvimento tecnológico. Apesar dos ventos contrários no curto prazo, as perspectivas de longo prazo seguem promissoras para a indústria.

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